domingo, 5 de maio de 2013

Doses Homeopáticas #01



Alain Resnais é uma lenda viva. Sua contribuição para o avanço da linguagem cinematográfica já está lá, impressa nas páginas da história. Não contente, vem ele aos 91 anos com um diálogo aberto entre cinema e teatro, em VOCÊS AINDA NÃO VIRAM NADA. Confesso ter achado o início genial, mas depois, quando desfraldado o caminho a ser percorrido, tudo meio enfadonho na proposta de imbricar atores e seus respectivos personagens da peça Orpheu e Eurídice. Cenários artificiais, figuras de interpretação duplicada, às vezes triplicada, e o que ficou para mim foi a beleza da própria peça, acima da forma utilizada por Resnais para contá-la.


Baseado na canção Olhos nos Olhos¸ de Chico Buarque, O ABISMO PRATEADO é circunscrito na tradição das obras mais voltadas à criação de sensações que propriamente ao desenvolvimento direto e reto de uma trama. Violeta é abandonada pelo marido, e a partir daí vemos a imediata absorção da dor e seus desdobramentos. Muito barulhento e urbano, o filme falha, a meu ver, não por apostar na reiteração e nos tempos mortos para transbordar de Violeta ao público o lado menos tangível da perda, e sim por fazê-lo exasperando esse caráter lacunar.   


CABRA MARCADO PARA MORRER em tela grande e cópia nova é experiência e tanto. O longa mais famoso do cineasta Eduardo Coutinho, mesmo atento a uma época, envelhece pouco se retermos dele sua atemporalidade: a luta de classes, os desmandos dos latifundiários (empresários) e a força do povo.  Pessoas humildes de pouca escolaridade se apresentam como força motriz da revolução camponesa nordestina, a inteligência da sociedade orgulhosa de sua cultura acadêmica, porém cega diante dos problemas mais elementares. A recordação, o filme dentro do filme, é só um afluente, pretexto para a criação de algo que realmente discute o Brasil.


SOMOS TÃO JOVENS não é um grande filme. A preocupação do roteiro em dar conta de TUDO acerca de determinado período (grande) da vida de Renato Russo exclui, por pressa, dos momentos em si um tanto de sua real importância. Há também olhar pudico, sobretudo com relação ao sexo. Contudo, há beleza no registro daquela geração emblemática do rock brasileiro. Renato às vezes soa quase como moleque mimado e irritante na tela, mas quem disse que ele não era assim mesmo? As revoltas e chiliques desse “punk de apartamento” no seio da burguesia (assim ele é pintado), em nada diminuem seu talento poético.


Ainda que seja refém de algumas soluções fáceis (nós desatados quase como num passe de mágica), DUETS - VEM CANTAR COMIGO tem personagens interessantes, trilha sonora inspirada e alguns momentos de graça genuína. O inusitado encontro de tipos tão diferentes em busca de sucesso num circuito de karaokê é base para algo que, ainda de soslaio, discute a pátria-mãe América e seus órfãos desgarrados. Fora isso, os números musicais são ótimos e até Gwyneth Paltrow, tão insossa, sai-se muito bem. Um filme que se deixa ver entre a emoção e o deleite sonoro.

3 comentários:

  1. Celo!
    Adoro esses textos curtinhos e superbacanas de serem lidos.

    Muito bom \o/

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  2. Gente, adorei isso!! Ótima idéia!! E acho que funciona muito bem para nós leitores. Seja o mais atento e fiel, seja os que tem menos tempo e interesse de ler textos maiores, mais detalhados. É uma forma de nos informarmos sobre os filmes que não vimos e também de apreciar o olhar do crítico sobre os filmes que vimos.

    beijos

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  3. Obrigado, Carol e Rafa, pelos elogios.

    É muito bom escrever o DOSES HOMEOPÁTICAS, solução para quando não há tempo maior para reflexão, mas ainda assim vontade de escrever algo sobre os filmes vistos.

    beijos

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