sábado, 31 de dezembro de 2011

Melhores de 2011


Listas foram feitas para que nos arrependêssemos logo após sua divulgação. Sobrepor filmes anualmente está mais para uma brincadeira hierárquica, que não necessariamente faz justiça aos melhores do ano. A relatividade destas classificações cresce, ainda, quando compreendida a relação mutante entre espectador e filmes. Brincadeiras ou não, úteis ou descartáveis, seguem nossas listagens - nunca definitivas - dos melhores do ano, e algumas menções honrosas que se fizeram necessárias.

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CONRADO HEOLI 

Melhores

1. Namorados Para Sempre 
2. Meia-Noite em Paris 
3. Cisne Negro 
4. Riscado 
5. Melancolia
6. O Garoto da Bicicleta
7. Cópia Fiel 
8. Poesia 
9. Incêndios 
10. Inverno da Alma

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MARCELO MÜLLER 

Melhores

1. Cópia Fiel 
2. Melancolia 
3. O Garoto da Bicicleta
4. A Árvore da Vida 
5. Tetro 
6. Singularidades de uma Rapariga Loura
7. Super 8 
8. Transeunte 
9. Meia-Noite em Paris 
10. Cisne Negro 


Menções Honrosas 

Um Lugar Qualquer 
Margin Call - o Dia Antes do Fim 
Tudo pelo Poder


Publicado originalmente em Papo de Cinema

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RAFA MÜLLER 

Melhores

1. A Árvore da Vida 
2. Morro do Céu 
3. Cópia Fiel 
4. Cisne Negro 
5. O Palhaço
6. Melancolia 
7. Chuva
8. O Discurso do Rei 


Obs.: Caro-amigo leitor, minha lista é menor do que a dos meus colegas e amigos de blog, pois assisti apenas a esses 8 filmes lançados de forma oficial aqui no Brasil. Assim sendo, apenas os organizei, conforme grau de preferência no momento presente.

No mundo nada se perde, tudo se anuncia.





Olá, caro amigo-leitor!

Passados meses sem linhas escritas por minha pessoa aqui neste espaço, com exceção das que estão represadas nas janelas de comentários, sufocadas pelo deslocamento e pelo tom coadjuvante de participação, volto pela obrigação imposta por obra literária de primeira.

O último livro do ano, Crônica de Uma Morte Anunciada, do mestre Gabriel Garcia Márquez (Cem Anos de Solidão), foi apreciado pelo Marcelo, irmão e colega de blog, há alguns anos, indicado/obrigado por uma disciplina na universidade. Lembro que na época teceu vários comentários, todos bastante positivos. Hoje, posso atestar que a tenra idade lhe foi suficiente para lhe guiar a um discernimento adequado.

A história aborda a morte de Santiago Nasar, suas conseqüências e reflexos, num povoado rural de tempos já idos. O jovem é assassinado pelos gêmeos Vicário, cujo objetivo é restabelecer a honra perdida da irmã, supostamente tomada pelo protagonista brutalmente retalhado, tal qual um suíno em mãos cruéis.

O autor colombiano já condecorado com o prêmio Nobel, arquiteta de maneira habilidosa as relações dos moradores/personagens com a tragédia, anunciada muito antes de ocorrer. Interessante notar como as tradições impulsionam engrenagens, mesmo enferrujadas ou sem a intenção, por parte dos envolvidos, de colocá-las em movimento.

Os homicidas utilizam da fala para transmitir o que os tornará aptos ao título da palavra segunda deste parágrafo. Não buscam a notoriedade, antes, que alguém creia que, mesmo embriagados e donos de temperamentos destoantes do que se anuncia, impeça e ainda testemunhe a reação e tentativa dos consanguíneos. Sem crime e acerto de contas promovido. Perfeito. Seria perfeito. Pena que logo nas primeiras frases do pequeno livro o autor já nos garante a morte do jovem. Aos poucos tudo se encaixa, de maneiras imprevisíveis, feito na vida. 


Ah, aproveitando a data, que 2012 seja um ano de fervo cultural, seja no público ou no privado.. Abraçosss

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Margin Call - O Dia Antes do Fim


O ano de 2008 foi fatídico para a economia mundial, pois nele eclodiu a famigerada crise econômica que tragou diversas empresas e, num efeito cascata, proliferou para além dos Estados Unidos, onde se originou. A também chamada “crise dos subprimes” germinou com a falência de algumas instituições americanas de crédito que concediam empréstimos hipotecários de alto risco, levando consigo outros tantos estabelecimentos financeiros, em movimento que repercutiu globalmente nas bolsas de valores. O tema surge vívido em Margin Call - O Dia Antes do Fim, estreia em longas-metragens do roteirista e diretor J.C. Chandor, admirável suspense sobre os detonadores da tal crise. 

Evitando qualquer aproximação com visões maniqueístas do mercado financeiro, que pintam os integrantes destas complexas engrenagens como seres desalmados, ávidos por lucratividade, em abordagem que infelizmente encontra eco no senso comum, J.C. Chandor presta-se em Margin Call - O Dia Antes do Fim a uma observação mais angustiada da força humana empregada na movimentação da maquinaria capitalista. A primeira cena evidencia bem a instabilidade deste meio de rentabilidade proporcional aos riscos. Diversos profissionais adentram um escritório para executar demissões em massa. Assemelham-se a um pelotão militarizado de execução. Feitas as devidas contextualizações, não sobram tantas diferenças entre uns e outros. 

Algo precisa ser feito para salvar um gigante capitalista, nem que isto reflita catastroficamente na economia mundial. Vender títulos antes que compradores percebam neles valor ínfimo, como isto transmitindo vírus altamente contagioso, é apenas um procedimento visto com a praticidade característica do mercado. O grande vilão de Margin Call - O Dia Antes do Fim é o próprio sistema financeiro, um abominável disforme que utiliza as pessoas que o manipulam e que dele se utilizam, apenas como hospedeiros. Ninguém é integralmente bom ou mal. Do diretor que ordena ações desafiadoras de básicos preceitos éticos, ao jovem ambicioso que larga a profissão na engenharia por um lugar neste negócio de ganhos mais atraentes, todos são vítimas e algozes, pouco hesitantes ante a possibilidade de aumentar receitas e garantir seu futuro. Alguém poderia condená-los sem hipocrisia? 

Suspense engenhoso, de elenco robusto (como é bom ver dois grandes atores como Kevin Spacey e Jeremy Irons, para citar apenas dois, envergando papeis de extrema relevância novamente no cinema), Margin Call - O Dia Antes do Fim é uma das gratas surpresas da temporada americana, prioritariamente indigesta e anódina, envolta pela arrecadação de filmes que circunscrevem tudo dentro de limites banais ou rasteiros. J.C. Chandor, responsável pelo roteiro e direção, mostra credenciais de quem tem o que dizer, e sabe como fazê-lo de maneira eficiente. O roteiro se prende ao essencial, possui ritmo e aposta num espectador mais antenado em ações e reações, do que propriamente ligado nas minúcias do epicentro capitalista. Ante a dramaturgia sólida e a diretiva inspirada, pode-se perfeitamente prescindir do entendimento de jargões financeiros, sem que haja qualquer perda significativa. No final das contas, ficcionalizar o estopim de uma crise de proporções globais só faz sentido se a resultante espelhar com esta agudeza a relação “homem X dinheiro”. Entre corruptíveis, idealistas e aparentes canalhas, todos são humanos, demasiadamente humanos.


Publicado originalmente no Papo de Cinema

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Atoladinha plurisemiótica

Dia destes, navegando sem rumo pela internet, encontrei este vídeo maravilhoso protagonizado por Tom Zé, um dos mais criativos e “estrombólicos” músicos de nosso país. Confesso que não conheço sua sonoridade a ponto de tecer qualquer comentário mais profundo, mas, do que sei, chama a atenção esta busca por tangentes, por lugares e formas negligenciadas na criação ou mesmo no pensamento acerca da música. No vídeo em questão, durante entrevista concedida ao Programa do Jô, ele filosofa sobre o funk Atoladinha, e explica por que ele tem meta-refrão, microtonal e plurisemiótico. Não entendeu? Assista, é uma lição de pensamento satírico bem-humorado em sintonia com a reflexão intelectual.



