sexta-feira, 25 de março de 2011

Dennis Villeneuve fala sobre "Incêndios"

Breve entrevista realizada por Jason Anderson (Eye Weekly), em 20 de janeiro de 2011.
Tradução de Conrado Heoli, para o The Tramps.

Com cinco anos de produção, Incêndios reúne um dos mais laureados cineastas canadenses com aquela que talvez seja a peça mais reverenciada recentemente. Primeiramente montado em 2005, Incêndios, de Wajdi Mouawad, apresenta a história de dois irmãos que buscam a verdade sobre o passado de sua mãe no Líbano, assim como a identidade de seu pai. Íntimo e mítico em suas reviravoltas, o tom da peça não era fácil de ser replicado no cinema. Ainda assim, Denis Villeneuve – que venceu com seus dois últimos filmes, Maelstrom (2000) e Polytechnique (2009), os prêmios de Melhor Filme no festival canadense Genie, dentre outras láureas – encontra uma poderosa (e amplamente silenciosa) leitura visual para o texto de Mouawad. O diretor de 43 anos falou com a Eye Weekly quando Incêndios teve sua première no TIFF (festival de cinema canadense).

Eye Weekly:
O que foi tão excitante no desafio de adaptar Incêndios após a primeira vez que você viu a peça de Wajdi Mouawad?

Denis Villeneuve: Eu estava totalmente impressionado por sua habilidade em lidar com a intimidade, a política e a mitologia ao mesmo tempo. Foi por isso que instantaneamente eu me apaixonei pela peça. Eu não estava vendo e pensando “talvez eu transforme isto em um filme”. Depois de Marlstrom, eu parei de fazer filmes por um tempo. Eu disse a mim mesmo, “algo me atingirá”. Eu não queria fazer filmes apenas pelo objetivo de fazer filmes – eu amo muito o cinema para fazer isso. A relação de amor deve ser mais intensa. E eu investi cinco anos acordando todas as manhãs e pensando em Incêndios – era puramente uma droga para mim. Agora é como se eu tivesse usado metadona, pois eu preciso encontrar algo que me fará tão feliz quanto Incêndios.

Eye Weekly: Por que você acha que foram necessários assuntos tão fortes quanto aqueles de Polytechnique (o filme de Villeneuve é sobre o massacre de estudantes mulheres na Universidade de Montreal, em 1989) e de Incêndios para fazer com que você filmasse novamente?

Denis Villeneuve: Polytechnique e Incêndios foram os primeiros projetos que enquanto eu fazia acreditava profundamente que estava fazendo a coisa certa e sem outras escolhas. De certa forma, você não escolhe um projeto – é o projeto que escolhe você. E foi muito estranho sentir aquele misto de serenidade e força. Eu não acho que conseguiria fazer cinema sem me sentir assim. A diferença foi que, com Polytechnique, eu estava correndo para terminar, pois tudo era muito doloroso e eu não conseguiria viver mais com aquilo. Mas eu fiquei muito triste por terminar Incêndios.

Eye Weekly: Outra elogiosa particularidade e qualidade de Incêndios é o quão quieto e sem palavras ele é – o que é especialmente fora do comum para a adaptação de uma peça.

Denis Villeneuve: Minha meta era fazer um filme silencioso, mas é muito caro! Para fazer isso, eu precisei do presente da total liberdade e Wajdi me deu a carta branca. Ele ainda me deu algumas dicas – me apresentou algumas fotografias, alguns filmes e poemas. Mas ele também disse, quando me deu os direitos, “você é totalmente livre, pode fazer o que quiser. Você está sozinho nisso, você irá sofrer... Então tchau!” (risos). Este foi o presente artístico mais belo que eu jamais recebi e, por isso, serei eternamente amigo dele.



Em tempo: Incêndios será exibido na Sala de Cinema Ulysses Geremia na próxima quinta-feira, dia 31, como parte da programação do 7º Festival de Verão do RS de Cinema Internacional. Confira a programação completa no blog da sala.

3 comentários:

  1. Mais uma ótima tradução Kon, parabéns.

    Estou muito, mas muito curioso para assistir "Incêndios". Do Villeneuve só assisti "Polytechnique", que mesmo me incomodando em algumas partes,certamente mostra um olhar diferenciado, responsável, por exemplo, por uma rica concepção visual em prol de um desenvolvimento dramático consistente. Estarei lá na quinta-feira para conferir, certamente.

    Abraços

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  2. Olá, Kon!
    Parabéns à Sala. Infelizmente, não conseguirei comparecer, mas pretendo assistir a esta obra, alvo de grandes elogios.

    Abraçossss

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  3. Muito legal ter conferido aqui a entrevista, logo após de ter visto o filme.
    "Incêndios" me deixou mal hoje à tarde, consternada, impactada mas encantada com a grandiosidade e perfeição de um roteiro complexo,cheio de nuances e detalhes, com flashbacks anacrônicos e efeitos que só intensificam o valor de cada cena, quase todas muito fortes.
    Me senti como em "solidão dos números primos": não há saída para algumas pessoas em alguns lugares! Imaginar isso pra mim é mto angustiante porque se aproxima de uma realidade, fato.
    Em "incêndios" ainda há o fator cultural e político que interferem radicalmente, fazendo do drama da personagem principal um fardo ainda maior.
    O argumento do filme é maravilhoso,inesperado e muito inteligente. A atriz se supera a cada etapa do filme!
    Antes deste, eu tinha em mente que o filme mais sufocante, com a personagem mais sem esperança da face da terra, fosse "Lylia4ever", depois de "Incêndios" substituí essa categoria rs.
    Vale muito à pena, mais ainda se pensarmos num experimento, porque não dá pra "entrar na tela". Não à toa vê-se muita gente saindo da sala durante a sessão..a coisa é punk.
    beijos

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