domingo, 28 de setembro de 2008

Crítica: Gritos na Noite

Direção: Marc Forster.
Roteiro: Marc Forster, Adam Forgash e Catherine Lloyd Burns.
Elenco: Radha Mitchell, Megan Mullally, Jacqueline Heinze, Catherine Lloyd Burns, Justin Louis, Matt Malloy, Mark Boone Junior e Courtney Watkins.


Existe uma vertente do cinema contemporâneo que tem levado diversos cineastas talentosos a enxergarem nos subúrbios americanos histórias até então não contadas, utilizando o ambiente aparentemente pacífico como pano de fundo ou mesmo como personagem em suas narrativas. O espaço foi desconstruído e a imagem da família moderna perfeita, imaculada, já fora desmistificada, não sendo mais vista como exemplo de estrutura familiar “ideal”. Todd Solondz foi um dos pioneiros com os filmes desse gênero, se já é possível o classificar como um, quando em Bem-Vindo à Casa de Bonecas e Felicidade abordou o cotidiano de personagens que viviam nos tais subúrbios. Com Solondz se destacam Sam Mendes com Beleza Americana e Todd Field e seus Entre Quatro Paredes e Pecados Íntimos. Em Gritos na Noite o mesmo espaço é alvo de uma análise crítica, junto a outros temas passíveis de reflexões, raramente abordados com tamanha crueza pelo cinema americano.

Gritos na Noite é o segundo filme dirigido por Marc Forster, cineasta de talento reconhecido e que hoje tem em seu currículo filmes voltados ao grande público, como Em Busca da Terra do Nunca e O Caçador de Pipas. Faz-se notar a incrível disparidade dos filmes subseqüentes de Forster com este trabalho menor, sendo a maior característica de Gritos na Noite a experimentação feita pelo diretor em suas escolhas estéticas. O diretor venceu o Festival de Sundance em 2000 na categoria de Melhor Direção, justamente por apresentar o uso de elementos fílmicos simplistas e pouco utilizados com tamanha competência.

O que temos aqui é um trabalho filmado em um digital cru, quase caseiro, que tem papel importante por aproximar o filme a uma realidade palpável. A escolha pelo digital tosco casa perfeitamente com o ambiente onde o filme se passa, e a maioria das cenas funciona incrivelmente bem, como em uma seqüência de um aniversário infantil, que apresenta todo o núcleo de personagens se relacionando, como se um parente próximo estivesse captando tudo aquilo através de uma câmera doméstica, para rever posteriormente com sua família.

A forma original aplicada pelo trio de roteiristas Adam Forgash, Catherine Lloyd Burns (que também atua no filme) e pelo próprio Forster à trama, muito recorrente por sinal - mãe perturbada pela precoce morte de um filho -, é um dos grandes feitos de Gritos na Noite. Não há espaço no filme para momentos gratuitos, ou cenas descartáveis, pois toda a relevância de algumas seqüências aparentemente desnecessárias acaba subentendida, como em um dos primeiros diálogos, onde a protagonista, então grávida, reflete e exterioriza seus pensamentos acerca do movimento cíclico da vida. A passagem faz referência ao próprio filme, que tem em sua derradeira seqüência o nascimento de uma nova realidade para a vida da personagem, extremamente semelhante à inicial.

O mundo perfeito que Forster analisa através de sua direção por vezes frenética vai se metamorfoseando ao decorrer do filme. As pessoas vão aos poucos apresentando outras faces, lados desconhecidos, enquanto a atormentada personagem de Radha Mitchel, Angie, é machucada por uma série de acontecimentos desencadeados com o falecimento de seu filho, como os recorrentes problemas com suas amigas, pessoas que assim não mereciam ser classificadas. Quando a banalidade em seus relacionamentos se resume a encontros e discussões vazias, as amigas de Angie visivelmente transmitem a felicidade por terem o controle de suas previsíveis vidas. Quando o inesperado ocorre com Angie, no entando, as tais mulheres sempre presentes passam a evitar a companhia daquela que julgam agora ser uma estranha, pelo simples fato de estar mudando o curso no qual tudo deveria estar acontecendo.

