sábado, 19 de setembro de 2009

Anticristo

Direção: Lars Von Trier
Roteiro: Lars Von Trier
Elenco: Charlotte Gainsbourg , Willem Dafoe

Lars Von Trier é o mais controverso dos cineastas. Farsa para muitos, genial para outros tantos, ele realmente polariza opiniões. Mas se há algo que suas obras não permitem é a inércia. Reage-se, de alguma maneira. Seus filmes mexem com o espectador. O que esperar então de um filme escrito e filmado durante uma dolorosa crise de depressão que Von Trier teve e que, segundo palavras próprias, o ajudou a superá-la? Anticristo, ainda segundo seu criador, é um filme no qual ele colocou sessenta por cento de sua capacidade intelectual. Estaria ele sendo excêntrico e auto-indulgente ou nada mais do que sincero?

No filme, um casal está devastado pela morte recente do filho pequeno. Ele é terapeuta e não aguenta ver sua mulher sendo entupida de remédios que buscam retardar ou entorpecer sua dor. Ele parece fascinado clinicamente pela esposa. Decide então se isolar com Ela, para assim tratar da dor lancinante que sua parceira sente. Eles vão para Éden, uma cabana no campo, afastada de tudo e de todos. O que se vê são os esforços e os jogos que Ele propõe a fim de que Ela comece a processar seus sentimentos, a aceitar as diversas fases do luto e da dor. Temos três personagens muito presentes: o homem, a mulher e o ambiente. As imagens são fortes, nada é sugerido, as coisas são como são.

Anticristo começa na esfera racional, propondo uma visão “clínica” acerca do trauma que o casal sofre, e vai aos poucos mesclando esta com uma visão do irracional, representada por elementos religiosos que abundam e viram as referências mais fortes, principalmente para a personagem feminina, a partir da segunda metade do filme. Além disso, suscita polêmica a maneira pela qual Von Trier retrata a mulher, como um veículo para satanás, sendo seu sexo a tentação pela qual arruína os homens, os verdadeiros representantes de deus na terra. Acredito que Von Trier quis apenas mostrar que esta ideia histórica, oriunda do pecado original, de que a mulher é fraca e induz o homem ao erro, ainda resiste em muitos núcleos. Imagino que ele não concorde com ela, e que o fato de ele assim a apresentar não pode ser tido como prova de uma misoginia que, com frequência, lhe atribuem. Aliás, a força feminina presente no filme é Charlotte Gainsbourg, que está magnífica, numa interpretação visceral e corajosa (se já viu, sabe que aqui não banalizo os adjetivos) e que é bem acompanhada por um Willem Dafoe que esbanja a competência de sempre.

O filme está repleto de cenas maravilhosas, e não falo somente da aclamada sequência inicial, fotografada num lindo preto e branco, com imagens lentas, de poderoso efeito dramático, mas de toda a composição visual. Caso você se incomode com canibalismo, penetrações ou mesmo ejaculações de sangue, Anticristo pode parecer um pouco chocante demais. Mas se apurar o olhar, verá um artista que não tem medo de ultrapassar fronteiras na busca de fidelidade ao seu cinema. É um daqueles filmes que nos seguram firme, não só pelo visual apurado, mas principalmente pela história rica em elementos, cheia de nuances. Lars Von Trier conseguiu mais uma vez. Não agradou a todos com seu Anticristo, mas, a meu ver, criou uma obra fortíssima, de clima claustrofóbico e envolvente, que ganhará admiradores com o tempo. Sua visão é única, e assistir a um filme destes é uma necessidade para qualquer fã de cinema.

3 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Mais uma para a lista.

    Abraçoss

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  2. Marcelo,

    Que boa surpresa seu texto!
    Imaginei que você fosse admirar o filme em alguns aspectos mas em outros fosse detonar haha.
    Concordo com tudo que disse, mesmo tendo implicado com esse gênero do Lars Von Trier de chocar, sempre.
    Mas como você bem disse , ele foi fiel ao estilo e diferente do que dizem o filme não se reduz ao prólogo tão comentado, ele é muito mais, é único, sem dúvida.
    Como acontece quase todas as vezes que leio seus textos aqui, fiquei com vontade de rever pra prestar atenção nos detalhes que você cita.

    Um beijo.

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  3. Celo!
    Como havia comentado contigo previamente, fiquei bastante dividido com o filme do Von Trier... Não posso dizer que gostei mas também que não, é complicado... Enfim, você sabe do que estou falando! haha Certamente quero ver novamente qualquer hora.

    Um grande abraço.

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