
Começamos “A Vida dos Peixes” ao lado de Andrés e alguns amigos em uma festa de aniversário. As piadas e o clima de descontração são abandonados quando se revela ao espectador que Andrés está voltando para a Alemanha, e que sua rápida visita após 10 anos afastado está no fim. Andrés então é informado que Bea, uma antiga namorada, chegará logo. Decidido a evitar o possível conflito emocional do encontro, decide ir embora - quando já é tarde demais.
A partir daí acompanhamos o passado de Andrés sendo remontado em pequenas ações, diálogos pouco esclarecedores e muitas suposições por parte do espectador. Seu encontro com antigos amigos e todas as pessoas que habitaram seu universo há tanto tempo, assim como as vivências de um passado que não poderia estar mais presente, tornam a experiência com “A Vida dos Peixes” um exercício triste e nostálgico para com um mundo que não é o de quem assiste, mas que inevitavelmente passa a ser.

Enquanto revela cada pedaço da vida de seu protagonista, Bize e sua competente diretora de fotografia, Bárbara Álvarez (a mesma de “A Mulher sem Cabeça”), inserem em seus enquadramentos elementos sobrepostos em planos distintos – ora são luzes, objetos e até mesmo pessoas. Tal artifício passa a se justificar cada vez que ele se torna menos recorrente, quando se entende seu tom simbólico, que representa a história de Andrés ficando clara para o espectador – assim como a bela mise-en-scène do filme.
Filmes de retorno são comuns, mas poucos atingem a densidade e melancolia deste “A Vida dos Peixes”. Os recentes “Tudo Acontece em Elizabethtown” e “Hora de Voltar” rivalizam em tema com o filme de Matías Bize, mas ambos seguem através de uma perspectiva mais leve e cômica. No drama chileno, cada sequência é necessária para se construir uma imagem sobre seu protagonista, para que se entenda o motivo pelo qual sua volta é tão pesada e incômoda para si, ainda que agrade todos à sua volta.
Fica evidente a maturidade de Matías Bize como diretor e roteirista, capaz do difícil feito de substituir uma verborragia explicativa em diálogos excessivos por longos silêncios. Um realizador competente, como Bize aqui se mostra, tem a capacidade de escrever com a câmera, de mostrar que a contenção de recursos, simplicidade e naturalidade podem ser melhores que quaisquer aparatos técnicos e artifícios megalomaníacos. Bize ainda deve muito ao seu duo de protagonistas, dois maravilhosos atores que encontram na expressão e controle o tom certo para seus difíceis personagens. São eles: Blanca Lewin, que já trabalhou com o diretor no inferior “Na Cama”, e Santiago Cabrera, que é conhecido internacionalmente pelo personagem Isaac Mendez, da série “Heroes”.
E em dado momento do filme percebe-se que Andrés não consegue ir embora. São inúmeras as vezes que ele se aproxima da saída, ou que se despede de alguém dizendo que está indo, e que um magnetismo invisível o mantém preso ao lugar. Nesse ponto, “A Vida dos Peixes” lembra o magnífico “Os Famosos e os Duendes da Morte” - sensação reforçada por sua cena final. Há uma redenção, ou a libertação do personagem? Assim como em todo o filme, apenas a suposição pode nos fornecer as respostas – exatamente como acontece com Andrés e Bea.
Belíssimo texto, Kon, parabéns. Se já tinha grande curiosidade para assistir a este filme chileno, que a tantos encantou desde sua estreia, agora com esta sua análise profundamente emocional (sem perder o racional de vista) da maneira como os relacionamentos se constroem durante o filme, esta se agigantou. Provavelmente verei logo. É incrível como o cinema latino americano atingiu (ou está atingindo)maturidade, tanto no que tange a dramaturgia de suas histórias, como em suas qualidades técnicas.
ResponderExcluirMais uma vez, valeu pelo ótimo texto.
Abraços
Olá, Kon!
ResponderExcluirParabéns pelo texto, muito bem escrito. Fiquei com curiosidade, mais um à lista.
Abraçossss