Atualização: Nossa seguidora no Twitter, Noemia Menezes (@ziguezaguiando) acaba de enviar um link que complementa esta postagem matinal: Funk - Interpretando. Hermenêutica pura. Obrigado Noemia.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Bem-vindos a Twin Peaks


Somos uma geração devidamente acostumada às boas (até mesmo excelentes) séries de televisão, muito pela transformação do meio em terreno fértil para projetos cada vez mais interessantes. Mas, nem sempre foi assim. Twin Peaks, seriado capitaneado pelo cineasta David Lynch, foi uma espécie de divisor de águas neste sentido, quando lançado lá nos idos anos 90. O público certamente não estava acostumado àquele tipo de experiência, possuidora de complexidades inabituais em projetos para a telinha. Mas, para a surpresa de muitos, “Quem Matou Laura Palmer?” virou pergunta recorrente, propriedade do imaginário coletivo, assim como os personagens e situações que movimentaram a pequena cidade do interior dos EUA por duas temporadas. 

A morte da linda Laura Palmer, cujo corpo é encontrado envolto em plástico, boiando no rio da cidade, desencadeia uma série de eventos que mostram a localidade como depositária de segredos, intrigas e mistérios, insociáveis num primeiro momento às suas belas paisagens, repletas de bosques e charme rústico. O agente do FBI Dale Cooper desembarca neste cenário idílico e machucado para investigar a morte da jovem, e acaba se afeiçoando demais às pessoas, ao clima campestre e aos donuts que adoçam os interlúdios do processo investigativos. Cooper, aliás, é um personagem fascinante, visto com o mesmo estranhamento e simpatia fraternal com que encaramos, por exemplo, a senhora que anda para lá e para cá embalando e trocando ideias com um tronco. 

Conduzidos pela magistral trilha de Angelo Badalamenti, repleta de sons estranhos e soturnos, somos levados a desvelar esta coletividade que, a despeito de estar inserida numa pequena comunidade, possui as mesmas pragas cotidianas que tornam enfermas as metrópoles. A mão de David Lynch é evidente, sua verve esquisita (algo entre o surreal e o abstrato) é facilmente percebida, pois impregnada na ambientação atmosférica, nos tipos estranhos, e na maneira cotidiana de lidar com anões que dançam, gigantes mensageiros e entidades maldosas vindas de dimensões desconhecidas. O bizarro é apenas mais um dos convivas de Twin Peaks

É certo que nem tudo são flores. Após a solução principal, ou seja, quando finalmente sabemos quem matou Laura Palmer, a qualidade do programa cai sensivelmente, não propriamente pela falta do mistério, mas por que se insiste no desenvolvimento de tramas paralelas que beiram o banal. Neste momento, Twin Peaks só não fica de todo desinteressante por conta da riqueza de seus personagens, e empatia por eles estabelecida com o público. Porém, com a chegada de Window Earle, o psicopata ex-parceiro de Cooper, e sua vocação assassina, o seriado volta a ganhar fôlego, inclusive no desenvolvimento bastante engenhoso dos elementos que dão conta das dimensões paralelas e polares que explicam, de alguma maneira, fenômenos bizarros que acometem a cidade. Se bem que, ao tentar elucidar este embate metafísico entre bem a mal, tira-se um pouco do instigante mistério da primeira parte, em que tudo estava devidamente envolto na bruma do incompreensível. 

Feitos os devidos reparos, não há como negar o caráter vanguardista de Twin Peaks, série que, por seu sucesso junto ao público, foi uma das ignições do movimento que hoje nos permite constante renovação nas produções televisivas americanas. Não é pouca coisa. Assim como não são poucos os méritos artísticos desta cria autêntica de David Lynch, artista sui generis, que antes de dedicar-se de corpo e alma às causas da meditação transcendental, nos ofertou diversas obras fascinantes. Twin Peaks está na galeria dos grandes trabalhos de Lynch, seja pela primazia de figuras dramáticas tão interessantes e cheias de camadas, pelas inspiradas construções, fabular e narrativa, ou ainda pela disposição em mostrar, cravado num cenário pouco explorado, o potencial de uma trama que, com raras exceções, recusa veementemente confortar o telespectador.


Publicado originalmente no Papo de Cinema

sábado, 3 de dezembro de 2011

Estrangeiro em Meu País


O mote de Meu País, longa-metragem de estreia do diretor André Ristum, não é propriamente novo ou merecedor de relevo pela originalidade: homem volta à terra de origem para sepultar um ente querido, neste caso o pai, retomando então o contato com suas raízes, aproximando-se do que era para então descobrir-se. É bom que não se entenda a originalidade da trama como pressuposto de filme bom ou ruim. Então, aos que clamam por algo novo a cada experiência, recomendo olhar retrospectivo mais atento às semelhanças fabulares que tornam parentes até mesmo incontestes obras-primas. 

Pois bem, Rodrigo Santoro interpreta Marcos, o homem que volta ao seu país para enterrar o pai, e desenterrar (perdoem-me a troça lingüística) uma série de elementos que remetem à sua infância, principalmente o dito pai, aparentemente ausente, a quem chama pelo nome próprio, e o irmão inconseqüente que promete levar a empresa da família à bancarrota pelo vício em jogos de azar. Marcos é estrangeiro no próprio país, um alheio na casa que guarda suas coisas de menino. Sua esposa, uma bela italiana, fica fascinada ao contemplar as imagens familiares do marido, a quem parece conhecer de todo naquele momento. Bela cena, aliás, como também aquela em que os irmãos descobrem o testamento afetivo do pai, impresso num vídeo feito com máquina fotográfica. Difícil conter o marejar dos olhos, semelhante às lágrimas que teimam em brotar no racional Marcos, num dos raros momentos em que ele se entrega à emoção. 

Não há, porém, qualquer intenção de Meu País ser um filme tipo “acerto de contas”, como tantos por aí. Não se trata, também, de manifestar a construção do homem por base naquilo que vivencia enquanto criança. Não obstante, esta ótima estreia de Ristum é feita muito mais de silêncios e sugestões, do que propriamente de palavras e quaisquer rompantes emocionais, mesmo quando insere a irmã bastarda com deficiência intelectual na relação tempestuosa dos dois irmãos. Há os que objetam o isolamento dos personagens, órfãos de uma contextualização social. Não creio ser isto um problema, ainda mais quando se entende Meu País como uma obra voltada aos seres, na qual os entornos apenas os refletem, e bem, é bom que se frise. 

André Ristum demonstra as inconstâncias diretivas naturais de um primeiro trabalho em longa-metragem, mas nada que mine substancialmente o desenrolar de seu drama familiar, aliás, muito bem conduzido. O  não-pertencimento sentido pelo personagem de Santoro o choca contra um país que teima em mantê-lo, seja para que resolva os problemas do irmão (em outra atuação interessante de Cauã Reymond), ou mesmo pela súbita necessidade de cuidar da frágil irmã (construída sobriamente por Débora Falabela). Ao diretor cabe sugerir mais que dizer, confiar plenamente no elenco ao colar a câmera nas expressões, e jogar na tela seu imaginário, que se em pouco reflete socialmente o Brasil (e por que deveria?), certamente espelha o que de mais angustiante habita em seus personagens.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

A espera que leva a Matar ou Morrer


No dia do seu casamento, o xerife Wil Kane, prócere de uma pequena cidade no Velho Oeste americano, recebe a notícia de que o bandido Frank Miller teve seus crimes perdoados, e que chegará em poucas horas para levar à cabo a vingança contra quem o expurgou da localidade. O principal alvo de Frank, e dos três comparsas que aguardam sua chegada no trem do meio-dia, é justamente Kane, que se recusa a fugir mesmo sob protestos da mulher e aconselhamentos dos moradores. Começa então uma verdadeira corrida contra o tempo, em que Kane tentará buscar a ajuda dos corajosos locais, a fim de que não padeça.

Em Matar ou Morrer, este célebre western de Fred Zinnemann, a jornada física e psicologicamente desgastante do xerife Kane, bem como a apatia do povo que não parece disposto a se arriscar por quem no passado restaurou a paz local, dão a tônica narrativa, que impressiona ainda pela precisão e poder de síntese. Em menos de 90 minutos, Zinemann cria uma obra marcada pela tensão crescente, assim como pela impossibilidade da inércia ante uma situação que conduz inevitavelmente à tragédia. Para Kane é matar ou morrer, não existem saídas diplomáticas no oeste de homens bravios que defendem suas honras pela lei do olho por olho, dente por dente.

