No recente Festival de Cinema de
Gramado, dois filmes da Mostra Panorâmica foram destaque entre os nacionais: Mãe
e Filha, do cineasta Petrus Cariry, vencedor do último Cine Ceará, e Transeunte,
igualmente elogiado nos festivais pelos quais passou, dirigido por Eryk Rocha.
Curiosidade: os diretores são filhos de grandes cineastas de outrora,
respectivamente Rosemberg Cariry e Glauber Rocha.
Resgato aqui os pequenos textos que
produzi in loco na ocasião.
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Mãe e Filha de Petrus Cariry foi
o grande filme exibido em Gramado este ano, infelizmente impossibilitado de
competir por já ter faturado o Cine Ceará. Tempo e morte no retorno da filha
pródiga que traz nos braços seu bebê desfalecido, para que a mãe, esquecida no
meio do nada, o abençoe e o sepulte. A senhora então celebra o neto morto, a
quem banha e promete a cidade fantasma em que vive. Velhos remorsos e lacunas
afetivas surgem nas entrelinhas.
As edificações e ruínas do
lugarejo são também personagens, pois evocam a decrepitude e o que ainda teima
sobreviver. Vida e finitude são velados pelos quatro cavaleiros do apocalipse,
estes seres bíblicos que se agregam à narrativa, que a permeiam assim como a
presença selvagem dos animais. Na condução, o tempo é tornado abstrato por
Petrus, que o manipula exemplarmente, aliás, como há muito não se via em nossa
cinematografia. Mãe e Filha é uma grande realização, daquelas que ficam conosco
por um bom tempo, se desdobrando, ecoando.
Primeiro filme de ficção de Eryk
Rocha, Transeunte presta-se à observação do cotidiano de Expedito, aposentado que
vive sozinho após a morte da mãe, com quem sempre morou. Caso se creia
que talento é transmitido pela carga genética, e levando em consideração que
Eryk é filho do saudoso Gláuber Rocha, não haverá qualquer surpresa quanto às
qualidades latentes de Transeunte, uma obra virtuosa.
O filme possui vocação
silenciosa, mas, paradoxalmente, é guiado em boa parte pela música e pelos sons
do cotidiano. Expedito vaga pelas ruas fluminenses orientado pela sensação
vazia da existência burocrática e protocolar, fotografado num preto e branco de
imagem bastante granulada e com enquadramentos fechados, quando não hiper
fechados. Transeunte é formalmente rigoroso, exige do espectador na mesma
medida que o recompensa, claro, desde que este se disponha a contemplar, a
vestir-se tal e qual Expedito em sua descoberta lenta e gradual do ciclo da dor,
e dos raios solares que aos poucos o abrandam. Grande filme.
Olá, Celo!
ResponderExcluirIsso mesmo, resgate seus textos escritos na época dos Festival de Cinema de Gramado. Sempre oportunos.
Abraçosssss