Não se pode esquecer a composição extraordinária de Radha Mitchel para Angie, atriz que posteriormente não foi tão bem aproveitada por outros diretores (talvez por Woody Allen, em Melinda e Melinda), que merece grandes elogios já que sem um desempenho visceral como o seu o filme ficaria em parte vazio. Espero que se inserindo em projetos como o novo James Bond Marc Forster consiga posteriormente certa independência criativa e volte a trabalhar em projetos menores, singulares como este, e de grandes resultados.

Caxias em Cena: Contas Diárias e o encerramento

De boas intenções o inferno está cheio! Assim, com este pensamento, se encerrou o Caxias em Cena, pelo menos para mim. Explico. Na verdade este foi o paralelo que fiz entre a peça vista ontem e o festival como um todo, levando em conta seus aspectos.

No espetáculo paranaense Contas Diárias, somos levados a ver três histórias que, acredito eu, pretendiam, mesmo em segmentos diferentes, apresentar uma unidade, mostrando através de fatos diferentes uma visão convergente sobre a natureza humana. Na primeira, um casal de velhinhos; na segunda, duas crianças brincando e um pai vendo televisão; e na terceira, uma menina e um menino fazendo uma prova na escola enquanto o professor lê um livro sobre arte. Utilizando máscaras (muito mais expressivas em sua inércia do que alguns atores são em movimento) a companhia nos apresentou uma obra um tanto quanto insossa e morosa, não despertando muito o interesse da platéia que aplaudiu timidamente ao final. Fiquei com a impressão de ver algo desnecessário, possuidor de uma boa idéia, dotado de trilha sonora interessante, mas que, no todo, foi falho por não conseguir nada além do visual, no máximo, nos cativando por certas encenações, porém, num nível de consciência muito raso, onde as intenções de profundidade mostraram-se somente como vontade.

Pois bem, o Caxias em Cena foi um festival ótimo este ano pelas inúmeras peças de qualidade que trouxe, pelo preço acessível que permitia maior adesão do público. Não sei, porém, se por causa da soberba do título fajuto de Capital da Cultura ou mesmo pela aproximação das eleições, o que poderia ter sido amplamente divulgado, festejado como uma mostra de arte para o povo caxiense, terminou sendo um aglomerado de peças, ótimas repito, mas que não tiveram a divulgação necessária, não foram tratadas com a devida atenção que mereciam. Prova disso o baixo comparecimento de público, na maioria das apresentações. Até quando vamos ficar reféns de intenções, que não são levadas a sério nem mesmo por quem as têm? Afinal, de boas intenções o inferno está cheio.

Drummond e as Gatinhas

Olá, pessoal!

Tenho a necessidade de compartilhar com vocês uma experiência, no mínimo, curiosa. No último dia 25, minha aula na UCS terminaria às 16 horas ou meados dessa. Pois bem, tecnicamente acabou antes. Às 15 horas. O problema: o ingresso para uma peça do Caxias em Cena, às 20 horas. O que fazer? Devo confessar que a vontade de retornar para casa existia, porém a vontade de “matar tempo” na biblioteca também. Na procura de material: “Crime e Castigo”. Encontrei a mesma edição que estou lendo e, desbravei o capítulo próximo, após alguns poucos minutos nas prateleiras o localizando. Terminada a leitura, sobrava tempo, menos de uma hora, mas não dispensável tempo. A poesia nunca foi alvo de minha atenção, contudo queria ler algo curto e pus em minha cabeça um autor: Mário Quintana. Só eu e, a entidade superior que nos controla e governa, segundo a Bíblia, sabe o quanto vasculhei. Descobri que me falta talento e paciência com os códigos de chamada do material.

Desisti. Encontrei outro, um usurpador de minha atenção. Carlos Drummond de Andrade. O título não recordo. Recordo a impressão que causou o primeiro poema lido. Erotismo. O segundo. Erotismo. O terceiro. Erotismo. Senti-me um adolescente pervertido. Folheando mais a frente o livro, descobri ser uma publicação de textos de cunho erótico, não recorrente na obra de Drummond, conhecido por sua timidez. Lembro do título, de um pedaço dele, para lidarmos com a exatidão, de um dos poemas: “Mulher Gulosa”. De “Gulosa” a certeza. Estabelecia uma analogia entre o picolé ou sorvete e o sexo oral.

