sábado, 25 de abril de 2009

Crítica: Lemming - Instinto Animal

Direção: Dominik Moll
Roteiro: Dominik Moll e Gilles Marchand
Elenco: Laurent Lucas, Charlotte Gainsbourg, Charlotte Rampling e André Dussolier.


Suspense. Palavra que deriva do ato de se deixar em suspenso, da espera, do momento em que se aguarda ansiosamente por algo que já fora anunciado e que se desenrola até o momento do clímax da situação, seguido por sua resolução, quando então o suspense termina. No livro Hitchcock/Truffaut: Entrevistas o mestre Hitchcock deu uma aula em poucas palavras sobre a diferença básica do suspense para a surpresa, diferenciando o ato descrito acima daquele que aparece inesperadamente para surpreender o espectador, sem a construção prévia da tensão e, novamente aplicando o termo, do suspense.


No cinema contemporâneo é muito mais comum encontrar exemplos de filmes que utilizam o elemento surpresa do que o artifício do suspense, uma vez que o segundo exige muito mais da inteligência e habilidade dos roteiristas e diretores envolvidos para que seja bem desenvolvido, enquanto o primeiro facilmente é aplicado com a simples construção de uma situação surpreendente. Toda esta introdução serve para dizer que Lemming, que no Brasil recebeu o desnecessário subtítulo Instinto Animal, é um dos poucos exemplos recentes de um filme admirável do verdadeiro suspense, na concepção mais pura do termo.

A citação à Hitchcock no início do texto tem também a intenção de retomar os elogiosos comentários a respeito do trabalho de Dominik Moll, diretor de Lemming e de Harry Chegou Para Ajudar. Presente em Cannes com esses dois filmes, Moll é comparado com Hitchcock por preservar os elementos puros do suspense, sem os artifícios banais utilizados à exaustão no cinema recente. O diretor ainda utiliza em sua filmografia a estrutura que compõe grande parte dos filmes de Hitchcock: as situações extraordinárias que acontecem a pessoas comuns, o que serve para aumentar a empatia e identificação do espectador com os personagens de seus filmes. As comparações entre Moll e Hitchcock então, uma vez justificadas, não são nada gratuitas ou infundadas.

Em Lemming conhecemos Alain e Benédicte, um casal que acaba de se mudar para uma cidade no sul da França quando ele recebe uma proposta de emprego irrecusável. Quando este se aproxima do chefe Richard após uma bem sucedida invenção, ele o convida, junto com sua esposa, Alice, para um jantar em sua casa. É a partir dessa simples premissa que se desenvolve toda a trama do filme, e o título do mesmo, que pode parecer estranho, faz menção ao pequeno roedor escandinavo que curiosamente aparece na casa de Alain e Benédicte, na mesma noite do já mencionado jantar.

Uma metáfora poderosa e importante se constrói logo no início do filme, e ela é representada pelo lemingue que entope o encanamento da pia do casal principal. Ocorrendo pouco antes da chegada dos visitantes, o entupimento representa a barreira que impede a normalidade, até então presente na vida do casal, de continuar. O pequeno mamífero, que é a personificação da barreira já citada, representa a personagem de Alice, que causa todo o tormento na noite do jantar e, posteriormente, o desequilibro no relacionamento de Alain e Benédicte.

A sutileza se torna a principal ferramenta de Moll para captar as situações propostas por seu roteiro e de Gilles Marchand, e as cenas de Lemming contribuem mais com elementos visuais para o desenvolvimento do filme do que com explicações expostas em diálogos. Cada momento de Lemming, principalmente aqueles que ocorrem depois da metade do filme, trazem em si alguma informação fundamental para o entendimento do mesmo. A utilização do roedor para compor a história, por exemplo, não é gratuita: os lemingues, como certo personagem informa em determinado momento da produção, são conhecidos por cometerem suicídio coletivo, o que tem ligação direta com um acontecimento importante e surpreendente ainda no início do filme.

Todas as qualidades de Lemming descritas acima poderiam ser prejudicadas por escolhas erradas para o elenco da produção, mas não é isso que acontece. Outro ponto a se destacar no filme são as suas atuações, e o elenco composto por atores extremamente eficazes conseguem agregar ainda mais mérito ao filme. Laurent Lucas, também protagonista de Harry Chegou Para Ajudar, desenvolve Alain numa linearidade impressionante, não desequilibrando o personagem nem mesmo nas cenas mais dramáticas. As Charlottes, Gainsbourg e Rampling, também estão excelentes. No caso de Rampling, deveria ser considerado um pleonasmo colocar seu nome e a palavra excelente em uma mesma frase, e a atriz diz muito mesmo em uma personagem tão inexpressiva. Interessante também é perceber que Charlotte Gainsbourg pouco se descaracteriza visualmente para seus papeis, mas sempre desenvolve personagens extremamente singulares.