Desencorajado por todos, acuado e dividido entre os sensos de justiça e sobrevivência, o xerife Kane, interpretado brilhantemente por Gary Cooper, experimenta a solidão que só se agrava pela proximidade da morte, também provando o gosto amargo da hipocrisia e covardia dos próximos, verdadeiras antíteses do tipificado cowboy americano. O próprio Kane fraqueja, transpira medo mesmo quando tenta, em vão, convencer homens de fé inabalável a largarem suas posturas individuais na defesa de suas terras e de quem já muito os ajudou. A memória do povo é curta, e a ingratidão está aí para provar isto.

A música desempenha papel fundamental em Matar ou Morrer, pois auxilia sobremaneira no desenho do turbilhão de sentimentos vividos pelo protagonista, pesaroso da ausência da mulher que ama, ao mesmo tempo em que precisa criar uma tática de sobrevivência. O clímax pode parecer apressado, até mesmo simplista se enxergarmos as etapas anteriores do desenvolvimento narrativo apenas como preparação para o derradeiro. Mas justamente pelo contrário - o clímax na verdade serve de amplificação dos temas abordados nas fases passadas, é que Matar ou Morrer se mostra poderoso em suas intenções incomuns. Um filme belissimamente fotografado em preto e branco, que desconstrói o homem do oeste que nada teme, mostrando que mesmo os mais intrépidos daquela época, tremiam internamente ante a possibilidade de terem ceifadas suas vidas. 


Publicado originalmente no Papo de Cinema

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

The Walking Dead e os comerciais da raposa

Crédito da Imagem: Blog do Jotacê

Gosto da série The Walking Dead, mas não sou fanático. Para ser sincero, me aborrece um pouco a segregação que nela ocorre entre os bons e os maus, entre a virtude e a canalhice, num belo exemplo de maniqueísmo. Fora isso, tudo é um pouco enrolado, cozido em banho-maria, mas mesmo assim assisto, pois se está longe de ser algo digno das expectativas e da euforia de alguns, ao menos é um bom entretenimento com certa dose de tensão.

Todo episódio inédito é lançado nos domingos em terras americanas, e a Fox, emissora de TV fechada que transmite por aqui, presta um verdadeiro serviço ao exibi-la logo na terça-feira seguinte, ou seja, apenas 48 horas após a apresentação estadunidense. Mesmo sendo adepto do download (uma vez era reticente, hoje sou partidário), resolvi, juntamente com meu irmão e parceiro de The Walking Dead, Rafa Müller, prestigiar esta ótima iniciativa do canal de encurtar a janela de exibição entre EUA e Brasil, pois temos TV por satélite em casa, numa operadora que permite assistir ao programa no idioma original e legendado (certamente nem teria cogitado assistir tudo dublado). Tentei, juro, mas não dá. Voltarei ao download.

Irritei-me extremamente com a exibição entrecortada por dois blocos de 10 minutos (sim, eu disse 10) de propaganda. Cada episódio possuiu 40 minutos, e a Fox faz o seguinte: exibe os primeiros 20, vai para o primeiro grupo de propagandas bregas sobre perfumes importados, volta com mais 10 de série, pula para outros 10 intermináveis dos mesmos comerciais, e retorna lépida e fagueira para a exibição dos últimos 10 minutos de The Walking Dead. Pode isso Arnaldo?

Ah, façam-me o favor. É inadmissível que ocorram duas interrupções tão implacáveis e prolongadas que, inevitavelmente, quebram o ritmo da audiência. E depois reclamam dos downloads, de quem baixa e confere de maneira “clandestina”. Tenham um pouco mais de consideração por quem assiste, ganhem dinheiro (afinal isto não é pecado algum), mas não sejam estúpidos, ao menos não o suficiente para acreditarem que com pausas tão ridículas e estendidas, teremos ainda a boa vontade de “fazer o certo”. Afinal de contas, quando ligava (atenção ao tempo verbal) às 22h, terça-feira, na Fox, era para assistir The Walking Dead, não repetidos reclames dum perfume Jean Paul Gaultier.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Asghar Farhadi - Cinema humano de resistência


Estava sentindo falta dos meus pequenos devaneios. Muito por conta da nova função como articulista e crítico do site Papo de Cinema, tenho me dedicado com mais afinco de fato às críticas, negligenciando assim estas pequenas reflexões cotidianas acerca da arte, mais provavelmente do cinema. Pois bem, na última semana tomei contato com os dois mais recentes (e badalados) filmes do iraniano Asghar Farhadi: Procurando Elly e A Separação, portadores de diversas láureas em festivais ao redor do mundo. Ambos, dramas aparentemente detonados por quase banalidades: o desaparecimento de uma semi-desconhecida, e a separação de um casal qualquer. 

Numa produção ordinária, seria natural que estes motivos fossem apenas deflagradores de uma série de rompantes emocionais. Ainda que repletos de arroubos passionais, afinal tratam de gente, estes filmes emergem da mesmice ao catalisar ações e reações essencialmente como maneira (brilhante) de refletir sobre a sociedade donde brotaram. Embate de classes, o arraigado fundamentalismo religioso, a lei que se curva aos preceitos morais e éticos do Corão, a opressão da mulher ainda coberta pelo chador, e por aí vai. O diretor e sua equipe se valem de linguagem naturalista, câmera na mão, e inspirada mise-en-scène que reforça o sentido de cotidiano. Nada fronteiriço entre o fabular ficcional e a emulação engessada do real, é bom que se diga, mas portador de certo frescor, digamos, verdadeiro, que permeia sobremaneira o que se propõe e dispõe como legítima ficção. 

Sem ao menos resvalar no didático, e negando qualquer aproximação com alguns “filmes para gringo ver”, que se excedem ao valorizar aspectos exóticos aos de fora, Procurando Elly e A Separação são, além de testemunhas filiais do talento legítimo de Asghar Farhadi, sinceras lições a respeito do Irã e de sua sociedade convulsionada. Aprende-se mais sobre aquele entorno na audiência de ambos, do que nos noticiários tendenciosos, que só fazem aumentar estereótipos. Cinema pungente, político e social, voltado às pessoas que tanto são afligidas por elementos que deveriam lhes confortar.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Confiar e as vítimas do sexo institucionalizado


David Schwimmer, o eterno Ross da série televisiva Friends, passeia por campo minado em sua nova incursão atrás das câmeras de cinema. Falar de sexo, relações virtuais e frustrações, é um tatear a cada nova cena por emoções e situações que, não raro, contribuem para desenvolvimentos planos e sentimentaloides. Em Confiar, Annie é uma menina como tantas outras, repleta de dúvidas e baixa autoestima, que se apaixona pela internet e estabelece relacionamento virtual paralelo ao que mantém com sua família e amigos. Ela não hesita muito em ir ao motel com o homem de quase 40 anos que na web se dizia um adolescente tão cheio de incertezas quanto ela.

Há a descoberta do caso pelos pais, a interferência do FBI e toda uma busca pelo pedófilo. Will, o pai, interpretado por Clive Owen (num registro que lembra noventa por cento das interpretações deste bom ator meio monocórdico) fica obcecado por encontrar o homem que molestou sua garotinha. O paradoxo se apresenta em sua profissão, utilitária da erotização adolescente para aumentar as vendas de seus clientes. Contradição rasa, pouco desenvolvida, que soa mais como reprimenda e chamamento moralista à reflexão do espectador sobre a sociedade em que vive. Intenção boa, por certo, mas delas o inferno está cheio. A desabalada carreira de Will em busca do bandido esbarra ainda na dificuldade da investigação, agravada pela própria filha, enamorada de seu suposto agressor. Estupro, sexo consentido, ou algo que uma adolescente de quatorze anos ainda não tem maturidade para avaliar?

