domingo, 13 de dezembro de 2009

Desejo e Perigo

Direção: Ang Lee
Roteiro: Eileen Chang (argumento), James Schamus (roteiro), Hui-Ling Wang (roteiro)
Elenco: Tony Leung Chiu-Wai , Wei Tang, Joan Chen, Lee-Hom Wang Kuang, Chung Hua Tou, Chih-ying Chu, Ying-hsien Kao, Yue-Lin Ko

Ang Lee, após ser cooptado por Hollywood, aliás, como sempre o mítico olimpo do cinema estadunidense fez com talentos oriundos de outras praças, poderia ter se aconchegado na confortável posição de diretor de estúdio, produzindo sob encomenda, sem grandes riscos e contas a pagar. Poderia muito bem ser este peão de opinião insípida, caso não fosse um inqueto artista, alguém que, filme após filme, vem demonstrando que é evitável a onda do “fui absorvido pelo sistema”, desculpa esta utilizada por muitos que não tem a coragem de olhar para trás e creditar à sua acomodação, os rumos insignificantes de suas carreiras. Após perder injustamente o Oscar com seu excelente O Segredo de Brokeback Mountain, no qual trata do homossexualismo sem plumas ou mesmo um olhar excêntrico, concentrando o foco no amor, independente do gênero, Lee partiu a sua terra natal, voltando as raízes orientais, utilizando, ele sim com inteligência, o prestígio que o cinema americano lhe conferiu na busca de melhores condições para expressar sua arte.

Desejo e Perigo nasceu deste retorno de Lee ao oriente, e é um filme que remete aos clássicos, afinal de contas, ele (Ang Lee) tem sem mostrado um dos mais clacissistas narradores do cinema contemporâneo. A história de jovens militantes membros de um grupo de teatro que lutam contra a ocupação japonesa na China durante a 2ª Guerra Mundial, e sua missão de neutralizar um homem, chinês colaborador dos ocupantes japoneses, a quem alcunham de “traidor”, não se submete, ou mesmo apóia, no subtexto ou, que seja, no contexto histórico, com bem fazem alguns filmes que se propõem a lançar um olhar sobre determinado período. Lee, mais uma vez, direciona seu olhar para o humano, para as vicissitudes dos sentimentos, para as maneiras, muitas vezes inexplicáveis, como o amor e o desejo afetam a vida das pessoas. É claro que há todo um contexto político na trama de Lee, e não podia ser diferente, já que o período é doloroso na história do oriente e as feridas deixadas pela ocupação ainda se refletem nas diferenças persistentes entre japoneses e chineses, por exemplo. O ponto crucial é que Ang Lee não deixa que um eventual panfleto, ou uma bandeira mal hasteada, atrapalhem, a história que ele quer contar, do envolvimento amoroso improvável entre Wang Jiazhi, atriz que trabalha disfarçada, e o Sr. Yee, o “traidor”, que tortura e mata em nome do regime de governo e ideológico que mais lhe convém.

Muito alardeadas (mais até do que as virtudes do filme) as cenas de sexo são intensas, fortes ao ponto de termos dúvida da veracidade ou não de uma ou outra penetração. Nada gratuito, vale dizer. O envolvimento dos protagonistas, que se inicia com uma inocente troca de olhares, tem o tempo suficiente para amadurecer a margem do contexto e, no momento oportuno, sair da sombra do entorno para protagonizar o filme. A favor de Lee, além de seu inegável talento e elegância de contador de histórias, existe uma belíssima reconstrução de época, não daquelas desnecessariamente opulentas e ostensivas, e também um ator magnífico, em estado de graça: Tony Leung Chiu-Wai. Definido certa vez pelo crítico Ricardo Calil como “O Marlon Brando oriental”, Tony Leung Chiu-Wai encarna com tal paixão o Sr. Yee, que é impossível não dar razão a Calil, na comparação entre Leung e um dos maiores atores de todos os tempos. Desejo e Perigo é, assim, outro excelente filme de Ang Lee, de grandes proporções, não somente pela duração (quase três horas), e muito menos pela, já comentada, reconstrução de época, mas por mostrar o amadurecimento de um artista que, como devoto da narrativa clássica, sabe muito bem equilibrar tramas principais, paralelas e subtextos, sem que um acabe eclipsando o outro.


3 comentários:

  1. Fiquei encantada quando assisti "desejo e perigo"!Mas agora, depois do seu texto, não confundo mais os Tonys Leungs rs ;)
    É tão reconfortante encontrar opiniões semelhantes às nossas, como essa sua de que Ang Lee perdeu injustamente o Oscar por "Brokeback Mountain"! Eu na ocasião fiquei bem indignada, considero esse filme uma obra prima e como vc falou : uma história de amor sobretudo.
    Aliás Ang Lee faz bem isso, ele fala de amor como poucos, de um jeito ímpar e bem autoral.
    beijos

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  2. Oi, Celo!
    O interesse em assistir a tal filme já existia, mas seu texto o fez despertar. Gostei bastante da forma como construi sua crítica, Celo, buscando alternativas na expressão de seu caminho reflexivo.


    Abraçossss

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  3. O filme é muito interessante e tem uma ambientação belíssima, contribuindo muito para passar a imagem de uma época e o período histórico nele apresentado. Ótimo ver Ang Lee em tão boa forma! Agora é hora de assistir "Aconteceu em Woodstock", que aparentemente em comum com "Desejo e Perigo" tem apenas a direção! Belo texto Celo. Abraços!

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