Segue abaixo um poema de Drummond (excelente) que localizei na internet, o qual li lá na biblioteca. Sorte minha a capa prezar pela discrição:


Sugar e ser sugado pelo amor

Sugar e ser sugado pelo amor

no mesmo instante boca milvalente

o corpo dois em um o gozo pleno

que não pertence a mim nem te pertence

um gozo de fusão difusa transfusão

o lamber o chupar e ser chupado

no mesmo espasmo

é tudo boca boca boca boca

sessenta e nove vezes boquilíngua.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Caxias em Cena: A Julieta e o Romeu

Casa cheia. O que vi ontem foi o Teatro Pedro Parenti totalmente lotado para a exibição da peça paulista A Julieta e o Romeu. Existia, inclusive, grande número de crianças presentes. Teatro com palhaço é ideal para a criançada, pensam os pais. Ledo engano. A Julieta e o Romeu traz ao palco dois clowns em um espetáculo metalingüístico e adulto, com várias referências e cenas que fogem da compreensão dos petizes. Na trama, Mafalada Mafalda, atriz conceituadíssima e muito muito antiga, conta com a ajuda de seu estagiário na homérica tarefa de representar uma peça-mosaico, na qual estão presentes os mais clássicos textos de Shakespeare (sim, ele novamente, fonte inesgotável de inspiração). O espetáculo é um pouco longo - se tivesse vinte minutos a menos o ritmo seria ideal – mas o talento dos atores Andréia Macera e, principalmente, Ésio Magalhães, contagiou o público de tal forma que a mis en scène foi interrompida muitas vezes por causa dos aplausos. Realmente engraçadíssima, A Julieta e o Romeu ainda presenteou à platéia (pelos menos os mais atentos) com um subtexto bem bonito sobre amor e dedicação, por meio da figura do clown que tenta, mesmo sem talento, de tudo para agradar e fazer feliz a mulher que ama.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Caxias em Cena: Noite de Reis

Continuando minha incursão pelas atrações do Caxias em Cena, voltei, na noite de ontem, a assistir uma comédia, gênero que parece ter mais prestígio e aceitação, dado a maior quantidade de público nas peças desta natureza e mesmo pela oferta do festival, que tem neste gênero sua predominância. Será que, em geral, se prefere rir a chorar no teatro? Enfim, digressão, possivelmente inútil, mas que pode dar o que pensar. A peça em questão era Noite de Reis, monólogo oriundo de Portugal, baseado num texto clássico de William Shakespeare. Leonor Keil representa os onze personagens da peça, dez pessoas e um cão. Para quem esperava grandes cenários, trocas de figurino, ou mesmo achou estranha a opção pelo monólogo num texto em que há tantas figuras, acredito que a encenação foi uma surpresa total. A atriz utiliza apenas sua expressão corporal e desenhos feitos rusticamente em pedaços de papel para contar a história. Os méritos são de Leonor e da linguagem proposta, que dão verniz interessante ao texto de Shakespeare, nos convidando a embarcar numa viagem lúdica, onde os movimentos e jogos cênicos, muitas vezes, substituem a palavra. Os aplausos efusivos e gritos de “bravo” no final não foram exagero, e sim o reconhecimento à um grande trabalho, em forma e conteúdo.

