sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Paradoxo no Planeta dos Macacos


Planeta dos Macacos – A Origem, retorno cinematográfico à mitologia iniciada com o livro de 1963 de Pierre Boulle, logo transposto ao cinema em 1968, é um blockbuster bastante interessante, pois não ofende a inteligência de quem o vê. Filme ágil, mescla algumas discussões científicas com cenas de ação muito bem coreografadas e registradas. Apresenta ainda o protagonista digital (Ceasar) em performance bastante acima da de seus colegas de carne e osso. Porém, não é tudo isto que alguns críticos têm sinalizado, afinal também se mostra obra limitada, por vezes indecisa entre os rumos da ética e a guerra que se anuncia.

O que me chamou mais a atenção foi o paradoxo ideológico que nele se instaura. Por se tratar de um prequel, em Planeta dos Macacos – A Origem vemos o início da ascensão primata e a consequente derrocada humana. O cientista interpretado por James Franco pesquisa arduamente uma droga capaz de regenerar células cerebrais, com o intuito primeiro de curar seu pai que sofre de Alzheimer. E é justamente esta droga que provoca a evolução, por assim dizer, dos macacos e a contaminação letal dos homens. A mensagem é óbvia e das mais batidas: não se pode brincar de Deus, pois o todo poderoso não admite que seus filhos provem do fruto da sabedoria, punindo quem o faz. É a velha parábola moralista de Adão e Eva no Gênesis, que encontra roupagem contemporânea nas pesquisas científicas. 

Pois bem, se tivermos em mente que no filme de 1968 - que se passa anos luz no futuro - os símios possuem características humanoides ainda mais acentuadas, perceberemos de imediato o paradoxo que reside neste Planeta dos Macacos – A Origem. Sob este prisma há, de fato, desenvolvimento constante e gradativo da condição estrutural dos macacos, partindo da inteligência acima do normal e das poucas palavras pronunciadas que vemos na obra recém lançada, até que se chegue à configuração biológica vista no original, em que são quase humanos. Esta trajetória se assemelha aos estudos de Darwin que resultaram na teoria da evolução das espécies. Ora, a tese em questão refuta completamente a apregoada pela Igreja, na qual o homem teria sido moldado do barro, à imagem e semelhança de Deus. Então, ao passo que Planeta dos Macacos – A Origem expõe claramente a velha crítica de fundo religioso e dogmático do homem brincando de ser Deus, mostra que a evolução das espécies, embasada cientificamente, de fato pode ser a resposta para a existência humana. Desculpem se ficou confuso, mas é interessante, não? 

Resta a você, amigo que se aventurou por estas linhas, não as abandonando no meio do caminho, conjecturar sobre a intencionalidade do paradoxo, tomar partido do lado (ciência vs religião) que lhe pareça mais sólido, ou refutar completamente o lido acima, por entendê-lo fruto de uma mente viajante. Tudo, menos a indiferença.

6 comentários:

  1. Interessante apontamento, Celo! Não havia analisado o filme por este prisma, provavelmente por eu não ter ficado com o mesmo por considerável tempo em minha mente. Percebi que, ainda que tenha seus méritos, este novo Planeta dos Macacos não suscitou muitos questionamentos por minha parte e logo deixei no limbo dos filmes "bacanas", mas que não me instigam à uma nova visita, seja ela através de pensamento ou de uma nova sessão.

    Grande abraço, guri!

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  2. Concordo contigo Kon. Este "Planeta dos Macacos - A Origem" não chega a ser memorável, e sua lembrança tende a desvanecer logo.

    Sobre o paradoxo que levantei, tendo a achar que o texto ficou meio confuso, afinal foi difícil colocar alguma ordem nos meus pensamentos "delirantes" sobre a dicotomia ciência vs religião que eu, de alguma maneira, vi no filme.

    Abraços

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  3. Olá, Celo!
    Outra característica ideológica: a evolução de nossos inimigos e diferentes resulta em nós homens.
    É o colonialismo pregado pelos colonizados, onde os agentes tornam-se parte integrante dos até então oprimidos.

    Abraçosssss

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  4. Adorei o blog de vocês!
    De extrema qualidade, parabéns!

    Thiago
    Sorocaba/SP.

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  5. Olá Thiago,

    Muito obrigado pelo elogio. Volte sempre que quiser.

    Abraços

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  6. Concordo que exista um paradoxo no "Rise of the Planet of the Apes" - mas ele não se trata de uma oposição entre religião e ciência.
    1. Há toda a pesquisa em relação ao funcionamento do cérebro e a utilização de medicamentos para curar doenças. Tecnologia científica se aperfeiçoando e ao lado, há o mercado onde essa tecnologia será vendida. O setor de saúde é um subsetor do setor financeiro de mega-empresas. Aponto para o seguinte: Não há uma "ética" nessa ciência mostrada - a intenção não é curar as pessoas, mas fazer um produto excelente em vendas.
    2. Há duas versões da droga. A 112 e a 113. O evento "César" é produto de um experimento mal orientado que os cientistas não "perceberam" a gravidez da mãe do mesmo. Ou seja, fizeram exames insuficientes e ineficazes, algo que parece ser compatível com uma lógica de mercado que usa cobaias e não tem nenhuma preocupação com elas - afinal, são apenas produtos. A droga 112 falha pois o sistema imunológico humano consegue responder a ela e a anula - bom para a nossa espécie e mal para o mercado, afinal não é uma boa droga. A droga 113 - por um acontecimento acidental - se espalha na forma de vírus, demonstrando mais uma vez a falta de preparo dos cientistas, empenhados demais em produzir resultados. Voltando - César é um experimento da 112, que não é nocivo para os humanos, enquanto a 113 é altamente nociva para os humanos.
    3. Talvez o paradoxo se forma assim: Diretamente, há apenas dois macacos "inteligentes". Aquele que sofre a aplicação da 112 e aquele que sofre a aplicação da 113. No Centro de Animais, César solta a droga 113 tornando seus companheiros "inteligentes". Eis que surge o problema: Como os macacos, por exemplo, do zoológico, se tornaram inteligentes? Afinal, eles saem de sua jaula já se armando. Hipótese: O 113 não se manteve apenas no Centro de Animais, mas se espalha por toda a atmosfera. Os humanos não são afetados por ele - exceto aquele assistente que havia se infectado. Ou os humanos foram infectados a partir daquele (que parece que é o que a última cena sustenta), ou a infecção foi por César - ou ambos.
    O problema em todo o filme está no próprio uso do progresso científico que se torna refém da lógica de mercado capitalista.

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