Filmar western em pleno ano de 1995 pôde ser considerado, além de sinal de
resistência, atitude fetichista. Sam Raimi, então um diretor de afamada
carreira no cinema mais ligado ao terror, incursiona pelo oeste selvagem
resgatando esse gênero que tanto contribuiu não apenas para a consolidação dos
EUA como potência cinematográfica, mas para a própria linguagem do cinema.
Sabe-se lá por que, o público passou a não mais responder nas bilheterias aos
chamados vindos das pradarias, dos ranchos, dos valorosos e crápulas
pistoleiros apresentados na tela. Ou
seja, trazer de volta o western
sabendo do provável fracasso nas bilheterias é, além de declaração de amor, por que não, um ato político.
A coragem de Raimi se afirma na
confiança do protagonismo a uma mulher. Em território historicamente dominado por
homens, no qual a mulher ou era submissa esposa ou prostituta, surge cavalgando
no horizonte a bela Ellen (Sharon Stone). Vestida tal cowboy¸ arma no coldre, chapéu e aquele olhar ferino tipo “Estranho
Sem Nome”, ela chega até a cidade Redemption
em busca da boa e velha vingança, tema abundante num período em que 09 entre 10
pessoas carregavam armas nas ruas e, não raro, davam vazão à raiva metendo bala
na cabeça de alguém. No caso de Ellen, a desforra tem razões mais sombrias e
remonta ao assassinato do pai, então Xerife, pelo bando de John Herod (Gene
Hackman) que, claro, ela encontrará na cidadela com nome de premonição.
Herod promove na ocasião um
torneio de tiro, onde viver é sinal de vitória. Ele traz forçosamente o velho
parceiro Cort (Russel Crowe) para a peleja, tirando-o da vida dedicada às
pregações religiosas para lembrá-lo de seu passado assassino. Cort, rápido e
letal, será espécie de suporte psicológico a Ellen. Além da vingança, outro
tema trabalhado em Rápida e Mortal é a
relação pai/filho, uma vez que Herod terá como oponente seu próprio filho Fee
“The Kid” (Leonardo Di Caprio), jovem ávido para provar ao pai seu valor, nem
que para isso precise matá-lo em duelo.
Raimi cozinha esse assado numa
panela repleta de referências, sendo a principal delas o italiano Sérgio Leone,
ícone do chamado spaghetti western. Entre
filiar-se à tradição estadunidense e seguir a maior dramaticidade do
bangue-bangue europeu, o diretor envereda visualmente pela segunda, muito mais
próxima de seu itinerário estilístico repleto de ângulos insólitos e tipos
marcados. Mas Raimi não se propõe ao pastiche, dotando Rápida e Mortal de identidade própria e carimbo com sua assinatura
contumaz. Quiçá o problema (se isso for problema) maior do filme resida no
eclipse da protagonista por dois personagens tão ou mais fortes que ela própria:
Herod e Cort. Algo a ver com as interpretações contundentes de Gene Hackman e
Russel Crowe, frente à burocrática Sharon Stone? Pode ser.
Independente dessas questões, Rápida e Mortal é um filme de brios,
empolgante e cheio de energia. Se não trouxe nada de novo para o gênero, o
resgatou dignamente do limbo.
Publicado originalmente no Papo de Cinema
Mais uma para minha (imensa) lista.
ResponderExcluirObrigado, grande abraço.