Confiar é um tanto perdido em seu próprio escopo, indeciso entre o drama familiar e a expansão de sua causa como exemplo de algo maior e cotidianamente preocupante. Will parece mais atormentado por sua impotência do que propriamente pelo delito cometido, e Annie reluta enquanto amada, aceitando-se vítima do crime somente após tomar conhecimento de que não foi especial para o meliante. Confiar discute com pouca profundidade o nocivo protagonismo do sexo na sociedade, mas talvez seu maior pecado seja o de não assumir posicionamentos que fujam do senso comum. David Schwimmer resvala em diversos pontos de controvérsia, mas sua narrativa acaba sendo vítima de signos palatáveis. Tivesse o arrojo de abordar com menos pudor o embate entre as frustrações do pai e a natural inconsistência da personalidade adolescente ainda em formação da filha, e o diretor poderia ter realizado algo maior, preso de menos na obrigação de passar mensagens de alerta, e mais aberto às pessoas. Schwimmer é exatamente como Will: obcecado pelo tema, pelo que ocorre, e descuidado em demasia com os personagens que por ele são duramente afetados.


Publicado originalmente no Papo de Cinema. 

sábado, 5 de novembro de 2011

A Árvore da Vida que evolui


Difícil descrever a montanha-russa de sensações experimentadas durante a sessão de A Árvore da Vida. Envolto na aura de mistério e expectativa inerentes aos trabalhos bissextos do cineasta Terence Malick , o filme, vencedor da Palma de Ouro no último Festival de Cannes, parece suscitar seguidores e inimigos com a mesma intensidade. Pretensioso, auto-importante, genial e genioso, são alguns dos adjetivos que grudam na percepção de quem o vê, é claro, dependendo de como ele bate. Minha relação com A Árvore da Vida foi bastante atípica. Deu-se, inicialmente, num misto de espanto e deslumbramento, caiu vez ou outra num marasmo, voltou ao campo do deslumbre e ainda continua seu processo de expansão. O filme ficou, e isto já é sinal que de banal ele não tem nada.

Terence Malick certamente é ambicioso e pretensioso. Mas quem disse que estas são duas características negativas, desde que se justifique a ambição e se alcance a pretensão? Recorrer a uma narrativa grandiloqüente para apequenar o homem diante dos mistérios do universo, certamente não é expediente inovador, mas há muito não se via no cinema uma reflexão tão aberta neste nível. Alguns vêem na história (e na tragédia) familiar americana dos anos 50, e sua relação de significados com o Big Bang, originário da vida, uma meditação acerca da existência de Deus, de alguém que vela meio displicentemente seus filhos, que manda moscas para feridas, quando poderia curá-las. Outros entendem o filme como depositário das intenções de um artista louco para descobrir este Deus. Alguns, ainda, diriam que A Árvore da Vida se presta a um acúmulo de clichês que funcionam como elo entre religião e filosofia barata.

Ao discutir quase tudo, Malick certamente buscou a transcendência. Contudo não me parece que sua intenção vá muito além de mostrar nossa pequenez ante ao todo que nos abriga, e imbuir de força divina os processos da natureza violenta e cruel que nos circunda. O Big Bang, a cachoeira com suas águas turbulentas, o dinossauro que se mostra dominante, pois evoluído, e o menino que, oprimido pela figura paterna, vê-se em certo momento tal qual o pai (“Sou tão ruim quanto você”, ele chega a dizer) demonstram o caminho agudo inerente à natureza, que só é bela e possuidora de tantas maravilhas quando vista por olhos inferiores como os nossos. Isto poderia ser uma metáfora para um Deus que, igualmente, só é magnânimo quando comparado às criaturas menores que somos? Claro que pode, repito, depende do ponto de vista.

A meu ver, A Árvore da Vida é um acontecimento cinematográfico difícil de ser amplamente controlado pelo espectador. Ao relacionar o núcleo familiar, que se presta, com uma variação e outra, a qualquer família constituída, com os processos que levaram à evolução das espécies, Malick pode ter errado a mão em algumas partes, esticando demais certos planos, se perdendo, vez ou outra, na grandiosidade metafísica que gostaria de exprimir por meio de seu cinema. Certamente que pode, e até acredito que A Árvore da Vida não seja livre de algumas arestas, de reparações, pois perder-se na imensidão do cosmos, e na intenção de retratá-lo em sua complexidade, é humano, demasiadamente humano.

Não me furtaria o direito, porém, de taxar este novo filme de Terence Malick como grande. O cuidado com a imagem - que passa ao largo da mesmice a que somos submetidos cotidianamente, o trato de personagens tão interligados e, por que não, alegóricos, e a abertura às múltiplas interpretações e entendimentos, tudo respira pelos poros do talento recluso de Malick. No que alguns veem lampejos de documentário do Discovery Chanel, percebo uma construção bastante importante para que se entenda o itinerário do filme. O que muitos teimam em pintar como narrativa truncada, me parece um claro e impressionante fluxo, composto por elipses que reforçam os pequenos fragmentos e que transformam as diminutas coisas e gestos em microeventos interligados.

A Árvore da Vida é uma ampla experiência sensorial que, sem dúvida, clama por outras incursões, para que nelas se possa desvendar outras possibilidades. É uma viagem, a meu ver não no sentido pejorativo, como se fosse obra de alguém sob efeito de qualquer substância (como já andei lendo por aí), mas sim por carregar o espectador a outros lugares, por embeber os sentidos com imagens e sons impressionantes, por instigar o pensamento distante das convenções. Um grande filme que se desdobra, permanece e, o que é mais impressionante, evolui. 

sábado, 29 de outubro de 2011

Um planeta chamado Melancolia


As primeiras imagens de Melancolia já dão amostra considerável do que virá ao longo de suas mais de duas horas. Em câmera lenta (assim como tinha feito na belíssima sequência inicial de Anticristo), o mundo se esfacela: pássaros caem mortos, cavalos tombam e humanos experimentam sensações que variam da serenidade ao desespero ante o fim do mundo. Nada em larga escala, tudo num espectro mais íntimo, como que interiorizando a catástrofe anunciada pela chegada do Planeta Melancolia, que se esconde atrás do sol e ameaça chocar-se com a Terra. Ameaça não, choca-se, e isso é presenciado logo de cara, numa cena igualmente bela. Portanto, há a certeza de que a catástrofe acontecerá, e de que nada daquilo a seguir, exposto em flashback, faz muito sentido nesta perspectiva. 

Lars Von Trier divide Melancolia em dois capítulos, um para cada irmã. Justine, a moleca que se casa com um homem bem apessoado, que parece amar-lhe muito, e Claire, a mais apegada ao centro que, juntamente com o marido rico, proporciona a festa dos sonhos à irmã. Após o cataclismo, caímos então num típico festejo de casamento burguês. Neste momento, é inevitável o link com Festa de Família, de Thomas Vinterberg, apadrinhado pelo dinamarquês e um dos detonadores do Dogma 95. Da mesma maneira, na festa de Melancolia temos a câmera trôpega, muitas vezes colada aos personagens, e um movimento dramatúrgico que evidencia o que está sob a superfície da celebração. A diferença é que, enquanto no Dogma 95 se pregava a liberdade, o desapego à beleza do quadro (mesmo que esta intenção seja questionável), em Melancolia claramente este itinerário imagético é parte de um todo pictórico bastante trabalhado, pensado. 

Entre celeumas familiares e estados mentais dissonantes do que se esperaria de alguém que acabou de contrair matrimônio, Justine vê-se melancólica, como que a antecipar internamente o fim do mundo. Nada daquilo faz mais sentido, as aparências não mais protegerão e nem servirão de muito quando o astro Melancolia chocar-se com a Terra. Na passagem para os segundo capítulo, o de Claire, vemos a mulher que busca a todo custo auxiliar a irmã depressiva e sem forças, sucumbir lentamente ao desespero que se aproxima pela extinção da raça humana. Neste momento Justine desperta com sua inexplicável serenidade à beira do abismo, como se, na iminência do fim, aos sábios fosse destinada esta compreensão metafísica do desastre necessário. Estamos sozinhos, diz Justine, refutando qualquer apego a Deus nesta jornada muito particular, e na relação com a irmã, que passa de cuidadora a carente de cuidados. 

Melancolia é um filme pesado, denso, dos mais impressionantes da carreira de Lars Von Trier, justamente por oferecer uma junção de suas inquietações estéticas do passado, com este interesse mais recente pelos estados mentais extremos, apocalípticos, aliás, já bastante presentes em seu filme anterior, Anticristo. As pessoas são registradas com imagens claudicantes, a montagem de pequenos sobressaltos evidencia o jogo do cinema, ao passo que a natureza e o fenômeno aterrorizante que em breve a engolirá, são filmados com planos fluidos, reveladores da beleza do que nos acolhe e do que nos promete a destruição. Melancolia também herda de Anticristo esta reverência ao poder da mãe-terra. 