domingo, 21 de setembro de 2008

Caxias em Cena: Começar a Terminar

Do alto de seus 76 anos, esta semana, durante o Porto Alegre em Cena, Antônio Abujamra estreou mais uma peça, dirigindo e atuando. Começar a Terminar teve como seu segundo palco, hoje, o Teatro Pedro Parenti, da Casa da Cultura. A peça é uma declaração de amor do artista à um dos maiores dramaturgos do século XX, senão o maior, Samuel Beckett. Durante mais ou menos quarenta minutos, Abujamra conversa com o público se utilizando de alguns personagens clássicos do dramaturgo irlandês. Interagindo com dois personagens, um homem e uma mulher, que parecem saídos diretamente do imaginário daquele que foi um dos fundadores do teatro do absurdo, Abujamra transborda segurança e transmite à nós, espectadores, a força de um grande artista reverenciando a obra de outro grande artista. A encenação não se curva à linearidade ou mesmo ao entendimento, servindo sim ao pensamento por meio dos signos, atingindo um plano mais sensorial. A reflexão sobre o papel da arte e sua implicação cotidiana aparece, disfarçada no tom satírico, no deboche de um texto adaptado com intenções de mostrar que, ao entendermos a arte, possivelmente entendemos o que somos, para que servimos e, quem sabe, para onde vamos.

O Caderno de Rafael

José Saramago. Há um tempo diria ser um nome não estranho à minha memória, porém de cunho íntimo inexistente. Talvez até diria mesmo ser escritor, contudo a certeza não me acompanha em tal afirmação. Ano passado (2007), a disciplina “Laboratório de Criatividade” contava com a tarefa de resenhar um livro do autor português, O Homem Duplicado. Tendo em vista que minha curiosidade literária já se fazia presente e a busca pelo livro nas prateleiras da biblioteca universitária seria digna de gladiadores, resolvi comprar o livro, edição brasileira da Companhia das Letras. Sobre essa experiência nada mais relatarei, pois caso tenha lhe instigado por informações mais delineadas a respeito desse, segue link de minha autoria.

Fã ardoroso. O que sou em relação a Saramago. Um exemplo de alguém que começou sua carreira literária tardiamente e de êxito singular, bem como a maneira que usa para se expressar. Fabuloso jeito com as palavras. Fiquei surpreso com a notícia de que as rugas de Saramago não o impediram de lançar um blog. Não apenas um blog, lança mão de estigmas próprios de pessoas de idades avançadas, que vêem na internet um estranho, avesso às suas ideologias. José Saramago usa desse para lidar com sua famigerada inquietação intelectual.

No post de abertura nos deparamos com texto de sua mulher, Pilar. Informa do término de um novo livro, para deleite dos fãs, A viagem do elefante, cujo trecho pode ser apreciado no endereço eletrônico do autor.

No link “O Caderno de Saramago” pode-se ler alguns textos do mestre português. O prazer das páginas de seus livros disponível agora, em escala menor e com objetivo diverso, na grande teia. Que Saramago continue tecendo seus pertinentes textos por muito tempo, seja na rede e, principalmente, nas páginas inebriantes de seus livros.

Crítica: Ben X - A Fase Final

Direção: Nic Balthazar
Roteiro: Nic Balthazar
Elenco: Greg Timmermans, Laura Verliden, Marijke Pinoy, Pol Goossen.

“Para os seres atentos, o mundo é um só”.
Heráclito

Nunca se viu tempo onde essa frase fizesse maior sentido do que o presente, onde as tecnologias virtuais gradativamente proporcionam (ou causam?) mudanças de aspecto extraordinário em nossa sociedade.

Ben apenas é uma das muitas pessoas que, infelizes com a própria realidade, se apegam a esse mundo virtual deixando em segundo plano suas legítimas vivências. “Ben X” fala sobre Ben e seu grau de envolvimento com o jogo Archlord e os desdobramentos implicados pelo mesmo em seu cotidiano, somados com o que o torna ainda mais desigual perante aos outros: a síndrome de Asperger, uma espécie mais leve de autismo.

A premissa por si só, que já é genial, quando inserida no roteiro e direção visionários de Nic Balthazar é levada a proporções fantásticas. O roteiro de Balthazar é complexo, porém guiado de forma branda e muito bem resolvida. As questões levantadas por sua narrativa vão desde o amplamente discutido conceito da virtualidade contra a realidade até a abnegação do ser ao seu “eu - próprio”, quando sugere o descarnamento de Ben perante a ficcionalidade de seu jogo.

