domingo, 18 de maio de 2014

Doses Homeopáticas #20


A nova aventura do Cabeça de Teia nos cinemas segue a reinvenção promovida por Marc Webb no filme anterior, com um Peter Parker jovem, malandro e cheio de tiradas espirituosas. O ESPETACULAR HOMEM-ARANHA 2: A AMEAÇA DE ELECTRO bota certa ordem na história dos pais de Peter e mescla ótimos momentos de ação (provavelmente nunca vimos o Aranha tão de perto, nem de maneira tão eficiente como agora entre os prédios da metrópole) com as dificuldades amorosas e existenciais do protagonista. Se Sam Raimi pendia à caricatura (e muito bem), Webb prefere uma abordagem (também eficiente) mais próxima do garoto por baixo do uniforme, tão confuso como qualquer outro da sua idade, mas com o agravante de ter poderes e com eles responsabilidades.


Asgard Farhadi, como li por aí, virou uma espécie de autoridade em divórcios, ou melhor, nos meandros dolorosos dos finais dos relacionamentos. O PASSADO não é tão brilhante quanto A Separação, em parte porque não transcende o pessoal para comentar um cenário social amplo e mais complexo, mas, a despeito também de seu ritmo, às vezes, um tanto lento além da conta, é outro belo exemplar que investiga as fragilidades humanas. Sim, pois se os filmes atuais estão cada vez menos humanos, Farhadi vai contra a maré e constrói toda a ação nas emoções e contradições dos personagens, naquilo que justifica carne e ossos. Não há espaço para maniqueísmos ou simplificações em O PASSADO, o que lhe distingue em meio a tantos filmes inumanos que vemos por aí.


Adaptação de uma peça teatral, EU, MAMÃE E OS MENINOS anda devagar quase parando até sua metade. As piadas com a indefinição da sexualidade do protagonista, numa trama contada alternadamente pelo próprio entre o palco e flashbacks, são um tanto sem graça, flertam com o humor raso em certos momentos. Com o passar do tempo, algumas sutilezas se impõem e transformam o que parecia uma história banal da obsessão do filho pela mãe, numa dinâmica familiar (de aceitação) mais complexa do que se poderia imaginar. Sendo assim, a segunda parte ressignifica de maneira surpreendente a primeira, dotando o banal de uma funcionalidade até então insuspeita. É uma obra em dois atos, na qual o primeiro deixa de ser frágil somente quando ancorado no segundo. 


GETÚLIO não é um filme ruim, aliás, está bem longe disso. O problema não é o recorte, sempre bem-vindo, ainda mais quando se quer dimensionar um personagem em seu momento mais crítico. O filme de João Jardim se debruça sobre os 19 dias que antecederam o suicídio de Getúlio, nos quais afloraram tensões políticas e suas equivalentes pessoais. Tudo é muito bem reconstituído e fica a impressão de um filme íntimo, sem aspiração à grandiloquência, ainda que narre fatos grandiosos. O que importa é Getúlio o homem, o estadista acuado ou ainda a efervescência do país no período? É aí, na falta de foco (ou de tempo?) que o bicho pega. Há uma sensação de ausência substancial, como se algo capital se perdesse em meio à tentativa de dar relevo às muitas possibilidades


Os filmes de Johnnie To encontram pouco (ou nenhum) espaço no nosso circuito, o que é uma pena. VINGANÇA dá bem uma ideia do que esperar da assinatura desse cineasta de Hong Kong. São cenas e mais cenas de tiroteios tão bem filmados, com imagens tão cuidadosamente construídas, que da barbárie brota uma beleza não apenas plástica, mas também poética. A vendeta do francês contra aquele que dizimou sua família é permeada pela afirmação da necessidade de ir à forra, isso contra qualquer sentido de redenção ou do perdão edificante. É bala que come solta, sangue como que evaporando dos corpos em queda, tudo em prol de coreografias, digamos, de morte. Como esquecer da sequência do tiroteio na floresta, iluminado pela luz da lua e pelo fogo das armas, ou daquela que se passa num lixão? Cinema de primeira qualidade. 

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