quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Cota de tela: o verdadeiro drama no cinema nacional

Desde o governo de Getúlio Vargas, na década de 30, o cinema nacional possui uma legislação que beneficia (em tese) as produções realizadas em nosso país. Os filmes que são produzidos no Brasil são protegidos pelo decreto nº 7.414, que reserva espaço para a exibição de obras nacionais em salas de cinema. Em seus últimos dias de mandato, o agora ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o decreto com as cotas de tela para 2011, consideradas pelos mais otimistas como extremamente benéficas para a distribuição do cinema nacional.

O decreto, que é o terror para a maioria dos exibidores braisileiros, nunca foi a solução adequada para o problema de distribuição de obras nacionais no país. Embora tenhamos um histórico recente de bons números para o cinema nacional, seja em renda ou em número de espectadores, tais dados se referem a um número restrito de produções e não reflete a condição precária da distribuição do cinema nacional dentro do nosso país.

De acordo com a Abraplex - Associação Brasileira das Empresas Exibidoras Cinematográficas Operadoras de Multiplex, a reserva compulsória de mercado viola princípios básicos como a relação entre oferta e procura, a liberdade de iniciativa empresarial em atividade privada, a previsibilidade do risco do empreendedor e a inadequação do produto aos mercados.

No ano passado, por exemplo, o Brasil atingiu 19% do faturamento do mercado interno de consumo de obras cinematográficas, sendo um dos 15 países do mundo que mais assistiu a seus próprios filmes. No entanto, se lembrarmos que 2010 foi o ano de filmes muito populares como "Chico Xavier", "Nosso Lar" e do fenômeno "Tropa de Elite 2", esse números se justificam e demonstram que, dentro dos 80 filmes brasileiros lançados entre 2009 e 2010, apenas um número mínimo de produções ganharam notoriedade e um público satisfatório.

A cota de tela para produções nacionais em 2011 tem números bastante maiores do que o dos anos anteriores, definidos pela Ancine - Agência Nacional do Cinema de acordo com os filmes que serão lançados no ano que se inicia e com as estimativas de público. Os números são obtidos após consultas com representantes de produtores de cinema, distribuidores e exibidores. Para 2011, complexos de cinema com 6 ou 7 salas deverão exibir no mínimo 9 filmes nacionais durante o ano, com um período de 63 dias de exibição. Espaços de apenas uma sala, durante 28 dias dentro do ano, devem exibir no mínimo 3 filmes nacionais.

Como um remédio que ameniza uma doença mas não a cura, a cota de tela garante espaço de exibição para produções nacionais mas não o mais importante: o público. Já é histórico o preconceito que muitos brasileiros têm com o cinema nacional, respeitando apenas produções de grande apelo popular ou com temáticas específicas de interesse próprio - como a onda dos filmes espíritas, que periodicamente ocupam nossos cinemas.

A política brasileira utiliza o argumento de que a cota de tela contribui para a distribuição de filmes nacionais dentro do Brasil - o que não está incorreto. No entanto, tais ações e esforços são nulos para a grande maioria desses filmes, que ficam destinados à festivais de cinema e mostras. Ainda que o país possua eficazes leis de incentivo para a produção de cinema, não existem saídas eficientes e realmente válidas para a distribuição dessas obras, assim como para a formação de público. Caso este último dedicasse uma pequena porcentagem do entusiamo que aplica ao futebol no país, o grande problema com as produções brasileiras estaria resolvido. No entanto, infelizmente, o cinema não é nossa paixão nacional.


2 comentários:

  1. Esta questão da cota de tela é apenas uma ponta do problemático tema da distribuição do filme brasileiro. A meu ver, a cota é necessária, pois não deixa o cinema nacional totalmente a mercé do cartel instituído pelas distribuidoras internacionais e pelos exibidores, que se pudessem exibir somente os mais falados, fariam com certeza. Na Coréia do Sul, país com um cinema de destaque de uns tempos para cá, durante muito tempo a cota para a exibição de filmes nacionais foi muito maior, mais opressiva às "liberdades de oferta e procura" (A lei previa, até julho de 2006, a obrigatoriedade de exibição de filmes coreanos por 146 dias, mas este número foi reduzido pela metade por um apelo do governo americano, coincidência?) e este radicalismo deu algum resultado. Mas não acho que radicalizar seja o caminho. Porém, acredito que não podemos ficar sem esta regulamentação, que obriga os cinemas a prestigiar os filmes brasileiros. É um tema complexo, muito bem abordado, Kon.

    Abraços

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  2. Olá, Kon!
    Ótima a sua iniciativa de colocar em pauta assunto de tamanha importância. As cotas servem como remédio imediatista, mas não à longo prazo. O público deve ser formado e não forçado às produções de origem nacional. Ao meu ver, o entusiasmo que o povo brasileiro aplica ao futebol, mencionado por ti, não possui relação com a sua cinematografia. O futebol, bem como qualquer esporte, é fonte de paixão, até mesmo escapismo em relação aos problemas enfrentados pela população. O cinema é arte, é reflexão, pode também se configurar paixão, mas estritamente ligado ao racionalismo. O brasileiro precisa aprender a apreender a arte de sua terra e isso passa por diversos tópicos complexos, dentre eles o sistema de educação atualmente sucateado, dono de raras exceções, o qual deveria impelir ao questionamento e não apenas passar alunos de ano, mesmo sem os méritos devidos e adequados para tal.

    Abraçossss

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