sábado, 25 de julho de 2009

Minha Viagem Pessoal Pelo Cinema Americano

Uma viagem pessoal pelo cinema americano
Martin Scorsese e Michael Henry Wilson
Tradução: José Geraldo Couto


Ganhei este livro, há algum tempo, de uma amiga muito querida. As pessoas de quem gosto e que, suponho, também gostam de mim, sabendo de meu apreço pelo cinema, costumeiramente me presenteiam com algo relacionado a cinema, seja um filme, ou mesmo um livro, como neste caso. Uma Viagem Pessoal Pelo Cinema Americano é, na realidade, uma adaptação do documentário que a televisão inglesa encomendou a Martin Scorsese no meio da década de noventa, como parte integrante de uma programação especial que comemorou os cem anos do cinema. Assim, Scorsese foi convidado a interpretar o cinema americano, com a ajuda de seu colaborador Michel Henry Wilson.

Deixo claro que ainda não vi o tal documentário, não o achei nem lícita ou “ilicitamente” para conferência. Pegando então como referencial informações que a própria edição do livro traz como apresentação, ouso comparar um pouco e tecer alguns comentários sobre esta obra tão relevante. Na transposição houve o cuidado de não se esquecer do elemento visual que, no documentário se fazia presente por meio de fragmentos dos filmes pinçados por Scorsese e na versão letrada é muito bem representada por fotografias lindíssimas de diversas cenas cruciais para a construção do cinema americano. Muitas das cenas descritas, dos diálogos transcritos, foram pura novidade para mim, que peco pela falta de aproximação com os grandes cineastas americanos, não somente os amplamente reconhecidos, como John Ford ou mesmo Howard Hawks, só para citar dois, mas também, e principalmente, com os que não nos chegam por estas plagas com frequência, como Samuel Fuller, Otto Preminger, Anthony Mann, Sam Peckinpah, entre outros. Aliás, o que mais chamou minha atenção neste relato apaixonado de Scorsese foi o foco central nos diretores americanos não muito badalados e, nem por isso, menos importantes. Ao longo da leitura fui anotando alguns filmes que me despertaram a curiosidade e que julgo trarão uma ampliação de meu conhecimento como amante do cinema, além de preencher a lacuna supracitada que tenho com o grande cinema clássico americano. É claro que assisti os clássicos, os indiscutíveis, que na época ironicamente eram discutíveis, mas que hoje são incontestes, mas está na hora de mergulhar fundo nesta que é uma das mais, senão a mais, importantes cinematografias do mundo. Com mais frequência aparecerão por aqui textos, críticas ou mesmo comentários curtos, a respeito desta época fértil do cinema americano, já que este é o filão que mais me instiga no momento. Para começar, assisti O Beijo Amargo, de Samuel Fuller.

No início, uma cena forte, belissimamente filmada, mostra Kelly, uma mulher batendo em um homem bêbado que, representado pela câmera subjetiva, cambaleia, levando o público a começar o filme num misto de agonia e espanto. Já dá, de início, para perceber que as cenas de Fuller são fortes. Os personagens bem delineados e multidimensionais só aumentam o interesse pela trama, que ganha novos contornos com a chegada de Kelly a uma cidadezinha do interior. Ela guarda um segredo, que não o será por muito tempo, ainda mais quando sua presença começa a criar raízes na comunidade, influenciando a vida de todos, mas especialmente a de um policial, a de um solteiro rico, a da dona de um bordel e a rotina da clínica de reabilitação ortopédica para crianças, aonde Kelly trabalhará. O que marca muito a narrativa desenvolvida por Samuel Fuller é a utilização freqüente de elipses, de uma dinâmica que privilegia o desenrolar ágil dos acontecimentos, sem que para isso se sacrifique a fluidez, sem que o enfoque se torne apressado, atropelado. Fotografado em preto-e-branco, o filme tem um interessante jogo de luz e sombra, que auxilia no desenvolvimento psicológico dos personagens.

Fiquei particularmente fascinado pela história, pela maneira como o diretor conduz o todo, seja por meio do roteiro enxuto e bastante eficaz, ou mesmo pela direção elegante e visão incisiva que possui, de uma sociedade movida pelas aparências, maniqueísta, que eleva o mocinho a vilão em pouquíssimo tempo, e vice versa, sem critério. Sem dúvida alguma, O Beijo Amargo é um grande filme que, se, infelizmente, não goza da fama que alguns exemplares de menos qualidades artísticas têm, é por uma destas injustiças históricas, que ocorrem no cinema, de vez em quando. Só para encerrar: apenas eu fiz este paralelo, ou existe semelhança, nem que seja pequena, entre Kelly e outra mulher/protagonista que desenvolve laços com uma pequena comunidade, a Grace de Dogville, do dinamarquês Lars Von Trier? É verdade que, enquanto em Dogville a protagonista é vista quase como uma alegoria, e o foco fica nas pessoas da comunidade, a protagonista de O Beijo Amargo é o centro emocional do filme. De qualquer maneira, para quem viu os dois filmes, fica a proposta do paralelo.

3 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Obrigado pelas dicas, livro e filmes.

    Abraçosss

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  2. Estou na fila para pegar emprestado contigo tal livro e, futuramente, provavelmente o compre (se também não for presenteado com o mesmo - entenda a indireta como quiser... hahaha). Quero pedir desde já não só o livro, mas também o tal O Beijo Amargo, que realmente me interessou! Ainda não vi nada do Fuller e acredito que o momento tenha chegado depois de sua interessante descrição Celo. Acho que esqueço um pouco do cinema norteamericano, privilegiando as cinematografias tão vastas de outros países, como a da Europa - minha favorita, particularmente - pela aura das produções contemporâneas dos Estados Unidos, sempre muito voltadas para o comércio. Mas isso não é desculpa para ignorar o que foi feito, e que em breve deverá ser apreciado por nós dois.

    Um grande abraço Celo, gostei realmente do seu texto e das indicações.

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  3. Olá.
    Vi o documentário em algum canal de assinatura, na décad de 90. Estou atrás dele há muito tempo. Se conseguir, aviso.

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