HOMEM-FORMIGA é outro tijolo na
construção da Marvel. Seguindo o padrão de qualidade dos filmes mais recentes
do estúdio, cumpre o papel de oferecer entretenimento. Aqui, porém, há o
resgate de uma característica das primeiras produções da Marvel: o humor. Paul
Rudd se sai muito bem como protagonista, dando um quê de deboche à maioria das
ações desse ladrão recrutado para ser herói, sem com isso enfraquecer os
momentos dramáticos. O subtexto da paternidade, com os pais fazendo de tudo
para que os filhos tenham um futuro melhor, a despeito das próprias
dificuldades com a representação da figura paterna, é raso, mas, mesmo assim,
confere à trama uma base humana interessante. É um filme que se vê com prazer,
pois não fere nossa inteligência e ainda oferece momentos de ação e emoção
engenhosamente construídos. Em meio a isso, a linha que costura o individual ao
plano maior, neste caso a provável entrada futura do Homem-Formiga no time dos
Vingadores. Saído diretamente de uma eficiente linha de produção, contudo, não
é uma realização descartável.
O que mais impressiona em OS
VISITANTES é a capacidade de Elia Kazan para sustentar o clima de tensão
durante boa parte da história. Os dois soldados que visitam o ex-colega que os
denunciou por um crime de guerra são presenças fortes, taciturnas. Um é
espalhafatoso, o outro possui um timbre de voz baixo, porém ainda mais
ameaçador. Os movimentos de ambos são bruscos. Toda essa fisicalidade dá conta
de instaurar o medo crescente. Contudo, na medida em que as coisas evoluem, um
forte viés psicológico se impõe. O protagonista se sente incomodado, mas não
consegue ser firme com os intrusos, chegando a deixar sua mulher sozinha com o
estuprador confesso. Ela, por sua vez, amedrontada no início, passa a flertar
com o homem que toca o terror na propriedade. A violência e a morte podem vir a
qualquer hora, por isso ficamos em suspense. O subtexto que dá conta das
cicatrizes de guerra, da moral elástica do soldado em combate, é menor diante
da forma, do jogo proposto por Kazan, no fim das contas, mais intrigante que o desfecho
relativamente previsível.
Os personagens de Aki Kaurismäki
são gente de ação, cujos atos atropelam a ponderação. Além disso, são pessoas
do povo, geralmente vivendo à margem. Em SOMBRAS NO PARAÍSO, um
catador de lixo se interessa por uma caixa de supermercado. A frieza do
semblante deles reflete o clima, a neve, o tempo nublado de Helsinki. A paixão
está ali, porém camuflada sob a aparente anestesia das expressões, dos movimentos
quase automáticos. Não há enrolação no cinema de Kaurismäki, alegrias e
tristezas se sucedem sem que a qualquer uma delas seja dada mais importância. Uma
fina ironia percorre as cenas, assim como um humor incomum, às vezes
autodepreciativo, mas, ainda assim, terno. A luta de classes está lá,
evidenciada na dificuldade desses marginais para inserir-se em determinados
lugares virtualmente proibidos à sua condição social. A tragédia é a do homem
comum, das batalhas cotidianas, seja por sobrevivência ou para obter um pouco
de dignidade e amor em meio a tanta sordidez. Os personagens fumam o tempo
todo, habitam lugares pouco iluminados, agem impulsivamente, tornando-se
símbolos de um cinema singular e excepcional.
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