segunda-feira, 21 de junho de 2010

De tanto bater, o coração de Saramago parou


José Saramago morreu. Triste sim, mas não surpresa se levarmos em conta a saúde debilitada que lhe era peculiar nos últimos tempos (e que o luso teimava em não demonstrar), e sua idade avançada, 87 anos. Dizem por aí, e com sua morte os elogios se intensificarão, que Saramago era o maior escritor vivo da língua portuguesa. Não posso afirmar com tanta certeza, afinal em termos de literatura sou um iniciante, alguém que ainda tateia à meia-luz em busca de referências, de experiência no mundo das letras. O que do “alto” de minha ciência, que se não é lá estas coisas para os outros, para sim serve de algo, posso dizer é que Saramago era polarizador, difícil era ficar no meio termo diante de sua prosa ou mesmo de suas opiniões, que iam de polêmica em polêmica, geralmente em ataques à religião (era ateu) e ao neoliberalismo (era comunista), angariando, em semelhante número, detratores e admiradores. Não entro no mérito religioso e político, detenho-me em suas palavras, ofício que lhe trouxe tardiamente sucesso, reconhecimento e um Prêmio Nobel de Literatura, o único a um escritor de língua portuguesa. Não é pouco. 

Saramago escrevia de maneira muito peculiar, com raros pontos finais e longas frases cadenciadas por vírgulas. Ele evitava parágrafos, o que torna suas páginas monoblocos de texto, afugentadores daquele leitor que busca constante respiro nas alíneas. Sua narração não raro é interrompida por uma divagação que parece alheia ao principal, uma digressão que, conforme vai se tomando contato com sua obra, constata-se recorrente, parte de seu estilo. Não é literatura fácil, muitos o acusam de ininteligibilidade, mas certamente tem recompensa certa os que apreciam seu estilo. A perda de Saramago não somente será sentida pela impossibilidade de novas obras, pelo encerramento do ciclo de um artífice da palavra, mas também porque, independente de concordarmos ou não com suas posturas sociais radicais, perdemos um pensador, algo que rareia cada vez mais.

Um comentário:

  1. Oi, Celo!
    Saramago era um mestre da língua, com opiniões sempre muito bem fundamentadas e que faziam, aos desavisados, nelas mergulharem sem ao menos refletir sobre o ato ou sob que matéria nadavam. Uma perda irreparável.

    Abraçosss e parabéns pela homenagem.

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