Greg Timmermans, o intérprete de Ben, desenvolve seu personagem de forma brilhante e coesa, e deixa em evidência juntamente com o trabalho de Balthazar as dificuldades enfrentadas por seu personagem, dada sua condição. Ben já seria um pária por viver fantasiando seu dia-a-dia, e isso somado à síndrome que o afeta gera incompreensão por parte de seus colegas de escola, o que provoca conseqüências extremamente lamentáveis.

Se for difícil para o espectador compreender as ações de Ben, basta analisar a febre que causa jogos como “Second Life” ou mesmo os semelhantes ao Archlord (que realmente existe), como “World of Warcraft” e “Ragnarok”. O jogador vive uma outra realidade e passa a se relacionar com outros jogadores, a fazer amigos e compartilhar experiências, porém muitas vezes sem nunca ver ou falar diretamente com a outra pessoa. Essa possibilidade muitas vezes causa o afastamento da pessoa de sua realidade, e com Ben isso é potencializado também por sua condição psicológica.

Em sua direção Balthazar se arrisca e inova, ao utilizar uma técnica chamada Machimina (híbrido de machine cinema, ou cinema maquínico), que consiste na utilização de atores criando interpretações para personagens virtuais do jogo Archlord. Toda a seqüência inicial de “Ben X” e diversas outras de grande importância para a trama são geradas através dessa técnica, o que em nenhum momento torna o filme enfadonho ou causa estranheza. Da forma com que são inseridos e dispostos na história, são de fundamental importância, como na cena onde Ben divaga sobre a facilidade com que um personagem pode ganhar os atributos físicos que seu criador desejar, enquanto se olha no espelho e analisa sua própria fisionomia, com certo desgosto. Uma outra opção do diretor que é acertada, a de trabalhar com depoimentos dos personagens secundários que vez ou outra interrompem sua narrativa, gera expectativa ao público que espera saber qual a utilidade de tais cenas para o filme. Se por vezes os comentários são repetitivos e o recurso não seja inovador, o todo e principalmente o desfecho da trama compensam essas pequenas seqüências.

O que assusta, e pode causar certas crises de consciência ao espectador de “Ben X” diz respeito à forma com que nós vivemos nossas realidades. Estou escrevendo esse texto fazendo o uso de uma tecnologia virtual, não palpável. E você leitor, faz parte da mesma realidade, lendo os mesmos escritos através desse meio cibernético. O filme aqui analisado, por mais que supostamente seja baseado em fatos, é irreal, fictício, assim como o cinema (salvando a produção documental, porém não em sua totalidade). Estaríamos por tanto vivendo um simulacro, onde o real fica em segundo plano pelo tempo necessário para que se viva a realidade de outrem.

Como se pode então criticar Ben ou outras pessoas por recusar o real e se apegar tanto no virtual sendo que nós próprios, aficionados a um meio em comum, o cinema, deixamos de lado nossa realidade para cultuar algo não concreto? Existem muitas teses que responderiam essa questão através de diversas perspectivas, porém não se faz necessário expressar minha opinião própria a respeito, já que cabe a cada um, quando o interesse existir, refletir sobre as razões que o faz despregar-se de seu “eu próprio” para viver o fascinante ficcional do cinema.


Texto publicado originalmente em: www.cineplayers.com

sábado, 20 de setembro de 2008

Caxias em Cena: Chalaça - A Peça


Bom, e na Capital Brasileira da Cultura (hehehehehehe, desculpem, não me contive), teve início, nesta semana, o décimo festival de teatro Caxias em Cena. Acho a iniciativa da prefeitura de Caxias do Sul absolutamente louvável, afinal não é sempre que podemos ver boas peças da cidade e, principalmente, vindas de outros estados e até mesmo de outros países, por míseros e simbólicos 5 reais. Sim, toda e qualquer apresentação que ocorrerá até o dia 30 de setembro, custa somente 5 reais (menos o show do Cidadão Quem, mas este, na opinião deste que vos fala, é totalmente dispensável). E por este valor, o que se espera? Casa cheia, certo? Sim, certo, é isto que se espera, mas, infelizmente, não é isto que está acontecendo, pelo menos não nesta primeira semana. Informações obtidas com amigos dão conta de que, os primeiros espetáculos possuíam um público estreitamente ligado com a arte teatral (atores, diretores). O público em geral, o povão mesmo que não freqüenta teatro regularmente, público alvo do baixo valor do ingresso, não tem comparecido. Falta de divulgação? Descaso da parte da prefeitura? Mais um sinal de que a Capital da Cultura é um título tal qual o da família real brasileira nos dias de hoje, ou seja, bonito, porém sem valor real algum? Bom, deixemos esta discussão pertinente, porém cansativa e batida, para uma próxima vez. O que quero falar agora é que, ontem, fui ver a minha primeira peça do Caxias em Cena (tenho ingresso comprado para mais quatro).


