quarta-feira, 20 de julho de 2011

Contra o Tempo e a velha dicotomia: arte vs comércio


Em Contra o Tempo, segundo longa metragem do diretor Duncan Jones, cuja estreia se deu com a ótima ficção espacial Lunar, há mais profundidade do que possamos imaginar num primeiro momento. Na trama, o capitão Colter Stevens se percebe parte de um procedimento vanguardista da divisão estratégica do exército americano, que transporta a consciência de homens treinados para uma espécie de realidade artificial, criada com base nos últimos oito minutos da memória de alguém que faleceu. Sua missão é encontrar o responsável pelo atentado a um trem, que explode no centro de Chicago, e evitar que, impune, desencadeie outros eventos catastróficos. Para isto, o capitão Stevens precisará reviver diversas vezes os citados oito minutos na pele de um professor, e interagir com outros passageiros a fim de montar o quebra-cabeça que pretensamente o levará ao responsável pela detonação.

Duncan Jones, além de provar que o êxito em seu debut não foi mera “sorte de principiante”, encarou desafio extra ao trabalhar pela primeira vez dentro do esquema industrial, sob a égide de um estúdio. Dá para dizer que se saiu muito bem em ambas as tarefas, pois, ao passo que criou um filme (des)complicado, com bom potencial de sucesso junto ao grande público, deu mais mostras de sua solidez como realizador. Contra o Tempo apresenta-se, de início, como um triller em que acompanhamos, com certa dose de tensão e curiosidade, as constantes viagens de Stevens (interpretado com muita segurança por Jake Gyllenhaal). Porém, o filme ganha em significância e profundidade, deixando ação e eletricidade narrativa em segundo plano, à medida que estas incursões passam a ser entremeadas pelo desejo do protagonista de saber mais sobre sua condição e atual missão.

O roteiro de Ben Ripley é sagaz na abordagem de temas espinhosos, e geralmente complicadores, como: viagens no tempo, física quântica, realidades paralelas e o continuum espaço-tempo. A Duncan Jones, que começa a desenhar itinerário estilístico e temático, pois, assim como em Lunar, trabalha com questões identitárias, de migração e reprodução da consciência, cabe criar momentos que segurem a plateia através do desenvolvimento esperto de uma trama que, em mãos menos engenhosas, estaria fadada ao mero contemplar da repetição. Jones também demonstra tato ao preencher a narrativa com discussões mais, digamos, profundas, como a beligerante postura americana e a maneira com que o indivíduo é descartado em função da máquina patriótica do Tio Sam. 

O único senão de Contra o Tempo é seu final um tanto quanto “açucarado”, que complica mais do que ajuda. Tivesse encerrado na cena em que o mundo parece estático em fragmento de aparente felicidade, e Contra o Tempo seria ainda mais forte e enigmático. Ao buscar a luz, o filme eclipsa um pouco seus subtextos, num encerramento mais afinado com as lógicas de mercado, do que propriamente com a visão artística de um diretor que já fez dois ótimos, mas que, daqui para frente, tem tudo para fazer grandes filmes.

2 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Não assisti os filmes deste jovem realizador, porém confio em seus comentários embebecidos de elogios racionais. Conversávamos ontem, ou ao menos há poucos dias de hoje, que o mais difíil para um cineasta é conciliar arte e comércio e não pender demais para um ou outro, herdando ao menos favorecido dos lados o vazio e a insignificância.

    Abraçosssss

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  2. Olá, Celo!
    Como admirador de Lunar e mais um entusiasta pelo cinema do Duncan Jones, esperei mais de Contra o Tempo. Acredito que ele fez o possível com o material que tinha em mãos, assim como com a limitação de uma obra que, antes de qualquer coisa, parece servir como veículo para seu ator protagonista. No entanto, vejo muitas falhas na narrativa do filme, e concordo contigo quanto ao final redentor, desnecessário. Ainda assim, espero (boas) novidades deste diretor, que promete.

    Abraços!!

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