sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Confiar e as vítimas do sexo institucionalizado


David Schwimmer, o eterno Ross da série televisiva Friends, passeia por campo minado em sua nova incursão atrás das câmeras de cinema. Falar de sexo, relações virtuais e frustrações, é um tatear a cada nova cena por emoções e situações que, não raro, contribuem para desenvolvimentos planos e sentimentaloides. Em Confiar, Annie é uma menina como tantas outras, repleta de dúvidas e baixa autoestima, que se apaixona pela internet e estabelece relacionamento virtual paralelo ao que mantém com sua família e amigos. Ela não hesita muito em ir ao motel com o homem de quase 40 anos que na web se dizia um adolescente tão cheio de incertezas quanto ela.

Há a descoberta do caso pelos pais, a interferência do FBI e toda uma busca pelo pedófilo. Will, o pai, interpretado por Clive Owen (num registro que lembra noventa por cento das interpretações deste bom ator meio monocórdico) fica obcecado por encontrar o homem que molestou sua garotinha. O paradoxo se apresenta em sua profissão, utilitária da erotização adolescente para aumentar as vendas de seus clientes. Contradição rasa, pouco desenvolvida, que soa mais como reprimenda e chamamento moralista à reflexão do espectador sobre a sociedade em que vive. Intenção boa, por certo, mas delas o inferno está cheio. A desabalada carreira de Will em busca do bandido esbarra ainda na dificuldade da investigação, agravada pela própria filha, enamorada de seu suposto agressor. Estupro, sexo consentido, ou algo que uma adolescente de quatorze anos ainda não tem maturidade para avaliar?

Confiar é um tanto perdido em seu próprio escopo, indeciso entre o drama familiar e a expansão de sua causa como exemplo de algo maior e cotidianamente preocupante. Will parece mais atormentado por sua impotência do que propriamente pelo delito cometido, e Annie reluta enquanto amada, aceitando-se vítima do crime somente após tomar conhecimento de que não foi especial para o meliante. Confiar discute com pouca profundidade o nocivo protagonismo do sexo na sociedade, mas talvez seu maior pecado seja o de não assumir posicionamentos que fujam do senso comum. David Schwimmer resvala em diversos pontos de controvérsia, mas sua narrativa acaba sendo vítima de signos palatáveis. Tivesse o arrojo de abordar com menos pudor o embate entre as frustrações do pai e a natural inconsistência da personalidade adolescente ainda em formação da filha, e o diretor poderia ter realizado algo maior, preso de menos na obrigação de passar mensagens de alerta, e mais aberto às pessoas. Schwimmer é exatamente como Will: obcecado pelo tema, pelo que ocorre, e descuidado em demasia com os personagens que por ele são duramente afetados.


Publicado originalmente no Papo de Cinema. 

2 comentários:

  1. Olá, Celo!
    Mais um texto do "Papo de Cinema"? Está rendendo muito conteúdo ao site. Parabéns.

    Abraçosss

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  2. Eu tenho uma opinião diferente da sua, como já compartilhamos anteriormente. Vejo no filme uma força maior, soluções interessantes e a escolhas acertadas. Ainda que tenha alguns problemas estruturais, foi um filme que, para mim, acertou o tom para sua temática.

    Grande abraço!!

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