domingo, 27 de dezembro de 2009

Preciosa

Direção: Lee Daniels
Roteiro: Geoffrey Fletcher, baseado no romance escrito por Sapphire
Elenco: Gabourey Sidibe, Mo'Nique, Paula Patton, Mariah Carey, Sherri Shepherd, Lenny Kravitz, Stephanie Andujar, Chyna Layne

Outro dos postulantes a êxito na próxima festa da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas no Kodak Theatre, por seu desempenho nos festivais pré-Oscar e seu sucesso entre crítica e público estadunidense, Preciosa é um drama, um filme de pequeno orçamento, que trata da vida sofrida de Claireece Precious Jones. Não é simplesmente uma trajetória sofrida como a de muitos casos reais transformados em narrativas diegéticas (sim, Preciosa é baseado num livro que, por sua vez, é fundamentado numa história verídica), mas uma das mais sofridas, daquelas que se não soubéssemos ser galgada em fatos, sairíamos a disparar contra seus autores, acusando-os de inverosimilhança. A lista de agruras pelas quais Claireece passa durante sua vida é imensa, mas esmiúçá-la traria a ira do leitor que ainda não viu o filme, pelo fato do simples adiantamento destas informações configurar-se numa abstração de descobertas que, gradativamente, constroem o filme.

Atrevo-me a relativizar a recepção exacerbadamente calorosa que Preciosa vem tendo em inúmeras resenhas por aí. Colocar em cena uma excluída social, sofrendo por conta de um destino, no qual nada pôde escolher, se configura, por si só, em elemento de aproximação com o espectador, que sente logo empatia e pena dela. Neste filme, esta força natural tira da atriz principal o fardo de ser convincente, já que sua presença física, pura e simples, mortifica e cria uma atmosfera que, tal como uma bruma, disfarça a atuação de Gabourey Sidibe, que se limita ao automático, bem ao contrário de, por exemplo, Mo’Nique, que interpreta fortemente a mãe de Claireece, no papel mais complexo e interessante de Preciosa. Lee Daniels parece ter caído na armadilha de fetichizar um pouco demais a imagem de sua protagonista, esvaziando os entornos, ou os estereotipando. A utilização de velhos clichês como a professora que luta pela salvação da aluna, a funcionária do serviço social que serve de válvula de escape, numa representação do papel do Estado e da maneira como ele trata, ou deveria tratar, os menos favorecidos, não chega a incomodar, por mais que salte agressivamente aos olhos, vez ou outra.

Mesmo que fale sobre uma vida de percalços, privação e extrema falta de oportunidade, Preciosa sofre de uma alienação incômoda, que desvia um pouco o foco. Algo não ajuda no desenvolvimento do filme, certas opções, principalmente do roteiro e direção, resolutos em nos deixar penalizados, paradoxalmente ao mesmo tempo em que atenuam alguns dramas por meio da curta duração de sua exploração, trazendo ao filme uma leveza mais próxima dos contos de fadas, ainda que o que discorra na tela seja algo monstruoso. Nada contra a abordagem “conto de fadas pelos olhos da Gata Borralheira”, só que, estilizando a caminhada de Claireece na luta contra seus problemas ou mesmo na busca de coisas normais, como um namorado, boa condição de vida para si e seus filhos, o diretor Lee Daniels criou uma narrativa correta, mas que peca por uma edulcoração velada, uma suavização travestida de opção estética, que chateia pelo falsete. Preciosa é um bom filme, não nos furta ótimos momentos, mas falha no intuito de ser maior e melhor, exatamente por não se deter com paixão ou mesmo crueldade em quase nada, se mostrando um rascunho, uma versão meio que oca da existência desta mulher que personifica o mundo-cão.


4 comentários:

  1. ..contudo parece muito interessante.
    Vc gostou afinal?
    beijos
    Carol

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  2. Olha Carol, eu gostei do filme, mas sabe quando tu sente que certo artificialismo estragou o que poderia ser um estudo de personagem poderoso? Foi esta minha sensação. Meu texto ficou um pouco "negativo", além até da minha reação ao filme, por conta destas opções do diretor de edulcorar um pouco, não precisamente a história, mas a forma de contá-la, tirando o peso de algumas sequências, por mais que a vida de Claireece seja desgraçada por si só.

    beijoss

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  3. Olá, Celo!
    Não me interesso por esse filme por parecer, posso estar enganado contudo, um longa-metragem de programas sensacionalistas, os quais temos aos borbotões na mídia brasileira.

    Abraçosss

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  4. Posso apenas esperar pela sessão com "Precious" para poder opinar... Mas confesso curiosidade no filme, desde que vi o trailer tempos atrás, assim como elogiosos comentários sobre as interpretações presentes na produção.

    Abraços Celo!

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