O que ainda poderia ser dito a respeito de Lemming certamente prejudicaria a sessão de futuros espectadores, que podem esperar sem medo de frustrações um dos filmes mais interessantes, profundos e significativos dentre a tonelada de produções atuais do gênero. Hitchcock aprovaria.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Entre os Muros da Escola

Direção: Laurent Cantet
Roteiro: Laurent Cantet, Robin Campillo e François Bégaudeau, baseados no livro de François Bégaudeau
Elenco: François Bégaudeau, Nassim Amrabt, Laura Baquela, Cherif Bounaïdja, Juliette Demaille, Dalla Doucouré, Arthur Fogel, Damien Gomes

A escola é um dos organismos mais elucidativos quanto aos rumos que a grande massa social toma. Com esta sentença pessimista de início, não quero aqui me colocar ao lado dos balzaquianos que ainda pregam aquele regime antigo, baseado em castigos, muitas vezes físicos, para os alunos que não se comportam direito, pois não creio que isso possa ser chamado de educação. Crescemos, pelo menos os da minha geração, sendo atemorizados por nossos pais, aqueles alunos que sofriam os famigerados castigos físicos e que, antes que começássemos nossa vida escolar, nos pintavam os professores como pessoas a, não somente serem respeitadas, mas temidas. Os tempos mudaram muito, a educação sofreu diversas mutações e, hoje em dia, o que vemos na escola é, geralmente, uma turma pouco propensa ao saber, que mira no professor sua “rebeldia sem causa”, como se o mesmo fosse representante da obrigação que os pais infringem neles para estudar, para serem alguém na vida. A questão da escola é complexa, realmente um tema espinhoso.

Tendo como cenário um liceu no subúrbio de Paris, e baseado no livro de memórias do professor François Bégaudeau, o diretor Laurent Cantet surpreendeu ao abocanhar um dos maiores (em minha opinião o mais relevante) prêmios do cinema mundial. Cantet fez com que ficasse na França a Palma de Ouro do Festival de Cannes, fato que não ocorria desde 1987, após apresentar ao mundo Entre os Muros da Escola, drama ambientado na sala multi-cultural do professor de francês, François Marin. Curiosamente, Marin é interpretado pelo professor/escritor François Bégaudeau, ou seja, o diretor o utiliza na função que desempenha na realidade. Os alunos, cada qual vindo de uma parte do mundo, numa clara representação da mistura de culturas que é muito regular nos países europeus, tampouco são atores profissionais. A escolha de Cantet parece óbvia, afinal utilizar o escritor do livro no qual se baseia o filme, acostumado com o ambiente de uma sala de aula, e um monte de atores que, na realidade, são alunos, se apresenta como saída óbvia para uma representação mais simples, mais natural. Não que isto deixe a verdade totalmente de lado, mas, atribuir ao amadorismo do elenco a verossimilhança do filme, da abordagem, é reduzir o grande trabalho de Laurent Cantet na direção deste magnífico filme. Até porque, baseado nas entrevistas concedidas pelo diretor por ocasião de sua vinda ao Brasil, sei que ele utilizou os adolescentes em personas fílmicas bem diferentes de suas verdadeiras e, o próprio Bégaudeau toma, no filme, atitudes destoantes das dele como educador, ou seja, é uma das várias liberdades que Cantet toma em relação ao livro que lhe serve de sustentação.

Entre os Muros da Escola é um daqueles filmes que cumprem diversas funções, um exemplar que exala o frescor criativo que só as grandes obras possuem e, é, em opinião particular, por acaso consonante com a maioria da crítica especializada, uma obra-prima. Porque eu disse que o filme cumpre diversas funções? Bem, vamos às mais importantes. Primeiro, no que diz respeito ao cinema, é uma obra de imensa qualidade e relevância, fruto do trabalho de um diretor sensível que, utilizando um roteiro primoroso, prende a atenção do espectador por mais de duas horas, num filme essencialmente oral. A linguagem utilizada é seca, despida de maneirismos, ou quaisquer outros elementos que poderiam nos induzir, ao invés de provocar reflexão. A opção pela não utilização de trilha musical é uma destas ausências pontuais que fazem o trabalho mais “cru”, assemelhando-o à um registro documental. Já no campo social, Entre os Muros da Escola é certeiro ao propor discussão sobre a situação caótica vivida pelos professores, que necessitam conviver com alunos cada vez mais desinteressados. Aborda também o viés do aluno que, muitas vezes, é somente reflexo de um mundo que não oferece perspectivas. Outra questão vital é a mistura de raças e crenças, a questão das fronteiras, que parecem obsoletas diante de um mundo que celebra a globalização e a migração, no caso do filme, mostrando estes imigrantes que vêm de países assolados pela pobreza, guerras étnicas, outros conflitos e/ou problemas sociais graves.