Chalaça – A Peça é uma adaptação feita pela Cia. Les Commediens Tropicales, de São Paulo, para o livro Galantes Memórias e Admiráveis Aventuras do Virtuoso Conselheiro Gomes, o Chalaça, de José Roberto Torero. A peça tem por mote a família real brasileira, e/ou portuguesa, ou seja, aquela da nossa pátria mãe. Filha da mãe! Somos portanto, e invariavelmente, uma pátria filha-da-mãe, fato. A encenação fala, mais precisamente de Francisco Gomes da Silva, conhecido como Chalaça, figura interessantíssima de nossa história, chamado de A Sombra do Imperador, famoso também por ter apresentado Domitila, a futura amante de D. Pedro e Marquesa de Santos, ao nobre. Como isto não é uma aula de história (eu nem teria conhecimento para tanto), vamos à peça. A encenação começa com um pandemônio, os personagens correndo de um lado para o outro com suas cadeiras e figurinos ora discretos, ora extravagantes. A correria acaba, somente quando um dos personagens senta no centro do palco, com um microfone em sua frente e começa a falar, tal qual estivesse a dar um depoimento, melhor ainda, como se estivesse sendo interrogado sobre a sordidez que existia nas relações familiares reais e o envolvimento de Chalaça em todas estas. O tom começa mais sério, um pouco didático (natural em se tratando de história), mas, aos poucos, a comédia começa a tomar forma, uma forma inapelável, irresistível. Personagem vai, personagem vem, e numa dança das cadeiras muito bem pensada, acompanhada de palavreado erudito misturado com linguagem popular, vemos um pouquinho do nosso passado como colônia e, depois, como império se mostrando por meio das ações de Chalaça, que não aparece como personagem físico na peça, mas, torna-se tão palpável e rico como nenhum outro encenado. Não tenho aqui a pretensão de fazer um texto crítico (tal qual ocorre no caso da história, não tenho bagagem para isso, não sou um conhecedor profundo de teatro), mas devo dizer que Chalaça – A Peça marcou um dos momentos mais divertidos que já tive no teatro. A comicidade, o ótimo texto e a ousadia da companhia contribuem para que se tenha quase uma hora e meia da melhor e mais divertida aula (no melhor sentido da palavra) de história. Destaque para os momentos que são utilizados como transição, para dar uma revigorada na narrativa. Num destes momentos o joguete que se faz é tão engraçado que, nem a genitália masculina exposta, soa como ofensa, soa sim como limite a que o brasileiro chega para sacanear o próximo. Isso mostra um pouco do povo que fomos naquela época e no qual nos tornamos, ou seja, não mudou muita coisa.

domingo, 14 de setembro de 2008

Trailers

Sou um cara que adora trailers de filmes. Nada melhor para divulgar uma produção futura, do que um trailer eficiente. Está certo que, às vezes, estes vídeos de, mais ou menos, três minutos contém tudo que o filme pode oferecer, ou seja, nem sempre um trailer maravilhoso vem a ser o aperitivo de um filme maravilhoso. Nos últimos tempos tenho me irritado com aqueles trailers que contam o filme todo, literalmente do início ao fim. Será que os departamentos de marketing dos estúdios pensam que assim, ao entregar tudo num vídeo curto e editado a seu bel prazer, farão com que as pessoas se interessem mais, freqüentando assim seus cinemas e abarrotando seus cofres de dinheiro? Não sei, questão difícil esta de saber o que passa na cabeça dos outros. Só sei que um trailer, quando bem feito, pode determinar se uma pessoa vai ou não ver um filme, se ela vai ou não procurá-lo numa prateleira de locadora.
Esta semana vi dois trailers que fizeram minha cabeça.

