Zumbis são mortos-vivos que agem apenas
por instinto, pois privados de racionalidade. Sua base metafórica serve com
frequência ao cinema para exemplificar questões político-sociais. Sendo assim, a Cuba socialista, mesmo 50 anos
após o levante que erigiu Fidel Castro e companhia ao poder, é o cenário ideal
(ao mesmo tempo improvável) para as tais criaturas, exatamente como alusão a
sistemas de governo, comportamentos coletivos e traços de quem vive sob a égide
de um regime contrário ao capitalismo dominante. Coube ao diretor Alejandro
Bruqués realizar o primeiro filme de zumbis ambientado e produzido na Ilha,
nele fazendo graça sobre o embargo, a ideia fixa do êxodo, peculiaridades do
próprio povo cubano, entre outros.
Estamos no inconfundível terreno
do Filme B, por mais que a tecnologia digital tenha amenizado as tosqueiras que
o caracterizavam (e davam charme) noutros tempos. Juan dos Mortos se insere na tradição do gênero terrir, mescla de terror e comédia. Seu
protagonista é Juan, um típico (e tipificado) terceiro-mundista que vive de
pequenos trambiques e atividades esparsas.
Tudo corre bem em Havana até que pessoas começam a se comportar de
maneira estranha, comendo carne humana e vagando sem rumo. O que seriam eles?
Dissidentes contratados pelo império americano, segundo noticiam os meios de
comunicação locais. A epidemia cresce, pessoas morrem aos montes, e o que Juan
e seu amigo Lázaro resolvem fazer? Ganhar dinheiro abrindo um serviço chamado “Juan dos Mortos – Matamos seus entes
queridos”.
Tudo é visto pela ótica de Juan e
de seus companheiros, incluindo aí o já mencionado amigo, o jovem que mimetiza arquétipo
norte-americano, o travesti histriônico, o homenzarrão que não suporta ver
sangue e a filha desgarrada, com quem o protagonista quer reatar laços em meio
ao caos. Não há qualquer ranço no desenrolar de Juan dos Mortos, filme feito para rir da própria desgraça, por
assim dizer. A direção se preocupa basicamente em ampliar o efeito cômico das
sequências, deixando às entrelinhas do roteiro algo sobre a dimensão social de
um país sob o efeito de sua história revolucionária. O diretor não poupa
compatriotas, cujos estereótipos – sobretudo comportamentais – fundamentam os
personagens.
Entre mortos e feridos (tsc), Juan dos Mortos busca um público mais
bem-humorado que aquele aferrado à verossimilhança ou ao patriotismo radical. Não
deveria ser tachado de “alienado”, mas também não convém buscar nele mais
profundidade que as próprias ações e palavras explicitam. São raros os
subtextos, pois tudo vem à tona (verbal e visualmente) numa galhofa banhada
pelo sangue dos “dissidentes” e de alguns “inocentes”. Gostar ou não vai muito
do “espírito” de cada um. A meu ver, Juan
dos Mortos é uma bobagem divertida, turbinada com a consciência política dos
que cresceram embalados por décadas de insurreição e sobrevivência.
Publicado anteriormente no Papo de Cinema
Fiquei curioso. Uma hora dessas, assistirei.
ResponderExcluirGrande abraço.