Conduzidos ainda por uma trilha sonora das mais expressivas, somos jogados no turbilhão de emoções vividas pelas duas irmãs que, num esforço de compreensão mais distante do realismo, podem ser vistas apenas como dois lados de uma mesma moeda. Melancolia extrai beleza da dor, se apoia nos personagens como quem busca salientar a agonia de um amigo, de um filho. O fim do mundo e suas implicações físicas são apenas detalhes quando percebemos a podridão humana como condutora mor da existência. Lars Von Trier não me parece pessimista, ou alguém com fetiche pelo sofrimento. Ele apenas utiliza sua lente de aumento, e o domínio impressionante que tem dos planos fabular e narrativo, para tornar evidentes nossas falhas morais e de caráter, aliadas aqui ao desespero que experimentamos em situações nas quais nos pegamos impotentes. Grande realização, Melancolia figura entre os melhores do ano.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O infinito particular de Miyazaki

O projeto Cinéfilus, coordenado pela professora Ivana Almeida na Universidade de Caxias do Sul, promove a partir de novembro um ciclo que encerra o programa "Sessão de Arte" em 2011, desta vez com os principais filmes do animador japonês Hayao Miyazaki. Além da excelente seleção, vale frisar que as sessões são gratuitas e ocorrem na ótima Sala Florense, no Bloco M da UCS. Confira abaixo a programação do ciclo "Grandes Diretores", que acontecerá todas as quintas-feiras de novembro a partir das 19h30min.

Dia 03/11 - O Castelo Animado (2004)
Dia 10/11 - A Princesa Mononoke (1997)
Dia 17/11 - Meu Vizinho Totoro (1988)
Dia 24/11 - A Viagem de Chihiro (2001)

Horário: 19h30min
Local: Sala Florense – Bloco M
Entrada franca

O The Tramps estará presente conferindo esta excelente iniciativa para deleite dos cinéfilos locais. Assista uma entrevista muito interessante com Hayao Miyazaki (legendas em inglês):

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Um Jesus Cristo Superstar


Adaptado do musical homônimo, Jesus Cristo Superstar provavelmente é uma das mais polêmicas transposições da paixão de Cristo para o cinema. Perto dele, o filme de Mel Gibson, por exemplo, é apenas uma vulgaridade que aposta na violência gráfica, só para o colocarmos em paralelo com uma das mais recentes versões desta milenar história. Homem ou Deus? Quem foi Jesus Cristo? Simplesmente um profeta que gozava de grande empatia, ou o próprio enviado dos céus para purificar nossos pecados com seu sangue? Dogmas religiosos e crenças à parte, não há como negar a força de Jesus como personagem, muito menos a dramaticidade da história que ele protagonizou. Versões que mexam, nem que seja um milímetro, no descrito pelas escrituras sagradas, ou que tomem certas liberdades, inevitavelmente gerarão polêmica.

Em Jesus Cristo Superstar, temos um Jesus peregrino, que canta seus derradeiros momentos. Aliás, todos cantam, o tempo todo. Para os que apreciam o gênero musical, é um deleite. Os cenários minimalistas, constituídos basicamente por andaimes, edificações em ruínas e pela paisagem desértica escolhida, conferem toque contemporâneo à história, efeito este amplificado pela direção de arte, que veste com malhas roxas e metralhadoras os soldados romanos, por exemplo. Imagino que o filme aos olhos dos mais puristas e religiosos seja uma verdadeira profanação.

Estas liberdades, a música, o bailado e a atmosfera meio hippie, são elementos que se deflagram rápido, e apresentam aqui o substrato da construção cinematográfica. Mas, o que mais me agrada em Jesus Cristo Superstar é a constituição das figuras, a humanização dos personagens que ficaram para a história, goste-se ou não, como testemunhas de algo longe do homem, pertencente à esfera do divino. Jesus aparece claudicante, desorientado ante os conselhos que recebe das pessoas, em contraposição à missão recebida por Deus.  Judas, a bem da verdade, o protagonista da trama nesta variante, é apresentado como homem que entrou para os anais, maculado por um pecado que foi obrigado a cometer, com as mãos manchadas pelo crime de Deus: o sacrifício de seu filho pelo bem da salvação humana.

Jesus Cristo Superstar é sim controverso, não se propõe ao revisionismo histórico, ou mesmo a apresentar fatos novos acerca desta que é uma das mais conhecidas e difundidas histórias da humanidade. O filme de Norman Jewison suscitou polêmicas, principalmente pela roupagem diferente e disposição em narrar através do rock progressivo e da dança típica dos palcos da Broadway. Afora os méritos da montagem como encenação, e eventuais controvérsias que esta versão moderna da vida de Cristo traz consigo, Jesus Cristo Superstar é exitoso justamente por trazer os medos, as angústias e hesitações destes personagens reconhecidos através dos séculos, mais para o plano terreno.


Publicado originalmente no Papo de Cinema

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Camiseta exclusiva The Tramps


Todo time tem um uniforme, certo? O The Tramps não poderia ser diferente.

Antecipando os festejos pelos 5 anos de blog (completos em dezembro próximo), solicitamos a Luis Otávio Fardo, comandante da Polvo Store, que confeccionasse a camiseta oficial do The Tramps. Ele, então, redesenhou a assinatura visual, especialmente para o bordado aplicado artesanalmente.

A estreia da “indumentária” se dará hoje, durante a exibição de A Liberdade é Azul, parte da Trilogia das Cores, cuja mostra segue até domingo (23) no Teatro Sesc (Rua Moreira César, 2462), sempre às 20h. A entrada é franca. Aguardamos todos por lá.

Obs.: E se você ficou interessado em comprar uma camiseta para você, entre em contato conosco.


quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: Terri


TERRI
Título original: Terri
De: Azazel Jacobs
Estados Unidos, 2011.

"Terri": cinema independente, indie da melhor qualidade, sim, por que não? Parece que de um tempo pra cá, não se pode fazer uma trilha legal, formar um elenco competente, compor cenas que comovam, que causam afeto, por que fatalmente cairá no melodrama ou na superficialidade. Em geral amam ou odeiam esse tipo de filme. Incrível esse "fenômeno". Parece que o toque do criador, deve ser sutil, sem muita exposição autoral, sem grandes marcações de gênero/estilo, porque se não "perde a graça", como escutei hoje.

Jonh C. Reily pode ser também o alvo dessa crítica que menciono acima. De fato, depois que o ator foi descoberto por seu potencial e passou a ganhar papéis principais, ele é escalado pra quase tudo e coincidentemente ou não, para viver personagens semelhantes, como por exemplo "Terri"e "Cyrus", além do tão falado "We Need to Talk About Kevin". No entanto, pra mim, nenhum desses argumentos tira o brilho de "Terri".

O filme conta a história de um menino fora dos padrões, órfão, obeso, com manias estranhas, que mora com um tio doente. Excluído pelos colegas e professores, Terri se isola e adota um comportamento maníaco, que gera estranhamento e o faz se sentir cada vez mais um peixe fora d’água. Até o dia em que conhece o vice-diretor da escola, figura temida pelos alunos, o sr.Fitzgerald (Jonh C. Reilly) que lhe amplia a visão de mundo e de ser, mostrando entre outras coisas que "de perto ninguém é normal". A atuação do garoto é espetacular. A ambientação, as situações que dão origem ao mal estar de Terri, o encontro dele com a menina bonita e popular da escola e com o colega também problemático, são impagáveis.

O filme se sustenta numa narrativa inteligente, sensível e providencial. Nada de excessos e nem de faltas, tudo na medida exata para apresentar uma realidade que está aí, na verdade que sempre esteve. Nada de novo, realmente. A questão já foi tematizada em outros filmes. Mas a grande sacada, a meu ver, é a forma como a história é contada, o foco no personagem principal que encarna um "loser", jovem, garoto estranho da sociedade americana com perfeição. E uma linguagem bem própria, proveniente das instituições de ensino e da nova geração. Gostei demais, foi bem mais que eu esperava. Quero rever.


