Não, Os Filhos do Padre (2013) não é sobre um pároco adepto do sexo sem
preservativos que sai fecundando as mulheres de seu vilarejo. Espera aí, quer
dizer, na verdade é sim, mas de maneira indireta. Recém-integrado a uma pequena
vila na Croácia, Fabian (KresimirMikic) se vê diante da dura tarefa de
substituir o antigo responsável pela paróquia local, um senhor alinhado à
comunidade em suas diversas atividades, inclusive com trânsito no Vaticano.
Vendo o número de mortes superar bastante o de nascimentos (estes cada vez mais
esparsos), o sacerdote novato tem a ideia de boicotar as camisinhas para, com
isso, forçar o crescimento populacional, mesmo contra a óbvia vontade dos
moradores.
A trama do filme é confessada por
Fabian a um colega mais jovem. As lembranças se iniciam no momento em que o
protagonista chega à cidade, posteriormente passando pelas dificuldades
enfrentadas por ele para marcar presença nesse lugar ainda bastante ligado ao
seu antecessor, indo até o desenrolar e as implicações do plano inusitado levado
a cabo com a ajuda dos dois únicos comerciantes de preservativos da cidade. Evidentemente
cômico, infelizmente com certos momentos em que o escracho o aproxima das comédias
rasteiras às quais estamos acostumados, Os
Filhos do Padre tem, contudo, um subterrâneo dramático que de vez em quando
emerge para amarelar os sorrisos da plateia.
Ora, se num primeiro momento é
engraçado testemunhar a maneira até um tanto ingênua com que Fabian e seus
ajudantes planejam ações, escolhem aleatoriamente pais para os filhos da
dúvida, se desdobram a fim de esconder os primeiros efeitos colaterais, aos
poucos o ar vai ficando mais pesado, sobretudo na medida em que as
consequências ganham gravidade e os personagens se dão conta dos danos por trás
de suas “boas intenções”. As figuras são caricaturais e assim soam muito bem para
além de qualquer complexidade que se queira atribuir a elas, exceção talvez
feita apenas a Fabian, cujas nuances são imprescindíveis a alguém que transita
entre a vontade de fazer o bem e a posterior culpa por ter ferrado um monte de
gente.
Pode não ser memorável esse Os Filhos do Padre, ou mesmo uma
realização que dure muito em nossa memória, mas não dá para dizer que seja inábil
ao combinar sutilmente alguns espectros cômicos e trágicos. A maioria das
situações apresentadas na trama nós já vimos em outros filmes, claro, com
variações. Certos desdobramentos são evidentes desde cedo, enquanto alguns nem
tanto e outros de antevisão praticamente improvável. Não sejamos, porém,
condescendentes com o filme apenas por ele vir de um país com pouca tradição de
exportação cinematográfica, fechando os olhos às suas fragilidades em virtude
do exotismo. Mas que também não neguemos tanto a graça de alguns momentos
quanto a eficácia de determinadas tragédias, ambos temperos do absurdo.
Publicado originalmente no Papo de Cinema
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