domingo, 16 de agosto de 2009

Chuva

Direção: Paula Hernández
Roteiro: Paula Hernández
Elenco: Ernesto Alterio, Valeria Bertuccelli

Não é de hoje que o cinema argentino vem se destacando no cenário dos filmes feitos em território sul-americano. Enquanto o Brasil parece atordoado, à procura de uma identidade para seu cinema, do equilíbrio entre o comercial e o autoral, na Argentina se vê o desenvolvimento de uma cinematografia diversificada, porém não marcada por esta crise de identidade que aflige o Brasil. Uma das mais recentes provas da qualidade do cinema argentino é Chuva, exibido no 37º Festival de Cinema de Gramado, e dirigido por Paula Hernández.

A trama do filme cruza duas pessoas em estados próximos, que buscam reequilibrar suas vidas. Alma está fugindo de algo, morando em seu carro, lavando-se em banheiros públicos, vivendo a esmo. Roberto é um argentino que mora na Espanha desde muito cedo e que volta a seu país natal para um acerto de contas, para sepultar uma lembrança vaga, mas que lhe incomoda como se fosse viva. Eles se cruzam em um dia chuvoso, assim como a maioria dos dias retratados no filme. Suas conversas são simples, divagam sobre a vida, sobre os compromissos que largaram, sobre os segredos que preferem não partilhar, embaixo de uma cortina d’água que esconde os reais objetivos de cada um. Não são misteriosos, são reservados a uma intimidade que lhes é permitida, normais e naturais em seu instinto de auto-proteção. Aos poucos a proximidade que parecia improvável passa a se impor, e eles, juntamente com os espectadores, vão descobrindo aquilo que a intimidade passa a requisitar, ou seja, mais informações a respeito do outro.

A diretora Paula Hernández criou um filme de desenvolvimento lento, cheio de belíssimas imagens, que utiliza a chuva como metáfora de tempos turbulentos, nebulosos no que diz respeito aos sentimentos de Alma e Roberto. Não por caso, em contraponto ao clima chuvoso que acolhe a história, um dos personagens, perguntado sobre qual seria o local ideal, responde de pronto que este seria uma praia, de areias brancas, com um mar tropical e sol brilhando. Bem visível também é a preferência de Paula pela pouca profundidade de campo e pelo desfoque como ferramentas narrativas, a fim de reforçar o intimismo da mise-en-scène. Lá pelo terceito quarto do filme, a diretora, porém, peca um pouco no uso destes expedientes, se excedendo em algumas passagens que soam mais como exercício de estilo do que como orgânicos à trama. Mesmo com estes poucos excessos de caligrafia por parte da diretora, Chuva é um belíssimo filme, que mostra dois personagens fortes, interpretados por dois atores em sintonia (Valeria Bertuccelli e Ernesto Alterio), dentro de uma história em que o intimismo está implícito e na qual não há espaço para julgamentos, ou moralismos inúteis.

2 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Agradabilíssimo seu texto, Celo, tendo semelhança com o próprio filme, que criticas. O cinema argentino, bem enfocado por você, possui um identidade própria, emoldurando, não uma produção engessada nos mesmos preceitos, acusação comum à brasileira, mas um cenário extremamente relevante na arte cinematográfica contemporânea.

    Abraçosss

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  2. Celo!
    Durante a semana eu havia escrito um texto e, quando fui postar, meu computador se auto-desligou. Eh felicidade!

    Enfim, fiquei bastante interessado por 'Chuva', ainda mais por não ter lido muito sobre a produção previamente, e espero poder conferir o filme em breve.

    Parabéns pelo seu texto!
    Um grande abraço. :)

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