Festival do Rio 2011: Culpada por Romance


CULPADA POR ROMANCE
Título Original: Koi no tsumi
De: Sion Sono
Japão, 2011

Nesta reta final do Festival, tenho me surpreendido com os filmes que tenho visto. "Culpada por Romance", por exemplo, é uma  pérola entre centenas de títulos selecionados, de países, gêneros e classificações diferentes. Difícil comentar sobre o filme aqui. Por vários motivos, mas, na minha opinião, mais pelo fato de não se tratar de pertencente a um gênero específico, por mesclar estilos e até apresentar uma nova roupagem de roteiro e direção.

Izumi é casada com um escritor famoso que se interessa por romances. Ela o admira, o idolatra e assume o papel de mulher subserviente sem olhar para os lados. Ele principalmente se mostra sistemático e exige o mesmo da mulher. Entediada com essa dinâmica monótona e repressora, Izumi decide trabalhar promovendo produtos alimentícios em mercados. Certa vez, uma mulher se aproxima dela e oferece uma chance numa agência de modelos. Ela topa, mas quando chega lá percebe que a demanda é de outra ordem, e que a "arte feminina" está mais para arte pornô. De qualquer modo, Izumi se sente atraída por aquele mundo, onde os homens parecem desejá-la e as mulheres admiram sua beleza, e não consegue sair, mesmo entrando em um conflito interno, onde se culpa por adultério, mas por outro lado vai se tornando mais independente, segura e desejada, inclusive por seu marido, que em outros tempos se mostrara frívolo e racional.

Nestas andanças, a moça conhece uma mulher, cuja identidade primeira revelada é de uma garota de programa, que por sua vez passa a ser sua mentora e a convence também de se prostituir. Concomitante ao drama, o filme traz uma trama policial muito interessante, no momento em que é encontrado no bairro do motel que Izumi frequenta, um cadáver. À partir daí, a investigação se mistura pouco a pouco com o problema existencial vivido por Izumi. Sion Sono injeta altas doses de erotismo, suspense, horror e poucas de humor, mas que se equilibram muito bem tornando o filme consistente e bem amarrado.

Trash, B, neo-noir, fantástico, thriller, todos estes gêneros poderiam ser associados à narrativa frenética e autoral (põe autoral nisso!) de "Culpada por Romance". Com mais de 140 minutos, o filme nos enreda pelo ritmo e encanta pelos diversos elementos simbólicos, que compõe um contexto abstrato, mas com base; Poético, reflexivo e atual.

O diretor, que também é o roteirista, transita nos universos que vão da filosofia à literatura e, por isso, cita em vários momentos Kafka, psicologia, onde ele explica o papel do feminino na cultura japonesa na década de 90 em diante. Com um desfecho abstrato, poético, nada objetivo "Culpada por Romance" mantém até o fim seu status de mistério, existencialismo e lirismo. Eu particularmente adorei!! Sobretudo pela singularidade do roteiro. Dica para quem for assistir: fique até o último minuto na cadeira, mesmo depois dos créditos...quem assistir, saberá do que estou falando.


quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: O Vigia Noturno


O VIGIA NOTURNO
Título Original: El Velador
De: Natalia Almada
Estados Unidos/ México/França, 2011.

No cemitério de Culiacam, no México, estão enterrados os principais chefes do tráfico local. Ali, todas as noites, Martin, o vigia noturno, observa o movimento, as pessoas que frequentam, passando por verdadeiros labirintos, feito mausoléus de luxo.

O filme retrata a difícil tarefa de um profissional dessa natureza e envolvido indiretamente com a violência, em ter que conviver diariamente com uma realidade dura e triste a sua volta, onde mulheres muito jovens visitam os túmulos de seus maridos assassinados.
Interessante o foco e a perspectiva reflexiva da diretora, quando se atém principalmente ao personagem central, o tornando o mote para toda contextualização acerca do cenário de violência no tráfico, vivido pelo país na última década.

Martin precisa seguir com sua vida apesar das circunstâncias e de um ambiente nada favorável. É nesse fluxo que o filme se desenvolve, apresentando os conflitos do personagem e explicando a realidade a sua volta. Linda fotografia. Quase um curta metragem, mas com todos os elementos de um longa, tal qual se apresenta. Boa surpresa da Première Latina!


sábado, 15 de outubro de 2011

CineSesc apresenta “Trilogia das Cores” em Caxias do Sul

A obra do cineasta polonês Krzysztof Kieslowski será apresentada a partir do dia 21

O Arte Sesc – Cultura por Toda Parte apresenta em outubro a Trilogia das Cores, do cineasta polonês Krzysztof Kieslowski, em Caxias do Sul, através do CineSesc. Baseada nas três cores da bandeira francesa e no lema da Revolução Francesa, as produções serão exibidas em três sessões: nos dias 21, 22 e 23, no Teatro Sesc (Rua Moreira César, 2462), sempre às 20h. A entrada é franca.

Após as exibições, o público confere um bate-papo com Conrado Heoli, Marcelo Müller e Rafa Müller, autores do blog de cinema, literatura e cultura “The Tramps”.


Os filmes:

França, início dos anos 90, às vésperas da Unificação Européia. Julie perde o marido, um famoso compositor, e a filha num trágico acidente de carro. Traumatizada, ela procura se libertar de tudo que lhe lembre o passado e, aos poucos, tenta reencontrar a vontade de viver.

O polonês Karol casa-se com a francesa Dominique e muda-se para Paris. O casamento não dá certo e Dominique pede o divórcio. Karol passa a viver como mendigo na capital francesa. Após muitos contratempos, ele volta para Varsóvia, onde consegue enriquecer. Ainda apaixonado, Karol trama uma inusitada vingança contra a ex-esposa.

Valentine é uma jovem modelo que vive em Genebra. Certo dia, atropela uma cachorrinha e, preocupada, sai em busca de seu dono. Assim, conhece o homem que mudará a sua vida: um juiz aposentado que passa os dias espionando as conversas telefônicas de seus vizinhos. É o início de uma história de redenção, compaixão e perda sobre a comunicação entre os homens.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: We Need to Talk About Kevin



WE NEED TO TALK ABOUT KEVIN
Título Original: "We Need to Talk About Kevin"
De: Lynne Ramsay Reino Unido, 2011.

Baseado no romance de Lionel Shriver, adaptado para o cinema, "We Need to Talk About Kevin", esteve entre os filmes mais aguardados deste festival. Até agora me pergunto o motivo do título não ter sido traduzido como os outros. Foi só uma observação, mera curiosidade. Com um elenco de peso, e de antemão um prestígio, mesmo antes do filme ficar pronto"..Kevin" como ficou sendo chamado, virou um best seller. Não li o livro e achei que soubesse grande parte do conteúdo, mas na hora, para minha surpresa, constatei que não. Mesmo levando em consideração que toda adaptação literária para o cinema sofre transformações, cortes e enxertos.

"We Need to Talk About Kevin" traz em seu núcleo, Eva, mulher vivida pela sensacional Tilda Swinton, que tem uma vida estável com seu marido Franklin (John. C. Reilly). Quando eles decidem ter um filho, a relação dos dois sofre sensível mudança, pois desde a gravidez Eva apresenta dificuldades em lidar com a maternagem. E Kevin (Ezra Miller) se mostra uma criança difícil, com características peculiares já bem pequeno. Aos 15 anos, ele comete um ato irreparável que abala a vida da família inteira. Eva então começa a avaliar sua vida, analisando sua parcela de culpa e tentando entender o que levou o filho a cometer tal ato.

Enquanto filme, "..Kevin" é redondo, cumpre todas as obrigações, com louvor. Linda fotografia, excelente montagem, atuações ótimas, em especial de Tilda Swinton, que não podia estar melhor e mais perfeita para o papel, e do ator Ezra Miller que interpreta Kevin. Espetacular as fases do garoto, desde bebê até adolescência. Além das caracterizações que resistem muito bem ao vai e volta da diretora. Trilha ótima e funcional, que quebra um pouco o peso absurdo de uma narrativa densa e amedrontadora, quase um thriller.

