PULP FICTION talvez ainda seja o
melhor filme de Quentin Tarantino. Há ali, nas conversas aparentemente banais
que precedem atos de violência, uma vontade de justamente expor a onipresença e
o caráter ordinário da violência. Os personagens divagam sobre qualquer coisa
antes de matar, de se drogar, de cobrar uma dívida à força, como se o que está
prestes a acontecer, ou seja, o ato violento, não fosse mais que um elemento
qualquer do dia. Há muita ironia em PULP FICTION, fato sublinhado em grande
parte pela trilha sonora repleta de músicas famosas (e muito boas), que, não
raro, com suas melodias e letras românticas, embalam atos de pura
barbárie.
Alex DeLarge e seus droogs
vagueiam cheios de moloko com drencrom pela cidade, tomados pela velha
ultraviolência, batendo em bêbados, acossando umas devotchkas por aí com o
velho entra-e-sai entra-e-sai forçado, pilhando casas e matando por diversão
horrorshow. LARANJA MECÂNICA, a visão de Stanley Kubrick para o romance de
Anthony Burgess, é uma obra-prima quase incontestável. Vê-la no cinema, em tela
grande, é uma experiência e tanto. O protagonista, cobaia de uma experiência
que busca extirpar impulsos agressivos de sua natureza, é até hoje um dos
maiores personagens do cinema. DeLarge é um agente do próprio caos, cujo
comportamento irascível é apenas o sintoma mais evidente de um distúrbio
(social) maior.
O DESPERTAR DE UMA PAIXÃO se
passa nos anos 1920, nos quais era normal uma mulher casar apenas para sair da
casa dos pais. A traição que motiva a ruptura emocional, já quando o casal
protagonista está na China, é o de menos, pois apenas um indício. O amor dá
lugar à indiferença, à punição cotidiana, isso em meio a uma severa epidemia de
cólera no interior. O que é pior (claro, metaforicamente falando), a
enfermidade física ou a cólera despejada sobre o outro? Nesse cenário de
desolação, o improvável acontece, e o amor antes imposto ameaça surgir genuíno,
contra todas as probabilidades. O DESPERTAR DE UMA PAIXÃO é um filme sóbrio
sobre sentimentos violentos.
WOODY ALLEN: UM DOCUMENTÁRIO dá
uma boa ideia da carreira desse artista que começou como escritor, passou a
apresentar-se em palcos de stand-up comedy
até construir uma sólida carreira no cinema. O diretor Robert B. Weide
enfileira depoimentos de artistas que trabalharam com Woddy Allen, críticos de
cinema, entre outros profissionais, analisando cronologicamente a trajetória –
e por conseguinte os filmes - desse que é um dos grandes cineastas americanos
(por mais que ele mesmo não se considere digno de pertencer a esse seleto
clube). O documentário é “quadrado”, basicamente expositivo, e tem óbvio viés
de fã. Nada que comprometa, ainda mais se você for também um fã de Woody Allen.
Diriam uns: “É só mais uma animação”. Pode até ser que neste primeiro momento,
com a sessão recém-terminada, COMO TREINAR O SEU DRAGÃO 2 seja para mim mais do
que fato ele é. Mas, ainda assim, sem medo da precipitação, digo que o achei um
dos melhores filmes do ano (sobretudo se o colocarmos na conta dos
blockbusters). A rebeldia do protagonista contra o destino imposto pelo pai, o
amadurecimento das relações, a quase simbiose com o amigo de estimação, a
descoberta inesperada da mãe, a tragédia que logo vem montada na arrogância de
um vilão caricatural e clichê (vá lá), e a liderança natural contra a tirania,
são elementos responsáveis por construir uma narrativa cuja profundidade, a meu
ver, não se esvai em meio às belas imagens e ao ritmo da aventura.
Muito bom, muito bom.
ResponderExcluir