Um tanto desconcertante a versão
de Fausto levada às telas por
Alexander Sokúrov. Sobre a história, não é preciso da base literária para sabê-la,
em linhas gerais, é claro: um homem vende sua alma a Mefistófoles em busca de
poder e respostas existenciais sobre corpo e alma. Este Fausto adapta a famosa obra aos tempos da Idade Média, utilizando o
entorno para, quem sabe, amplificar o périplo do doutor e de seu companheiro,
um ser deformado, acometido de dores intestinais, sôfrego, porém dotado da
astúcia conveniente aos preceptores.
Sokúrov reza pela cartilha de
Andrei Tarkovsky, mas, a bem da verdade, eventuais comparações ao grande
cineasta tendem a lhe desfavorecer. Enquanto o compatriota “esculpia o tempo”
autoral e sensivelmente, Sokúrov, em Fausto,
fica num meio termo incômodo, entre sua necessidade estética/pictórica e alguns
momentos de rara inspiração, como a sequência da autópsia. Fausto possui ritmo estranho, deliberadamente truncado, não é um filme
fácil. Mesmo chancelado pela conquista do Leão de Ouro no prestigiado Festival
de Veneza de 2011, polariza opiniões.
Como genuíno artista, Sokúrov
arrisca-se, e preconiza isso a seus colaboradores, vide a bela fotografia do
francês Bruno Delbonnel (de O Fabuloso
Destino de AméliePoulain), vertiginosa e de morfologia incomum. Ousa em apostar
nas percepções de um público que, supostamente, precisa atirar-se para fruir. O
risco merece recompensa, e dar outra chance a Fausto pode bem sê-la, pois, de cara, a exuberância visual e o fluxo
narrativo soam desencontrados. Arte ou engodo? Mesmo sem garantias, talvez apenas
a repetição nos faça gozar essa viagem marítima, sem tonturas, ambientados às torrentes
revoltosas pelas quais navega a nau de Sokúrov.
Publicado originalmente no Papo de Cinema
Que texto Marcelo!! Só torna Fausto mais denso do que imaginava!! Essa semana verei e voltarei aqui...
ResponderExcluirbeijos
Carol G.
Olá, Celito!
ResponderExcluirDarei preferência à obra literária e, depois, verificarei sua transposição às telonas.
Abraçossss