O problema é que o filme, tecnicamente falando, com todos os predicados e tendo cumprido muito bem as demandas, não dá conta de argumentos clichés que tentam explicar a grande tragédia. Fiquei com a impressão de uma necessidade por parte da autora, em justificar os fatos e na tentativa de entrar em questões como: há culpados para atitudes como esta? Caráter nato ou inato podem resultar nesse tipo de situação? O papel dos familiares, os tipos de influências que o sujeito pode ter ao longo da vida..etc etc. Achei que nessa, ela se perdeu e seus argumentos foram insuficientes e até fantasiosos, idealizados tornando o filme estereotipado. 

Muito barulho por nada? Não, mas por pouco. Para mim, faltou arte, sensibilidade e ficção!!! Não à toa, a sensação de que "..Kevin" tivesse sido baseado em fatos. Mas não, nem uma coisa, nem outra. Para um grande e alarmante acontecimento, um argumento fraco que não sustentou sua provocação inicial.


quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: O Garoto que Mente



O GAROTO QUE MENTE
Título Original: "El Chico que Miente"
De: Marité Ugas
Venezuela/Peru, 2011.

"O Garoto que Mente" inicia com um menino de 13 anos que decide abandonar sua casa, partindo para a costa venezuelana. Para sobreviver, ele sensibiliza as pessoas que encontra, contando histórias de um deslizamento de terra. Algumas vezes, ele diz que sua mãe se sacrificou para salvá-lo, em outras que foi seu pai quem morreu. No entanto essas histórias têm um fundo de verdade: há dez anos ocorrera um deslizamento em Vargas, deixando milhares de vítimas e desaparecidos, entre eles, sua mãe.

O ponto alto são as memórias do garoto que, além da bela fotografia, se apresentam em cenas muito mais bem construídas do que as que se passam no presente. Essas memórias são influenciadas pelo que seu pai contou e pelo efeito que o sumiço da mulher teve na vida dessa família. De algum modo, ele "ganha o mundo" para curar essas feridas e dar algum sentido à sua vida cheia de lacunas.

Não gostei muito do filme. Fiquei com a impressão de que por uma causa pessoal, a realizadora/roteirista, inclusive comovida pelos fatos históricos, deu início a um projeto idealizado demais, pouco real em termos de cinema. Para mim, "O Garoto que Mente" está mais para um documentário, que ainda assim seria capenga de elementos e narrativa.


quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: A Chave de Sarah


A CHAVE DE SARAH
Título Original: Elle S`appelait Sarah
De: Gilles Paquet-Brenner
França, 2011.

Selecionado para o Festival de Toronto e baseado no romance de Tatiana  De Rosnay, "A Chave de Sarah" conta a história de uma jornalista, Julia, vivida pela atriz Kristin Scott Thomas, que vive na França e é designada para cobrir as comemorações do sexagésimo aniversário do Vel dHiv, do qual ela não tem conhecimento algum. Ao trabalhar pesquisando o ocorrido, Julia descobre que o apartamento onde ela, o marido e a filha irão se mudar, havia sido ocupado por uma família judia, imigrante que fora desapossada pelo governo francês da época, e em seguida comprado pelos avós de seu marido. Julia decide então descobrir o que aconteceu aos ocupantes anteriores, mas principalmente que destino tomou a única sobrevivente desta família assolada pelos efeitos da Segunda Guerra.

Até agora "A Chave de Sarah" está entre os melhores filmes que assisti neste festival, talvez o melhor! Um filme muito emocionante e visceral, pelas atuações e dados de realidade que são apresentados com delicadeza, sutileza, mas sem perder o foco e o tema.

O roteiro é muito bem amarrado e nos deixa curiosos para saber qual será o próximo passo. Não se trata de um filme de suspense, nem tampouco policial. No entanto os pontos ligados à história (política e social) e à nossa história de vida (nosso subjetivismo), fazem com que o desenrolar se torne mais interessante a cada segundo. "A Chave de Sarah" retrata uma contundente imagem da França na época da ocupação nazista, revelando pouco a pouco os segredos de um período muito triste da história francesa. Imperdível! E ao que tudo indica, logo logo entra no circuito.


terça-feira, 11 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: A Pele que Habito


A PELE QUE HABITO
Título Original: La Piel que Habito
De: Pedro Almodóvar
Espanha, 2011.

Incrível a comoção que Almodóvar causa nas pessoas. Hoje, na sessão de 21h30, em plena segunda-feira, a fila do cinema dava voltas. Todos com expectativa estampada no rosto, e na fala dos que aguardavam ansiosos pelo início do filme. Incluo-me nesse grupo, claro.

Adaptado do livro Tarântula de Thierry Jonquet, assim como no original "A Pele que Habito" traz à tona uma crítica da obsessão pelas aparências. Antonio Banderas interpreta o cirurgião Robert, médico de renome obcecado por criar peles artificiais.Prefiro não comentar mais sobre a sinopse, porque qualquer coisa que eu diga, pode ser spoiler, como vi em outros comentários antes mesmo de assistir o filme.

Uma incógnita para mim esse "novo" rumo do cinema Almodovariano. Desde "Abraços Partidos" sinto que o diretor caminha para águas mais agitadas, onde a trama e o argumento ficam em segundo plano. Não sei avaliar e me arriscaria a dizer que essa característica não seja um demérito, mas apenas uma escolha de Almodóvar, quando privilegia a performance rasgada, uma narrativa hiperbólica de sentimentos ambíguos, emoções fortes sempre, mas que flutuam entre o trágico e dessa vez mais fortemente, o cômico. Não que um dia ele tenha abandonado esse estilo, mas neste é como se ele tivesse colocado uma lente de aumento em tudo. Devo admitir que sinto falta de porções com sabor de "Tudo Sobre Minha Mãe", "Carne Trêmula", "Fale com Ela" e outros. O tempo todo me vieram à cabeça seus trabalhos mais antigos: "O Que eu Fiz para Merecer Isso", "Pepi, Luci, Bom..", "Kika", etc.

É indiscutível o talento, o estilo performático e minucioso de seus filmes. Com uma estética de encher os olhos, desde o figurino impecável, até as locações lindíssimas. Desta vez o excesso de vermelho me incomodou (risos). Aliás, achei "over" a cor (mais uma vez), a predominância do vermelho, alguma forçada de barra para que o improvável se tornasse crível, os acréscimos de elementos bizarros num contexto que variava entre o drama e o absurdo. A trilha sonora, para variar, da melhor qualidade, maravilhosa, um luxo! A atriz principal (Elena Anaya) é indescritivelmente linda, com expressões fortes, um olhar inconfundível e mais ainda o que Almodóvar é capaz de tirar daquela mulher. O mesmo com Antonio Banderas, que na mão do diretor cresce horrores e quando a câmera foca nele, não tem para ninguém.

O cinema subversivo, autoral, competente, encantador de Almodóvar, vem ganhando novas formas, ou não, não sei. Mas lamento pelas tramas maravilhosas e pelos dramas que só ele sabe construir, ficarem "de lado", se tornando apenas pano de fundo para seu palco iluminado de performances, brilhos e "autorismo". De qualquer modo, penso que ele continua podendo tudo!


segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: O Americano


O AMERICANO
Título Original: Americano
De: Mathieu Demy
França, 2011.

Filho dos cineastas Agnès Varda e Jacques Demy, Mathieu Demy estreia como diretor neste longa, em que também atua no papel principal. Além de todos os predicados, o elenco de peso formado por: Geraldine Chaplin, Chiara Mastroianni, Salma Hayek e Carlos Bardem (irmão de Javier Bardem) tornam "O Americano" ainda mais potente e interessante.

O filme se inicia em Paris, onde Martin (M. Demy) mora com sua namorada Claire (C. Mastroianni) e estão passando por uma crise na relação, quando ele recebe a notícia de que sua mãe havia morrido. Abalado, Martin parte para Los Angeles, onde viveu parte de sua infância, para cuidar de questões da herança. Chegando lá, ele se desfaz de pertences e quinquilharias e se depara com uma foto que o faz lembrar de Lola, menina mexicana de quem sua mãe gostava muito. Na falta de informações a respeito de sua mãe e também de explicações que o convencesse dos fatos, Martin vai à Tijuana atrás de Lola, na esperança de obter verdades acerca de seu próprio passado. Martin terá que lidar com as lembranças de sua infância para conseguir aceitar a morte de sua mãe.

