sexta-feira, 30 de abril de 2010

Opinião: Viva a burrocracia!

Tentarei fazer um texto breve, não reacionário ou irado, pois isso tiraria qualquer sensatez ou mesmo a completa validade de minhas palavras. Embora seja uma tarefa difícil e delicada, a de não se inflamar um discurso quando o tema provoca imensamente o autor, farei o possível. O assunto da vez foge da proposta principal desse espaço – embora se relacione diretamente com ela. Então peço licença aos leitores desse blog para falar sobre a burrocracia dos censores de projetos artísticos de Caxias do Sul que intencionam ser financiados pelo município.
A burocracia (abrindo mão temporariamente do neologismo), intransigência e irredutibilidade desses censores e daqueles que ditam as regras para a apresentação dos projetos é, sem dúvidas, uma pedra no sapato de qualquer pessoa que queira iniciar uma carreira no meio nessa cidade. Acredito que a realidade deve ser semelhante em outros locais do país, mas posso apenas dizer com certeza que o problema ocorre aqui – e tende a piorar.

Não julgo incorreta a necessidade de mil justificativas, currículos, orçamentos e tudo mais que é necessário para a inscrição de um projeto pelo qual se intenciona financiamento municipal, muito pelo contrário: é assim que se verifica a validade e coerência desses projetos e se diferencia os realizadores e produtores culturais de “artistas” mal intencionados, que procuram no financiamento de um projeto uma forma de remuneração, antes de qualquer coisa.

A necessidade de tais comprovações é essencial, insisto, porém não é no que consiste o projeto, e sim na proposta do mesmo. Isso, porém, é descartado inteiramente de início. O que se avalia primeiramente é a composição de intermináveis três vias do projeto apresentado, devidamente encadernadas, com todas as páginas numeradas e rubricadas. Como na pré-escola, o aluno mais caprichoso e atencioso ganha uma pequena estrela dourada, que aqui é o encaminhamento para a avaliação do projeto em si e ao que o mesmo se propõe. Aquele que comete uma falha, por menor que seja, é repreendido e, diferente da professora da pré-escola supracitada, que permite uma correção e reparação do erro, a intolerante comissão avaliadora inabilita o projeto sem sequer saber qual é a proposta do mesmo – sem chances de quaisquer recursos para que o problema seja resolvido. E nesse momento não há argumentação que seja válida.

Se o leitor se faz agora uma inevitável pergunta, respondo de antemão: sim, era proponente em um projeto cultural que foi inabilitado. O motivo? Em uma das três intermináveis vias do meu projeto um erro foi encontrado, onde um orçamento estava incorreto e diferente das outras duas vias. Não peço perdão pelo meu erro, por ter imprimido um orçamento errado. Pelo contrário, assumo-o! O que espero, e efetivamente solicitei quando soube da inabilitação, é a possibilidade de corrigir o problema, de substituir uma simples folha por outra onde o problema inexistisse. Mas esta não era uma opção – embora tenha sido nos editais de outros anos.

E assim como no caso acima relatado, outros vários projetos recusados esperavam por seus proponentes, que se desolariam assim que chegassem à Secretaria Municipal da Cultura e recebessem a péssima notícia da inabilitação. Por informação recebida dentro do próprio local, mais de 25 outros projetos seriam devolvidos – por erros tão simples quanto ou ainda menos que o descrito previamente.

E então a intenção que se aproxima do altruísmo, de trabalhar para promover a cultura através de diferentes meios dentro de nossa cidade - que ainda engatinha nesse aspecto – se acaba para muitos. Mas não para mim e para aqueles que aceitaram promover a primeira mostra de cinema e debates de Caxias do Sul, incluindo os outros dois editores desse blog, Marcelo e Rafael Müller. O projeto segue em frente, seja com ou sem financiamento, com ou sem o apoio daqueles que deveriam fomentar a produção cultural feita por cidadãos da cidade - fomento que se torne cada vez mais curioso, começando pelo fato da cidade ter doado sem quaisquer explicações concretas R$ 100 mil para uma produção da capital gaúcha.


E viva a incoerência, viva a burrocracia!

3 comentários:

  1. Oi, Kon!
    Como editor e um dos organizadores da mostra de cinema de Caxias do Sul, compartilho sua de indignação. Nos propomos à fazer o trabalho que outros, muito bem pagos por sinal, deveriam realizar. E basta um erro, uma incoerência à menor inclinação compreensível, e somos sumariamente impedidos. Por essa via, não do projeto.
    Talvez sejamos nós os errados. Talvez, caso nossas mentes flutuem no intangível e inteligível, acabemos por imaginar que os intermináveis 06 projetos na área de cinema tivessem de ter rigorosa apreciação, sem apreciar seu conteúdo. Ao apontamento do equívoco mais ínfimo, eis uma fresta para descartar um dos projetos.

    E viva a Secretaria Municipal de Cultura de Caxias do Sul.
    Abraçossss

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  2. Já coloquei isto de outra forma em outros meios, mas a Secretaria da Cultura de Caxias do Sul e suas políticas culturais são piadas, sem graça. A partir do momento que não se dá respaldo aos artistas da cidade,que não se trabalha em conjunto para a efetivação de um plano cultural decente, que questões politiqueiras são fundamentais para decisões que afetam a classe artística diretamente, não me surpreende que um erro de formatação ou de cópia, que seja, inabilite todo um projeto aos olhos de gente que passa ao largo da competência.

    A Primeira Mostra de Cinema de Caxias do Sul vai sair, com ou sem dinheiro do Financiarte. Parece, realmente, que a Secretaria da Cultura só se interessa, de fato, por aquilo que lhe interessa em outras esferas. A indignação segue viva, mas vamos transformar ela em catalisadora de um trabalho que, se não vai conseguir remunerar seus artistas, pretenderá, nem que seja minimamente, suprir uma necessidade artística de uma cidade que se diz progressista (e na verdade é) mas que em certas questões, como as culturais, parece involuir gradativamente.

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  3. É, meu caro, parece que esse tipo de burrocracia não acomete somente as grandes capitais, mas está se disseminando cada vez mais em cada fresta do nosso País das Maravilhas. Como diz uma canção de Chico Buarque, " o estandarte do sanatório geral vai passar". Ser correto acaba sendo errado, nesse hospício de falcatruas e golpes, tornando-se cada vez mais corriqueiros. Boa sorte!

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