Ficaria horas discorrendo sobre Entre os Muros da Escola, um primor narrativo. A direção de Cantet (e tenho por convicção pessoal o termo “direção” no todo e não somente relativo aos atores ou aos posicionamentos de câmera, para exemplificar) é espetacular pela simplicidade e competência com que retrata assuntos tão pontuais, tão importantes, afastando-se do maniqueísmo, construíndo relevantes e multifacetadas figuras. Some à este trabalho de direção, as interpretações tocantes do elenco, com destaque para François Bégaudeau, o roteiro brilhante técnicamente e suas múltiplas temáticas essenciais, e temos um grande filme, uma obra que, como digo frequentemente, causa iluminação.

sábado, 18 de abril de 2009

Caminhando nas Nuvens

Ontem, ao esperar pelo meu lanche numa hamburgueria aqui de Caxias, eu e meu amigo discutíamos a respeito do que é arte, baseados num quadro exposto no local. O quadro era muito bonito, tinha técnica, mas, ambos concordamos, não tinha o que uma obra de arte deve ter: o poder de nos modificar, uma espécie de transcendência. Discutimos e, eventualmente divergimos em alguns casos, sobre como a arte pode se manifestar sob diversas formas e como a subjetividade afeta o fato de algo ser considerado arte ou não.

Divago nesta discussão de ontem, pois, hoje, ao ver o documentário O Equilibrista, que retrata a audaciosa travessia entre as duas torres do World Trade Center, feita pelo francês Philippe Petit, na década de 70, mais precisamente em agosto de 1974, me peguei admirando profundamente um artista e a imagem de sua travessia, tal qual se estivesse caminhando nas nuvens. E mais, na trajetória de Petit, contada de maneira emocional, e até mesmo lúdica, pelo diretor James Marsh, num dos filmes mais tocantes que vi nos últimos anos, parece condensada toda a beleza e “função” que acredito a arte possuir, seja por ele mesmo ou por Petit, seu objeto de desconstrução.

James Marsh não quebra barreiras narrativas para realizar O Equilibrista. Aqui o virtuosismo do filme não reside na forma, mas sim no conteúdo, na maneira com que Petit e todos os seus comparsas lembram dos detalhes, desde quando o francês teve a idéia, passando por suas outras incursões sobre cabos pendurados em grandes alturas, até a obsessão pelas torres gêmeas e o momento, de extrema beleza, que permanece gravado história. É claro que a sombra das torres gêmeas, hoje inexistentes por ventura dos ataques de 11 de setembro, é ingrediente importante nesta mistura de retrato emocional e poético da obra de Petit. É tocante vê-las, por meio de imagens de arquivo, sendo construídas e é impossível que não venha à mente de quem assiste ao documentário, a imagem dos aviões se chocando contra as torres, num contraponto ao sonho de Petit, que era de utilizá-las como parte de uma construção artística. Naqueles instantes em que Petit percorre um estreito cabo de aço, segurando uma vara como apoio, arriscando sua vida em nome de algo maior, mais profundo, sem explicação racional, é a personificação, a retratação gráfica do que a arte pode simbolizar na vida das pessoas.

domingo, 12 de abril de 2009

Novos diretores

Conhecer novos diretores é uma das práticas mais estimulantes para alguém que gosta de cinema. Há tantos, com toda a diversidade que esta arte permite que, quando descobrimos uma visão nova, uma maneira própria e estimulante de registrar histórias e transformá-las em obras perenes, que se apresentam como agentes transformadoras de quem as assiste, parece a abertura de uma nova janela. Neste final de semana tomei, pela primeira vez, contato com a obra de dois diretores, daqueles obrigatórios aos cinéfilos: F. W. Murnau e Pier Paolo Pasolini.