Incrivelmente bem ambientado e dirigido, "O Americano" nos leva a uma viagem literal passando de uma Los Angeles frívola e asséptica à Tijuana mundana e perigosa. O personagem vivido por M. Demy nos passa um desamparo genuíno e fixação num passado desconhecido e nunca concretizado em suas memórias. Destaque para Salma Hayek que, além da beleza e exuberância, nos faz crer que quando bem dirigida, e promete maravilhas. O mesmo para Carlos Bardem que está excelente. Caprichado, este longa do mais novo diretor Mathieu Demy! O final é lindo e só confirma a eficácia do filme.


domingo, 9 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: Um Método Perigoso



UM MÉTODO PERIGOSO
Título Original: A Dangerous Method
De: David Cronenberg
Alemanha/Reino Unido/Suíça, 2011.

Esta sessão foi a (minha) "estreia" no Festival do Rio, parece que o evento só começou agora, e em grande estilo. Por ter sido no Odeon e em cima, graças a amiga Bianca que insistiu nessa grande ideia, pois ver Cronenberg de cima é tudo de bom. Sem contar que assistir a filmes na companhia de pessoas queridas, que se interessam por cinema, e depois ainda topam falar sobre, trocar ideias é muito bom. Uma fila enorme surgia no Odeon antes das 19h e com ela a expectativa do filme que estava por vir.

"Um Método Perigoso" se passa em Viena, às vésperas da 1ª Guerra Mundial e se baseia na gênese da psicanálise para desenvolver a trama principal. Carl Jung (interpretado brilhantemente por, ninguém mais ninguém menos, que Michael Fassbender) atende seus pacientes à partir dos ensinamentos de seu mentor, o psicanalista Sigmund Freud, vivido por Viggo Mortensen (que também é um show à parte). Ambos conhecem a jovem Sabina Spielrein (Keira Knightley), doente e perturbada pelo passado, e logo ficam atraídos, cada um a seu modo por ela. Com o tratamento que se inicia, Jung se aproxima de Sabina e tem um caso com a moça. O terapeuta começa a se questionar sobre os efeitos e as consequências desse caso e também se vê perturbado pelas falas de seu mestre Freud. Os dois passam a discordar e a rumar para caminhos diferentes, chegando a romper a amizade e a cumplicidade de ideais.

David Cronenberg nunca deixou de ser lembrado por suas bizarrices, seus absurdos, mas, sobretudo pelo seu talento em dirigir ótimos filmes e roteirizar muitos destes. Lembrando rapidamente: "Crash, Estranhos Prazeres", "Gêmeos, Mórbida Semelhança", "EXistenZ", "Senhores do Crime". Mais uma vez fico encantada, mas agora principalmente por constatar sua versatilidade e capacidade de se adequar a um contexto completamente diferente do que de costume. "Um Método Perigoso" que tem o roteiro assinado pelo dramaturgo Christopher Hampton, com base numa peça de sua autoria chamada "The Talking Cure", que por sua vez teve elementos autobiográficos do livro "A Most Dangerous Method" de John Kerr, teve a sorte de ser dirigido por David Cronenberg e por sua fidelidade a proposta que com certeza, foi alvo de seu interesse. Sutileza e delicadeza não são definitivamente a marca registrada de Cronenberg. O diretor canadense quase sempre escolhe o pathos, o caos físico e mental e os limites destes para criar seu cinema absolutamente autoral e libertário, onde o corpo é laboratório de suas experimentações cinematográficas.

Neste seu novo filme, diferente dos demais, Cronenberg adapta com competência e nos transmite de forma fidedigna a atmosfera Vienense da época, o "duelo" (com classe e consistência) de dois Titãs, que no fundo se complementavam, ao menos até certa época. E é capaz de transformar Viggo Mortensen num senhor, com um andar próprio, um olhar firme, gestos característicos do pai da psicanálise. Inclusive essa "parceria"  de Cronenberg e Viggo M. deu muito certo. O mesmo ocorre com Jung, muito bem representado pelo fantástico Michael Fassbender. Cronenberg, além de todos os predicados já mencionados, é fera na arte de dirigir atores e captar cada expressão, cada movimento, extrair dos mesmos o seu melhor. Não posso esquecer de citar Vincent Cassel que vive Otto Gross, paciente de Jung. Interpreta muito bem também. Preciso admitir que tenho certa implicância com a atriz Keira Knightley e me perguntei várias vezes porque ela foi escalada para interpretar alguém de tanto destaque, mas nada é perfeito (risos). No entanto, ela está bem, cumpre o seu papel, não faz feio não. Em alguns momentos achei ela excessiva, cliché, mas precisava, talvez não tivesse outra forma de retratar a histeria da época. Detalhe para a ambientação: absolutamente perfeita. Um verdadeiro colírio aquela fotografia e locações.

Sou suspeita em todos os sentidos para comentar aqui , sobre "Um Método Perigoso", pois o contexto favoreceu: direção, o cinema e a companhia, além da temática. Mas posso assegurar de que valeu muito à pena, e que um prêmio como Oscar, por exemplo, caberia aos dois atores tranquilamente. Que venha mais Cronenberg por aí!


sábado, 8 de outubro de 2011

Festival do Rio 2011: Contágio


CONTÁGIO
Título Original: Contagion
De: Steven Soderbergh
EUA/ Emirados Árabes Unidos, 2011.

Uma epidemia provocada por um vírus letal que se espalha rapidamente pelo mundo marca o início da "maratona" de Soderbergh. Beth (G.Paltrow) volta aos EUA depois de uma viagem para Hong Kong e se sente muito mal. Ela acredita que está cansada apenas, mas na verdade não sabe que foi contaminada pelo vírus letal. Após sua morte, várias outras se sucedem, dando início a uma verdadeira epidemia global.

Pelo que percebi, "Contágio" pegou os cinéfilos pelo pé e encabeçou as bilheterias nos EUA. Fico pensando que, de fato, com um elenco desses e com S. Soderbergh ("O Informante","Che","Traffic", "Sexo, Mentiras e Videotape") à frente, fica difícil resistir a tentação, ao menos para os apaixonados pela 7ª arte. O que não entendo é a forçada de barra para tornar "Contágio" algo quase cult, e não assumir o cinemão-pipoca que é. Nada contra, muito pelo contrário, adoro filmes chamados pipoca, mas confunde e embola o meio de campo quando se faz um filme com todos os recursos, com um elenco de primeira e não se aproveita nem metade do que se tem. Uma lástima! Em momento algum Soderbergh aprofunda os diálogos, as relações, e investe maciçamente naquele ritmo típico de alguns filmes seus e na temática: epidemia (explicações biológicas, científicas e médicas). O problema é que este ritmo quase cadenciado acaba cansando por se repetir o tempo todo, fazendo com que não haja diferença entre a cena muitíssimo bem dirigida dos atores em destaque e a cena não tão importante. Pode parecer paradoxal falar, mas "Contágio" é impecável. Tudo em cima, tudo ok: direção, atores, fotografia, trilha (ótima), roteiro, mas, inacreditavelmente, o ritmo impresso em "Contágio" tira bocejos da plateia.


Festival do Rio 2011: A Valsa das Flores


A VALSA DAS FLORES 
Título Original: Ryabinoviy vals 
De: Alyona Semenova e Aleksandr Smirnov 
Rússia, 2010. 

Inspirado em fatos, "A Valsa das Flores" se passa na Rússia depois da 2ª Guerra Mundial e narra a passagem de muitas jovens de 16 e 18 anos que eram enviadas aos campos minados no norte do país, para limpar a área deixada pelos nazistas. Duas jovens protagonizam essa história triste, real com muita propriedade. São elas: Marusya que é uma artista promissora, ligada à música e Polina que é uma jovem viúva aprendendo a lidar com a falta do marido. 

Em meio a um cotidiano árduo, arriscado e sem muita esperança, essas duas jovens e o tenente de quem elas recebem ordens dão um show de atuação e passam muita emoção em vários momentos. O que mais comove, além da narrativa que nos faz lembrar o tempo todo que o roteiro foi baseado em fatos, é a falta de expectativa destas jovens que passam uma vida a "desarmar bombas" e precisam "bailar ao som da valsa das flores" para sobreviverem. Provavelmente, é um filme que vai demorar a chegar até ao nosso circuito. Ótima surpresa.