O Cavaleiro Solitário é baseado na famosa criação de George
Washington Trendle, desenvolvida em idos tempos pelo escritor Frank Striker para
rádio, cinema e televisão. As aventuras do Ranger John Reid (Armie Hammer) e de
seu fiel escudeiro, o comanche Tonto (Johnny Depp), retornam agora sob a batuta
da Disney, do produtor Jerry Bruckheimer e do diretor Gore Verbinski. Tais
assinaturas juntas sinalizam o tipo de filme a esperar: sério candidato a blockbuster da temporada, com o carimbo
“para toda a família” inerente à maioria das realizações da casa de Mickey. A
ação se passa nos Estados Unidos, fim do século XIX, época em que muitos
americanos andavam armados e lutavam contra os nativos por espaço. A civilização necessita de progresso e ele
parece vir sobre os trilhos da malha ferroviária que começa a ser construída
para interligar o país.
Na viagem que o traz de volta à
pequena cidade natal, onde moram o irmão, a cunhada e o sobrinho, John Reid testemunha
o escape do bandido Butch Cavendish (William Fichtner), a quem as autoridades
traziam sob custódia para enforcamento. Também ali o filho-pródigo conhece
Tonto, seu futuro parceiro no encalço do fugitivo. Apelidado Kemosabe (irmão
errado), esse homem, crente no poder da lei para além da força bruta, pegará em
armas buscando justiça e vingança. Já o cúmplice selvagem o ajudará por
acreditar que ele ressurgiu dos mortos. Ainda há o cavalo espiritual,
provavelmente o melhor coadjuvante do filme, centro das cenas mais engraçadas,
ao menos.
Johnny Depp inclui outra figura à
sua galeria de tipos insólitos, na prateleira bem ao lado de Jack Sparrow, com
quem seu índio parece irmanar-se em matéria de esperteza. Aliás, como a
história é contada por Tonto a um garoto nos tempos atuais, e levando em
consideração a inclinação do personagem ao exagero, deve haver bom tanto de lorota
na dramatização do passado de glórias onde ele supostamente ajudou a derrotar
os gananciosos que queriam fazer da novidade um elemento de poder. Já Armie
Hammer, o virtual protagonista, soa burocrático, seja por não conseguir
transitar com sutileza entre iniciais convicções pacifistas e posteriores impulsos
vingativos, ou por simplesmente acabar eclipsado pelo carisma e talento de Depp.
A duração do longa (149min) não
se deixa sentir pelo ritmo que mescla ação e humor de maneira eficiente. Aliás,
“eficiência” parece mesmo a expressão definidora de O Cavaleiro Solitário, peça de estúdio milimetricamente construída
para edificar uma nova franquia, sem tantas preocupações com estilo e profundidade.
Contudo, justiça seja feita, esse é o propósito pelo qual o filme de Verbinski
merece tanto ser visto quanto analisado. O
Cavaleiro Solitário é divertido, ainda que trate subtextos (ganância, amor,
culpa, senso de dever, entre outros) apenas como escada para grandiloquência e
comédia. Obras como essa evitam o erro como o diabo foge da cruz, enquanto outras
não hesitam arriscar-se. Mas não sejamos ranzinzas, que há mal em, de vez em
quando, a aventura pela aventura?
O Cavaleiro Solitário de alguma maneira resgata o western como gênero para o grande
público. Não convém colocá-lo no mesmo patamar dos faroestes de outrora, mas ao
menos ele explora corretamente (repito, dentro do intento) esse território
sacralizado pelo cinema. Sem solavancos, passamos de personagem em personagem,
de situação em situação, satisfeitos se atentos à sessão e não às ressonâncias pós-audiência.
O menino vestido de cowboy que ouve tudo do velho Tonto nos representa. Ele se empolga
com mocinhos e bandidos, honradez e vilania, assim como reagimos no lado de cá
da tela ao seguir o ritmo frenético dos acontecimentos, tal se voltássemos à
infância, onde éramos menos exigentes e fisgados por histórias escapistas do
bem contra o mal.
Publicado originalmente no Papo de Cinema
Belo texto. Parabéns, guri.
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