domingo, 2 de maio de 2010

Sexo, Drogas e a Revolução do Cinema Americano

Tudo começou com uma viagem de duas motos e seus pilotos pelo interior dos EUA. Em Sem Destino, Dennis Hopper e Peter Fonda simbolizaram uma era, espelharam na tela o sentimento de toda uma geração. O filme a rigor não falava a respeito de nada, era sobre muita coisa, é certo, mas não tinha uma trama guia, não era um exemplar movido pela história, e sim pelos personagens, que, meio sem eira nem beira, desafiaram a mentalidade fechada de uma parcela do povo americano que ainda rezava pela cartilha do conservadorismo. O inesperado sucesso de Sem Destino, até então um exemplar sem precedentes no cinema americano, que vivia uma crise por conta da debandada do público, abriu os olhos das pessoas, mudou as regras do jogo, fez com que a tese do cinema de autor, proposta pela Nouvelle Vague e seus críticos que viraram diretores, fosse a tônica dominante. Jovens diretores americanos queriam ser Godard, Truffaut, Bergman, procuravam a libertação dos grilhões da narrativa convencional, dos finais felizes. O povo americano não queria mais ver finais felizes. A contestação e a contracultura estavam em voga, e os estúdios americanos foram salvos da falência por jovens que queriam fazer do cinema a arte que melhor expressaria o que o povo sentia e/ou queria. Coppola, Scorsese, Schrader, Hopper, Ashby, Friedkin, Bogdanovich, Altman, e tantos outros, ganharam poder de uma hora para outra, foram alçados ao patamar de gênios com seus trabalhos iniciais. Fizeram fortuna, ensaiaram a revolução, pois queriam que o cinema americano fosse mais do que cifras, queriam que a essência da arte prevalecesse.

Os estúdios se adaptaram aos tempos, seguiram a onda financiando os filmes que davam certo, que o povo queria ver, e foram salvos por esta geração que, paradoxalmente, questionou seu poder e que parecia enfadada do velho sistema. Aí veio o declínio, os diretores começaram a afundar em sua própria megalomania, em rompantes de ações descabidas que denotavam que os egos estavam acabando com talentos. As drogas também tiveram importância fundamental neste significativo capítulo da história cinematográfica mundial. Os idealizadores da Nova Hollywood foram aos poucos perdendo poder, sendo suplantados por, entre outras coisas, acreditarem demais na genialidade que lhes atribuíram. Os estúdios retomaram o poder, os profissionais, aos poucos, em sua grande maioria, foram se formatando. Muitos consideram que O Portal do Paraíso de Michael Cimino tenha jogado a última pá de terra em cima de toda esta chamada Nova Hollywood, mas foi por meio da recepção fria, para não dizer gélida, que Touro Indomável (um dos melhores filmes americanos dos últimos cinquenta anos) teve por parte da platéia, que se verificou que algo mudara, que o público não queria mais refletir, pensar, ver algo complexo, tudo por conta de uma transformação social que começou lá, e que ecoa até hoje.

Peter Biskind, em seu livro Como a Geração Sexo-Drogas-e-Rock’n’Roll Salvou Hollywood, tece com pouca parcimônia todo o panorama da ascensão e queda da Nova Hollywood, desde que os easy riders cortaram as estradas americanas até o momento em que Jake LaMotta se olha no espelho. O livro é uma leitura delíciosa, indispensável a qualquer cinéfilo, principalmente àqueles que costumam, por puro preconceito, relacionar “cinema americano” com blockbuster, esquecendo que na terra do Tio Sam se faz e, principalmente, se fez muita coisa magnífica em prol do cinema mundial, por meio de filmes que figuram, tranquilamente, na lista dos melhores desta arte já mais do que centenária. Um livro que tem de grandes discussões artísticas a histórias de alcova, e que organiza suas linhas de abordagem tão bem, que nós, leitores que não vivemos o período no olho do furacão, conseguimos ter a dimensão do que a revolução no cinema americano dos anos sessenta foi capaz e também de como ela, já nos anos oitenta, era só uma saudosa lembrança.

2 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Parabéns pelo texto. tenho de concordar contigo quando destaca a importância que o cinema norte-americano tem para a filmografia mundial. Infelizmente, muitos preferem encubrir tal arte com filmes meramente comerciais, os quais figuram nas salas de projeção de todo o mundo em nossos dias.

    Abraçossss

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  2. Oi Celo!

    Obrigado pelo texto e, desde já, obrigado por me emprestar o livro. haha Também acho terrível a generalização do cinema norte-americano, mas a exportação e consumo de blockbusters do território deles é tão grande que acaba se sobrepondo aos grandes filmes que o país já produziu.

    Espero ansioso por essa leitura!

    Abraços Celo.

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