Hank (Billy Bob Thornton) é homem
solitário e petrificado por trajeto provavelmente feito de muitas expectativas
dentro de criação para lá de conservadora. Assistente penitenciário
especializado em preparar condenados à morte, ele tenta legar ao filho a força
que seu próprio pai sempre dele cobrou, afinal de contas, homens não podem
chorar, fraquejar, vacilar, isso nas leis do pré-histórico tempo no qual até o
racismo era visto como algo normal. Interessante como numa das primeiras cenas,
mesmo sem concordar com o ideário segregador do pai, Hank dá pequeno espetáculo
assustando crianças negras, de arma em punho. O patriarca vê tudo da janela,
orgulhoso do rebento à sua aparente imagem e semelhança.
O episódio no qual Sonny (HeathLedger),
filho de Hank, titubeia levando certo homem à cadeira elétrica provoca
torvelinho de sentimentos que explode em briga e acaba em morte, mais
precisamente suicídio. Cena brutal, seca e bem coerente com o registro adotado por
Marc Forster em A Última Ceia. Aliás,
a aridez utilizada para delinear personagens e suas motivações de certa forma amplifica
uma sensação de abandono primal, como se realmente estivéssemos sós no mundo. E
isso é reforçado quando esquadrinhamos Letícia, papel de Halle Berry (ela
venceu o Oscar com esse trabalho), massacrada constantemente por tragédias, primeiro
a do marido eletrocutado, depois a do filho atropelado.
Findos os episódios cruéis,
restará a Hank e Letícia juntar forças para o recomeço. E essa nova chance é
originada na mais bela cena do filme, quando a mulher pedirá com desespero que
o homem lhe conceda alguns momentos de prazer, resultando num sexo excitante,
libertador e catártico. Forster conduz a sequência com muita inteligência,
fazendo uso de cortes secos, alternando planos abertos/médios e usando montagem
truncada para justamente impactar com o simbolismo do ato que levará os
participantes ao gozo. Ali, encerrados no corpo do outro, ele desperta da
inércia e ela encontra conforto.
Nada é futilmente belo em A Última Ceia. O filme dispõe-se a
mostrar lados obscuros aflorados para depois, bem à moda da boa arte, apontar
caminhos possíveis sem aferrar-se aos mesmos como tábua de salvação ou
idealizá-los para além da necessidade. Os sujeitos podem até buscar redenção
(afinal são humanos), mas parecem resignados frente à impossibilidade de
encontrar emplastro definitivo a feridas que nunca cicatrizarão, quando muito
irão doer um pouco menos. Marc Forster
conta, além do próprio talento, com dois atores em estado de graça, Billy Bob
Thornton e Halle Berry, cujos tipos são representantes de Américas
aparentemente distintas, mas logo cientes do que os aproxima enquanto gente.
Publicado originalmente no Papo de Cinema
Boa, Celito!
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