The Soloist

Começo por The Soloist (ainda sem título em português), dirigido pelo talentosíssimo Joe Wright (responsável pelo ótimo Desejo e Reparação). O filme conta a história real de Nathaniel Anthony Ayers (Jamie Foxx), um homem que vive sob um viaduto de estrada em Los Angeles e que é um virtuoso no trompete, violoncelo e piano. Ayers sofre de esquizofrenia e se afastou da sociedade por conta da doença - até que o jornalista Steve Lopez, interpretado por Robert Downey Jr., o encontra. Parece-me digno de, pelo menos, muita atenção um filme como este, dirigido por um dos mais virtuosos e plásticos diretores que surgiram nos últimos anos (mesmo que alguns o tenham como pernóstico), interpretado por dois grandes atores como Jamie Foxx e Robert Downey Jr., este último vendo sua carreira ressurgir das cinzas num ano inesquecível.




007 - Quantum of Solace
Confesso que nunca fui fã ardoroso dos filmes de 007, devo ter visto uns dois ou três dos mais de vinte. Ontem mesmo assisti a 007 Contra Goldfinger, filme do qual gostei bastante, mesmo soando datado e um tanto quanto ingênuo. Em 2006 resolveu-se começar a franquia quase que do zero, já que acompanhamos o momento em que o agente James Bond recebe sua famosa licença para matar. O enfoque ficou mais realista, a mitologia do personagem foi respeitada até o limite das novas ambições e tivemos em 007 – Cassino Royale um grande filme, do qual sou apreciador. O trailer da seqüência acaba de sair e, sob a batuta de um diretor competentíssimo como Marc Forster, 007 – Quantum of Solace (ainda sem título em português) promete ser ainda melhor.

Dragon Ball?

Olá, pessoal.
30 minutos. Tempo que destinava à televisão, grudado ao sofá, durante mais de um ano, 5 dias por semana. Ansiava por aquela metade de hora que, em dado momento, para meu júbilo na época, chegou a quase uma hora integral. Revistas abarrotadas com o mesmo assunto. Boatos mil. Goku e companhia Ltda. Não renego o passado, que me serve agora de combustível.

Não pretendo expressar qualquer tipo de opinião leviana e vazia a cerca da adaptação cinematográfica de Dragon Ball. Contudo, as informações e imagens divulgadas até então são decepcionantes. Difícil dizer “decepcionantes” quando não há perspectivas positivas quanto ao produto final. Como argumentar perante roteiro que, segundo fontes ligadas à produção do longa, ignora características marcantes de seu protagonista, tomando por exemplo sua galopante burrice e ingenuidade?

Espero que as esferas ainda sejam do dragão.


Abraçossss

domingo, 7 de setembro de 2008

Estamira

Que Deus é esse? Que Jesus é esse, que só fala em guerra e não sei o quê?! Não é ele que é o próprio trocadilo? Só pra otário, pra esperto ao contrário, bobado, bestalhado. Quem já teve medo de dizer a verdade, largou de morrer? Largou? Quem ando com Deus dia e noite, noite e dia na boca ainda mais com os deboches, largou de morrer? Quem fez o que ele mandou, o que o da quadrilha dele manda, largou de morrer? Largou de passar fome? Largou de miséria? Ah, não dá!

Trecho fortíssimo do ótimo documentário Estamira, dirigido por Marcos Prado. Um filme sobre as dificuldades de alguém, ciente de sua condição psicótica, que precisa catar lixo para sobreviver e, mesmo assim, mantém o pensamento ordenado e uma clareza de idéias invejável. Um documentário sobre a perda da fé, sobre a visão de que Deus é somente um alívio paliativo para as dores dos que sofrem. Nada mais. E se as pessoas preferirem viver à sombra da verdade, encarando, sem apegos intangíveis, seus problemas? A realidade é dura, mas, para alguns, ainda é melhor do que jogar esterco ao céu esperando que dele caia, ao invés de merda, adubo.