Do expoente do Expressionismo Alemão, assisti Aurora, sua primeira incursão pelo cinema nos EUA. O início nos passa a enganosa impressão de que estamos diante de um exemplar de fundação, porém que sucumbiu ao tempo. É claro que impressiona num filme de 1927 a técnica de Murnau, os deslocamentos de câmera e o senso estético do alemão, na composição de quadros belíssimos. Porém, a partir de dado momento, a estética é enriquecida por uma trama de crescente relevância, num filme que, conforme passam os minutos, fica melhor e melhor. Ao fim de tudo, me impressionou a belíssima história de amor, contada de maneira muito delicada, nada caudalosa, e o exemplar maravilhoso que, independente da época, Aurora é. Cinema, sem dúvida, daquele que produz iluminação.

De Pasolini, autor por quem sempre nutri imensa curiosidade, assisti à Teorema, obra que, por muitos anos, foi banida de diversos países. Na época de seu lançamento, Pasolini foi ameaçado de prisão, atacado como “obsceno” pela direita e como “místico” pela esquerda italiana, devido à seu posicionamento social. Este primeiro contato com o cinema de Pasolini me disse que ele, provavelmente, tinha uma mente complexa e que, seus filmes (se seguem a tendência deste) exigem mais de seus expectadores. A história de uma família burguesa que tem suas bases desestruturadas pela chegada de um visitante, possuí ecos políticos, religiosos, psicanalíticos, isto tudo na apropriação de uma linguagem que não permite concessões, no desenvolvimento lento de situações metafóricas que buscam ilustrar, da maneira mais incisiva possível, a desestrutura da burguesia perante a evolução das pessoas e, consequentemente, da sociedade. Classifico o ato de assistir à Teorema de visceral, difícil, doloroso até, mas visceral. É claro que, assim que me recuperar da violência com que Teorema se instaurou em mim, procurarei retornar à Pasolini. Se bem que o faria mesmo que não tivesse gostado da primeira vez. Treinar o olhar, os sentidos principalmente, é fundamental para os que amam o cinema.

sábado, 11 de abril de 2009

Parcerias

Assistindo hoje ao ótimo Ata-me, de Pedro Almodóvar - completando assim a filmografia já lançada do diretor - peguei-me impressionado com a atuação selvagem e avassaladora de Antonio Banderas. Todos, pelos menos aqueles que gostam e acompanham um pouco de cinema, sabem que o ator, hoje dono de uma carreira estável no cinema norte-americano, começou a ter notoriedade nos filmes de Almodóvar, ou seja, trabalhando em solo espanhol, interpretando tipos bem distantes daqueles que encarna com frequência no cinema do norte da América. Mesmo que nos EUA, Banderas tenha incursionado por todo tipo de personagem, desde os mais relevantes até os mais dispensáveis, sempre achei - desde que me apaixonei pelo cinema de Almodóvar, é claro - que ele nunca foi tão forte, tão contundente e tão ator como quando é regido pelo espanhol. Seu último filme com Almodóvar foi justamente Ata-me, em que interpreta Ricky, um doente mental considerado já “apto para conviver em sociedade” e que, ao sair da instituição aonde era mantido, vai em busca da mulher por quem se apaixonou numa de suas escapadas pregressas. É claro que Victoria Abril, utilizando seu enorme talento e uma sensualidade que parece emergir da tela, é o corpo do filme, dos pontos de vista literal e metafórico, mas a alma é Banderas e seu personagem fragmentado, desesperado e profundamente infeliz. Dá vontade de ver o ator numa performance destas novamente. Quando veremos Banderas sendo regido novamente por Almodóvar?


Este caso me fez pensar em outra dupla que, desfeita há algum tempo, poderia vir a trabalhar novamente: Woody Allen e Diane Keaton. Quem não lembra com saudade das parcerias inesquecíveis entre os dois, principalmente quando Allen, além de dirigir, também atuava com ela? Quem não se recorda de Alvy Singer e Annie Hall, casal icônico de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa? Ou mesmo a dupla inesquecível do clássico A Última Noite de Boris Grushenko, uma das melhores comédias de Woody Allen que deve seu brilho, além do excelente roteiro que parodia obras clássicas da literatura e cinema russos (e Bergman), ao perfeito entrosamento entre Diane Keaton e o diretor que melhor lhe retratou no cinema? No momento, Diane faz somente algumas comédias rasteiras, filmes muito aquém da carreira que construiu outrora. Seu último filme digno de lembrança é Alguém Tem que Ceder. Não está na hora de vermos novamente a dupla Keaton e Allen em ação?

