sexta-feira, 2 de abril de 2010

Apenas o Fim

Direção: Matheus Souza
Roteiro: Matheus Souza
Elenco: Érika Mader, Gregório Duvivier, Nathalia Dill, Álamo Faço, Julia Gorman, Marcelo Adnet, Anna Sophia Folch

Apenas o Fim é uma avis rara na atual cinematografia brasileira quase que cem por cento financiada por leis de incentivo à cultura, por subsídios oriundos das verbas públicas. Matheus Souza, então aluno da faculdade de cinema da PUC – RJ, escreveu o roteiro, reuniu amigos, utilizou equipamento de aula e se propôs a filmar, a criar um filme meio que na guerrilha, com quase nada de dinheiro e muita vontade de fazer. Para surpresa de muitos, creio que inclusive de Matheus, o filme foi parar na última edição do Festival do Rio, de onde saiu como vencedor na categoria melhor longa-metragem pelo voto popular e ainda recebeu menção honrosa do júri oficial. Nada mal para um filme amador, feito com grande parte da equipe formada por estudantes, mas, essencialmente, por gente cheia de vontade, e de talento, diga-se de passagem.

A trama é simples, se passa durante uma hora na vida de duas pessoas que estão se separando. Ele escolhe a conversa em detrimento ao sexo da despedida. Ela, não se sente feliz, quer ir embora, sabendo que nem isso a fará plena, lhe falta algo desde a infância, como se um buraco fosse empecilho para uma satisfação integral. Soa como uma inconstância da juventude, um existencialismo do qual só os jovens em sua irresponsabilidade inocente podem se permitir, numa profundidade claudicante. Os dois refletem sobre a situação, sobre as questões primárias do amor e das relações que ele propicia, mas longe dos arroubos dramáticos dos personagens de filmes similares. Até mesmo o tom aponta para um tipo novo de percepção, oriunda de uma geração que leva na bagagem muito mais do que religião e dogmas restritivos.

Por mais que não seja, em si, um filme espetacular, Apenas o Fim merece elogios, alguns rasgados, outros mais no intuito de exaltar a forma como o filme foi feito, como incentivo ao talento e a coragem. As referências a cultura pop, principalmente marcadas na geração do final dos anos oitenta e início dos anos noventa, pululam aos montes durante o filme, principalmente nas falas do protagonista, que deve ser um alterego do diretor. Matheus parece ter utilizado tudo que o formou como pessoa, para caracterizar seu personagem. É particularmente delicioso ouvir sacadas espertas sobre Cavaleiros do Zodíaco, He-Man e Power Rangers, elementos que moldaram a geração que, por coincidência também é a minha. Não sei, sinceramente, como o filme dialoga com quem não foi formado por este período. Paradoxalmente, a quantidade de referências e a forma como elas dão um viés cômico/nostálgico interessante à trama, são elemento nocivo, pois acostumam mal o espectador e fazem falta. Sem este artifício, a narrativa fica um pouco à deriva, gravitando em torno de momentos pouco inspirados, que dão um caráter até repetitivo a certas passagens. Mas aí vem outra tirada inteligente, outra boa sacada sobre relacionamentos e jovens promessas de amor, e parece que a atenção se renova, e isto é um ponto positivo: a peteca até cai, mas logo é alçada novamente.

Os atores Erika Mader e Gregório Duvivier formam um casal simpático, tem química. Gregório faz o tipo neurótico, nerd e que é cheio de manias, medos e outras particularidades. É uma espécie de Woody Allen tupiniquim, classificação esta que se aplica ao próprio ator, que se especializou neste personagem e parece encarná-lo a cada novo papel. Erika Mader tem carisma, mas claramente se apóia em Gregório, em seu personagem mais rico, mais verborrágico. Coisas do roteiro, a atriz sabe desempenhar muito bem o que lhe dão.

Mais do que ser celebrado como um novo talento do cinema brasileiro, ou mesmo como o novo Domingos Oliveira (precoce ainda falar se seu talento suporta as comparações), Matheus Souza merece elogios acalorados pela forma como fez, pelo amadorismo despretensiosamente delicioso com o qual construiu seu filme. Se a câmera registra as imagens com pouca sensação de volume, com uma fotografia chapada e algumas falhas técnicas, logo vem um movimento de câmera inspirado, um enquadramento perspicaz para nos lembrar que o diretor pode ainda estar em formação, mas tem capacidade. Não é questão de ser indulgente, mas frente ao charme de um filme tão sincero e simples, seria injustiça dar peso excessivo a suas falhas e inconstâncias. Um filme muito bom, de um talento a se lapidar.

2 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Indubitavelmente é um filme amador, mas com passagens empolgantes. Bergman, em seu inicio de carreira, errou aos borbotões. Dito isto, proponho crédito ao jovem Matheus.

    Abraçossss

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  2. Oi Celo!

    Ficamos assim: eu em falta por não ter visto "Apenas o Fim" e você aguardando o maravilhoso "Os Famosos e os Duendes da Morte". Não que os filmes tenham muito a ver, a não ser por retratarem jovens, mas para eu não ser o único invejoso por não ter visto um dos ótimos nacionais recentes.

    Abraçosssssss!

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