É notório o repúdio de David
Lynch a Duna, filme do qual não teve controle
criativo. Fica evidente, desde o início, a falta de um toque puramente lynchiano, boa parte por estarmos no
terreno complicado das grandes produções (com efeitos especiais e cenários
grandiloquentes), ou seja, de antemão, contra o restante da obra de Lynch, no
mais, pessoal e repleta de signos. É claro que a arbitrária montagem - feita à
revelia do cineasta - ou as recriações cênicas tão suntuosas quanto datadas
(desde o lançamento), são problemas alheios à vontade de Lynch, então preso por
contrato. Mas não sejamos condescendentes com o diretor e lhe imputemos parcela
de contribuição ao fracasso. Lynch sempre tão afeito a construções imagéticas e
sonoras de expressividade ímpar, parece resignado em sua castração patronal, porque
filma Duna preguiçosamente, sem
ressaltar, em qualquer momento, justo esses aspectos, os mais marcantes de seu
cinema.
Em A Mosca, Cronenberg preza pelo concreto e as modificações
fisiológicas, explorando a tão discutida hipótese da metamorfose genética, aqui
advinda de experiências científicas. Já antes de virar “criatura”, o
protagonista é tido como inadequado ao meio, situação em muito aumentada quando
passa a definhar, pois acidentalmente misturado a um inseto. Então, ainda mais
solitário - mesmo na companhia da jornalista por ele afeiçoada -, se vê diante
do contexto social avesso aos seus transtornos. Tal sofrimento alude à
intolerância ao estranho, àquilo fora de nossa compreensão. Curioso, em A Mosca, Cronenberg recorre ao onirismo, na passagem em que Veronica
é acometida pelo pesadelo de dar à luz a uma criatura bizarra, amorfa, doente,
tal e qual o genitor em gradativa transformação.
Difícil, então, estabelecer links
entre Duna e A Mosca, quiçá pela natureza do primeiro, produto altamente
controlado por produtores, em choque com a do segundo, por sua vez, passo
importante rumo ao amadurecimento de estilo sui
generis. Quando muito, dá para aproximar as transformações dos
protagonistas (Paul Atreides ao cumprir destino messiânico e Seth Brundle ao
tentar novo paradigma científico). Dessa
forma, mais simples correlacionar o filme do canadense a outros do americano,
ainda que, mesmo assim, obras de propostas e ordens diferentes.
A Mosca lembra, de alguma maneira, a verve trash de Eraserhead. Aliás,
provavelmente são esses os filmes mais pessimistas dos Davids, em especial por
conta dos encerramentos fatalistas: num, o humano transformado
irremediavelmente em inseto, e noutro, o equivalente incomodado profundamente por
desordens psíquicas.
Por Ana Carolina Grether e Marcelo Müller
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DUNA – Por Mana Melo
Em 1984 Dino de Laurentis produziu e David Lynch dirigiu e roteirizou a adaptação do livro de Frank Herbert, Duna de 1965, um filme de ficção cientifica que vinha no rastro de grandes sucessos do gênero. Uma mega produção que não obteve retorno comercial.
Duna é o outro nome do Planeta Arraquis, único lugar que produz a “especiaria”. Na luta pelo controle de sua extração, ocorrem golpes dentro da estrutura de castas e com isso a insurgência do personagem do herói predestinado, que lidera os rebeldes, aliado a natureza hostil do planeta.
A versão original do diretor possuía mais de três horas e meia, que foi cortada e editada contra sua vontade e Lynch se recusou a ter o nome nos créditos, substituindo por pseudônimos que expressavam a sua revolta. A tentativa de mudar o perfil do filme, tornando-o mais digerido e atrativo comercialmente, foi o que certamente comprometeu seu resultado nas bilheterias.É uma obra altamente criticada, mas a meu ver que tem profunda relevância para o cenário da ficção cientifica e dos efeitos tecnológicos em evolução. Duna tem no elenco nomes como Kyle MacLachlan, Sean Young, Sting, Patrick Stewart, Max von Sydow, Virginia Madsen e foi certamente, o responsável pelo afastamento de Lynch das mega produções e o aproximou definitiva e intrinsecamente do cinema independente.
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A MOSCA – Por Rafael Lorenzi
Um dos mais conhecidos de Cronenberg, A Mosca conta a história de um cientista - Jeff Goldblum - que criou um teletransporte. Em um coquetel acaba conhecendo a jornalista – Genna Davis – com quem começa um relacionamento. Entre a ideia de documentar o projeto e alguma crise de ciúmes, o filme mostra, de uma forma bem dinâmica, a transformação de Seth (devido a um teletransporte mal sucedido).
A transformação física, a mistura de seres tão diferentes e toda maquiagem (a qual ganhou o Oscar) para fazer o homem em mosca, impressiona, e talvez por isso eu tenha me interessado pelo filme ainda na minha adolescência.Transformação que Cronenberg tanto gosta, da tecnologia mudando a vida do homem que a usufrui, talvez esteja no ápice nesse magnífico filme, com uma mosca toda articulada com 2 metros de altura tentando de todas as formas reverter o processo que parece sem volta.
E ai está o maior ponto da história: evitar o inevitável, a angústia do nosso homem-mosca, mais mosca que homem, tentando reaver a mulher amada ao mesmo tempo em que pede para ela se afastar. Angústia que chega ao ponto de tentar fundi-la a si mesmo.A angústia da nossa mosca-homem lembra a barata de Kafka.E sim, eu disse TRANSFORMAR o homem em mosca. A mosca se apoderou.Porque no final, o que restou do homem?
Achei a ideia super interessante a ideia de trabalhar 2 diretores de personalidades e obras tão distintas e ainda mais de fundir as análises produzidas a 8 mãos muito criativa e dinâmica! Gostosa de acompanhar... E de participar!
ResponderExcluirObrigada pela oportunidade, estou adorando!
Algo que posso comentar sobre a similaridade entre os filmes: ambos produzidos nos anos 80 (Duna 84 - The Fly 86), num período em que as ficções científicas estavam ressurgindo com força total depois do sucesso de STAR WARS, STAR TREK,BLADE RUNNER, ET...
ResponderExcluirMana,
ResponderExcluirSó vou te dizer uma coisa: eu fã do Lynch que sou, com todos os exageros e paixões não conseguiria escrever metade do que você escreveu. Quase como tirar leite de pedra hehe. E muito legal suas observações, todas!!
Rafa, mandando muito bem na psicologia do Homem-Mosca, adoreiiii hehe.
beijão
Obrigada Carol, mas
ResponderExcluirDUNA provavelmente é dos poucos filmes do Lynch que me atreveria a escrever sobre... A maior parte de suas obras merece análise de pessoas, que como você, tem mais intimidade com seu universo denso e cheio de simbologia.
O Rafael mandou bem!!!
É uma vergonha, mas ainda não vi nenhum dos dois, e, agora mais do que nunca, sinto que TENHO QUE vê-los. Mandaram bem, Mana e Rafa. :)
ResponderExcluirMarcelo e Carol, excelente ideia. Parabéns pela iniciativa.
Beijos pra todos.
Não assisti aos filmes, mas logo lembrei de "A Metamorfose". Por isso, na condição de fã de Kafka, "A Mosca" despertou meu interesse de maneira mais latente.
ResponderExcluirGrande abraço.