quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Dexter e o Passageiro

Atenção! O texto a seguir contém spoilers das quatros temporadas de Dexter.

Dexter
é meu seriado favorito. Alguns amigos já me disseram que eu adoraria outros, como, por exemplo, House, Ugly Betty, True Blood, The Office, Mad Men, entre tantos desta leva riquíssima que iça a qualidade da televisão americana e, por conseguinte, da televisão mundial, se levarmos em conta que quase todos estes são ou serão importados para os quatro cantos do mundo. Devido à falta de tempo, acabo tendo de racionar minha audiência, escolhendo, neste momento, duas séries, das quais sou fã de carteirinha: LOST e Dexter. Não poderiam estas serem mais diferentes entre si, tanto na sua temática como no seu desenvolvimento. Enquanto LOST instiga (e a mim instiga muito) por uma série de desdobramentos, que envolve desde viagens no tempo até influência da mitologia egípcia, Dexter me fascina pelo estudo do personagem, no caso de um personagem dos mais complexos, Dexter Morgan. Criança que viu a mãe ser esquartejada, adotado por um policial que logo o “diagnosticou” como hospedeiro de um “passageiro negro”, analista forense que assassina criminosos impunes para alimentar o tal passageiro, pai de família.

A primeira temporada de Dexter é primorosa. A caça ao “Assassino do Caminhão de Gelo”, as implicações da ligação do passado do mesmo com o de Dexter e toda tensão e violência do final da temporada, são elementos que deixaram tarefa ingrata aos produtores, já que a impressão causada pedia uma continuidade à altura. No segundo ano, Dexter passa por períodos de turbulência, trai a namorada, coloca em risco suas ligações sociais, busca ajuda para seu vício em matar, encontra uma pessoa tão ou mais perturbada psicologicamente que ele, a quem acaba liquidando, como catarse. Dexter procura alguém que o compreenda, que entenda seus lados, na busca de aceitação. Os personagens secundários são muito bem desenvolvidos, seus dramas pessoais, muitas vezes, se configuram numa ferramenta de enriquecimento da figura central, sem que isso tire a importância individual deles. Na terceira temporada, a busca de Dexter por aceitação se intensifica e ganha contornos de aparente sucesso quando encontra alguém que parece lhe compreender, não se horrorizar com seu lado negro, e até compartilhar de sua necessidade de matar. Mas como Dexter logo descobriu, lidar com as implicações psicológicas do ato de matar não pode ser assimilado por qualquer um, e o fascínio mórbido exercido pela morte foi tão devastador em seu “amigo” que o mesmo saiu do controle, não obedeceu a nenhum código e teve de sucumbir pelas mãos do mestre a quem não soube ouvir.

E aí chegamos a quarta temporada, na qual já vemos um Dexter casado, pai de três filhos, sendo um biológico e dois que herdou ao casar-se com Rita. Dexter então é um americano aparentemente comum ou, pelo menos, vive o dia-a-dia como pai zeloso, marido um tanto quanto ausente, assimilando de maneira profunda esta nova condição, a de homem de família. O esquema do antagonista principal das outras três temporadas é mantido, mas as implicações da existência deste personagem para o desenvolvimento da história de Dexter são tão fortes que somente podem ser equiparadas, em equivalência, às do “vilão” da primeira temporada. Dexter encontra um assassino em série, ligado em um padrão, que tem uma família, responsabilidades sociais que o ajudam a encobrir o monstro interior, exatamente como ele nesta fase de sua vida. Dexter então vê em Arthur, o adversário em questão, um farol, alguém com quem pode aprender sobre a administração destas vidas paralelas. A temporada se desenvolve neste aprendizado, na relação que se estabelece entre Dexter e Trinity (Arthur). A evolução do personagem central da série foi gigantesca a partir desta relação e da constatação, tanto do público quanto dele próprio, de que Dexter não é tão diferente da maioria das pessoas, a não ser pela necessidade que tem de usurpar a vida de outros. Ele se vê arriscando suas caçadas em nome do bem-estar de sua família, numa crescente aceitação de seu lado humano, diferente do Dexter da primeira temporada, que se achava quase que órfão de elementos humanos. Estava indo tudo bem, a temporada ia se alinhando como uma das melhores (na verdade é a melhor desde a primeira) e seguindo para um desfecho ambiguamente feliz, parecido com o da terceira temporada, quando veio o décimo segundo e último episódio do quarto ano ou, mais precisamente, seus três minutos finais. Nestes, aproximadamente, 180 segundos aconteceu um fato que, de tão brilhante, parecia improvável. Confesso que o ocorrido me tocou demais, fiquei mortificado, com uma sensação pesada, dolorosa. Não se tratou, pura e simplesmente, de segurar a audiência para a quinta temporada, mas sim de dar uma guinada completa, tanto na história como na continuidade do personagem central. Ainda reverberam em mim aqueles minutos, e eles ecoam a seguinte pergunta: E agora?

2 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Agradou-me bastante seu apanho, digamos, geral da série até então. Adoro "Dexter", mas sincero serei ao relatar que essa última temporadsa, apesar de ser a melhor depois da insuperável primeira, como bem disse, trouxe à tona, alguns problemas, que antes, me fogem os motivos exatos, não via. "Dexter" segue uma estrutura estabelecida desde seu princípio, o que à mim não é o ideal; os acontecimentos amplos, em relação ao ambiente urbano em que se localizam e desenvolvem, giram em torno de um mesmo pequeno núcleo, coincidências ou peças do quebra-cabeça que se encaixam de maneira forçada. Sei lá, outros pontos não me agradam, apesar de maneira alguma negar seus merecidos méritos. Ah, não concordo contigo em relação a melhor série do momento. "Dexter", "Lost" (pessoalmente, melhor do que "Dexter")? Não, ela é tupiniquim. "Larica Total", e o inigualável Paulo, mistura de Glauber Rocha, Serginho Malandro, com uma pitadinha de Bozo.

    Abraçosssss

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  2. Compartilho contigo a predileção por "Dexter" frente a outras séries, e você sabe que isso é algo grande, por conhecer bem a minha relação apaixonada e imortal por "Friends". Dexter, série e personagem, me capturaram desde a primeira temporada, e então passei a ser um fã devoto, chegando até a procurar o personagem na literatura (e senti falta do Michael C. Hall, um dos melhores atores contemporâneos, sem dúvida). Enfim, não preciso acrescentar nada ao seu texto Celo, você disse tudo... Só posso aguardar junto contigo uma resposta para seu "E agora?".

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