Com estes dois casos não estou dizendo que Antonio Banderas não é nada sem Pedro Almodóvar e nem que Woody Allen é a única razão do sucesso de Diane Keaton. Quero apenas propor a reflexão acerca de que, quando eles, os atores, se juntavam à estes diretores, especificamente, suas atuações ascendiam à um patamar que hoje não conseguem. Imagino que nada no cinema, uma arte que testemunhou, ao longo dos tempos, inúmeras parcerias bem sucedidas, substitua esta alquimia natural e inexplicável entre um diretor e seu ator e, quem sabe, é este o toque que me encanta tanto nestes dois casos.

sábado, 4 de abril de 2009

Trilogia Bourne


Já se vão quase 7 anos desde a estréia de A Identidade Bourne, filme adaptado da obra literária homônima de Robert Lundlum e que, por sua visão contemporânea, conseguiu revolucionar, de maneira bem latente, o gênero clássico dos filmes de espião. Se você, caro leitor, não crê nisto, acha que é balela elevar Bourne ao panteão dos grandes espiões, é só acompanhar a ressurreição dos filmes de James Bond, que deve muito à série do agente interpretado brilhantemente por Matt Damon. Tinha muita curiosidade de assistir aos filmes, pois, sempre gostei destes exemplares sobre espionagem, que investem na ação planejada, sem perder a história como núcleo, como fator mais importante. Acabo de ver a trilogia inicial (já foi confirmada a realização do quarto filme) e, abaixo, seguem minhas impressões, curtas, é verdade, sobre cada um deles.


A Identidade Bourne
Direção: Doug Liman
Roteiro:
Tony Gilroy e W. Blake Herron, baseado em livro de Robert Ludlum

Neste primeiro filme, somos confrontados com a figura de Bourne, agente encontrado desmemoriado no mar, que passa a ser vítima de uma perseguição, mesmo que não saiba por quem, e nem o porquê de estar sendo, literalmente, caçado em torno do mundo. A encarnação de Matt Damon como Bourne é perfeita, pois o ator, além de demonstrar segurança nos momentos dramáticos, consegue executar a ação com impacto e verossimilhança. A direção de Doug Liman é competente e o clima lembra, pelo menos para mim, o primeiro Missão Impossível, dirigido por Brian De Palma, que, apesar de ser inferior à A Identidade Bourne, também é um ótimo filme.


A Supremacia Bourne
Direção:
Paul Greengrass
Roteiro:
Tony Gilroy, baseado em livro de Robert Ludlum

Meu predileto dos três filmes de Bourne. Começa com uma truncada relação política que envolve a CIA, políticos russos e assassinos sedentos por completar suas missões. É, de longe, o mais complexo por apresentar trama mais densa, numa mistura homogênea de conspiração política, sequências de ação mais poderosas ainda do que as da primeira parte e um clima seco, mais duro, que contribui, sem dúvida, para o enriquecimento da experiência de assistir Bourne. Esta mudança, para melhor, ocorre, em grande parte, pela troca do diretor: sai Doug Liman, competente, e entra o grande Paul Greengrass. Falando ainda na melhora em relação ao primeiro filme, crédito grande parte dela ao trabalho, agora solitário, de Tony Gilroy. O poder da história deve, e muito, às relações complexas estabelecidas pelo roteiro de um Gilroy que, provavelmente, tendo mais liberdade, criou algo mais profundo e contundente.


O Ultimato Bourne
Direção: Paul Greengrass
Roteiro: Tony Gilroy, Scott Z. Burns e George Nolfi, baseado em estória de Tony Gilroy e em livro de Robert Ludlum

Um ótimo encerramento para este primeiro arco das histórias de Bourne. Pouco a pouco, vamos descobrindo, junto com ele mesmo, quem é Bourne, à quem ele serviu e com que propósito ele se tornou um agente especial da CIA. Aqui as cenas de ação são mais físicas, quero dizer, mais centradas em lutas, embates corpo-a-corpo, porém, sem esquecer as grandiosas perseguições automotivas, marca registrada da série. Mais uma vez, o clima conspiratório é muito importante, mas, sem a complexidade e força vistas no segundo filme. A história de O Ultimato Bourne é bem simples de acompanhar (notem que o roteirista, Tony Gilroy, volta a ter parceiros, ou seja, não assina o roteiro sozinho). Esta terceira parte se utiliza de alguns expedientes re-esquentados da segunda, ainda que de maneira convincente e, mesmo sendo o menos ousado dos três, se mostra um competente encerramento para esta primeira trilogia, em grande parte pela maturidade na direção e montagem, sendo ele, nestes quesitos, o melhor e mais bem resolvido da tríade.