Em O Homem que Sabia Demais (1956), remake do homônimo inglês de 1934
e dirigido pelo mesmo Alfred Hitchcock, o Dr. Ben McKenna (James Stewart)
passeia com a mulher e o filho pelo exótico Marrocos após um congresso profissional
na França. A esposa, Jo McKenna (Doris Day), desconfia desde o início do
francês enigmático que os ajuda – por saber falar “algumas” palavras de árabe –
a sair de um incidente ocasionado por diferenças culturais/religiosas. Após o
ocorrido, ela mantém um pé atrás, no que não sabemos de antemão ser fruto do
sexto sentido feminino ou da paranoia. Enquanto explora a localidade, a família
mal sabe que é enredada num complicado caso de disputas internacionais.
Alfred Hitchcock não ganhou a
alcunha de “mestre do suspense” por acaso. Em O Homem que Sabia Demais, por exemplo, ele injeta pequenos
conflitos em sequências aparentemente feitas para servir de interlúdio entre
uma e outra de relevância mais evidente. Tal artifício narrativo confere ao
filme um permanente clima de tensão. Mesmo quando o casal se diverte com a
própria ignorância quanto à culinária local e os modos de comer muito
diferentes dos quais estão habituados, há intervenções que transpassam as
amenidades, isso para reforçar a sensação de perigo latente. Essa arquitetura
vista, sobretudo na primeira parte, prepara o terreno para quando, de fato, a
trama entrar mais explicitamente no campo das intrigas.
O Dr. McKenna e sua esposa logo
se veem num dilema: resgatar o filho ou impedir um assassinato. A busca é
dificultada pela falta de experiência de ambos no campo investigativo, a
impossibilidade de recorrer à polícia e pelo tempo que se esvai aos poucos,
assim diminuindo as chances de sucesso em qualquer dos caminhos que decidirem
tomar. Como dar conta da dupla demanda, cujo entrecruzamento respinga nas
esferas pessoais e políticas, sendo completamente leigo nos jogos escusos de
espionagem? Alguns dos mais célebres
filmes de Hitchcock são, da mesma maneira, protagonizados por pessoas “comuns”,
envolvidas – geralmente por estarem no lugar e na hora errados – em imbróglios espinhosos
e, não raro, repletos de agentes e manobras. É, por assim dizer, uma situação
cara ao cineasta inglês.
Outro artifício de destaque em O Homem que Sabia Demais é a trilha
sonora. Criada por Bernard Herrmann, colaborador frequente de Hitchcock, ela
ajuda a conduzir de maneira muito eficiente o espectador pelos rumos da
história. Além disso, a música diegética é protagonista de pelo menos duas
cenas capitais: numa delas, a familiaridade de uma canção que ajuda a aproximar
mãe e filho, e na outra, transcorrida no Royal Albert Hall, em que a combinação
exemplar de ritmo, som e imagem cria uma alta voltagem de suspense. O Homem que Sabia Demais é, assim como
muitas outras realizações de Hitchcock, grande na medida em que percebemos os
meios complexos utilizados pelo cineasta para fazer um filme (aparentemente)
simples ao espectador.
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