terça-feira, 10 de maio de 2011

Mostra #01 - Acossado


Jean Paul Belmondo caminha meio sem lenço e sem documento pelas ruas parisienses em Acossado, uma das obras-primas de Jean-Luc Godard. Ele é um marginal, não só por matar um policial rodoviário ou pelo furto recorrente de automóveis, mas também por representar os que vivem à margem de uma sociedade centrada no sucesso financeiro, na fidelidade às marcas e ao estilo mais burguês possível. Michel Poiccard, o personagem que Belmondo defende de maneira icônica, ecoa anos depois em O Bandido da Luz Vermelha de Sganzerla, este também protagonizado por uma charmosa e instigante figura do submundo amoral. A verdade é que Acossado ressoa em um monte de outros filmes, em outras formas de arte, faz escola, e por isso é tão importante.

Nele, Godard, meio que para reduzir a duração dos cortes iniciais do filme, meio que para atender aos instintos geniais de sua criação, brinca com a montagem e a nossa percepção de espectador, acelera e esfrega em nossa cara o espetáculo que o cinema proporciona, e a inabalável empatia gerada quando este é bom e instigante. Obviamente não foi só Sganzerla que Acossado influenciou, e meu irmão Rafa, após a sessão, fez um paralelo interessante entre o final do filme e uma cena específica de Cidade de Deus (aqui não conto, pois um dos meus mandamentos é “não proferirá spoilers de maneira alguma"), mas se debruçar sobre este aspecto seria expandir em demasia o texto que, a bem da verdade não se propõe a isto. Dica para um próximo post, quem sabe.

O debatedor da noite disse que não se afeiçoava tanto ao filme por entender que nele a forma por vezes sufocava o conteúdo, que a história era rasa e que o roteiro se apresentava frouxo. Não externei (deveria) minha discordância, que só fui mencionar ao Rafa, quando nos direcionávamos à parada de ônibus. Pensar que Acossado tem somente na forma seu sustentáculo é cair na armadilha das aparências, se deixando levar pelo epidérmico. O conteúdo e suas ressonâncias, camuflados em meio a um fio condutor simples, até banal, são realmente sublinhados bastante pela forma godardiana, mas, por exemplo, não dá para fechar os olhos para a vanguarda em que está inserido também no que tange às questões comportamentais que o substancial abarca. O fio que conduz pode ser simples, mas o conteúdo vai além desta linha, e se o roteiro de Acossado é frouxo, eu não sei mais como é um roteiro bem amarrado. Se “frouxo” fosse no sentido de “livre”, aí eu concordaria e assinaria onde precisar, mas não foi o caso do comentário. Então, discordo do palestrante apenas nisto, de resto foi uma ótima conversa, principalmente aos não iniciados na nouvelle vague

Este texto meio fragmentado, originalmente não era sobre Acossado, e sim estritamente sobre a sessão do mesmo, ocorrida ontem durante a Mostra 1959 – o Ano Mágico do Cinema Francês, mas é o que dá querer tergiversar sobre um filme tão importante, ele acaba se impondo. Sobre a exibição, a pouca adesão de público foi o único senão, e as doze pessoas (estimo) que foram, que saíram de casa e encararam o frio da Serra Gaúcha para encontrar Godard e sua obra seminal, não se arrependeram (pelo menos acredito que não). De minha parte, foi excelente poder rever um filme que da primeira vez não tinha me impactado tanto, mas que agora, à luz da evolução que o tempo e o constante apuro do olhar e da percepção trazem, se mostrou pleno e arrebatador, justificando a fama que o precede. 

Vamos assistir hoje, à partir das 19h, Os Incompreendidos, de Truffaut? Aguardo-os no Sesc Caxias do Sul.

3 comentários:

  1. Godard! Fui me apaixonar pelo cinema deste diretor com seus filmes seguintes, como Bande à Part, Uma Mulher é Uma Mulher e Pierrot Le Fou. Foi excelente rever Acossado para compreender os primórdios do estilo que tornaria sua marca na Nouvelle Vague.

    Abraços, Celo!
    Até daqui há pouco, em Os Incompreendidos.

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  2. Que ritmo bacana pessoal :)
    Eu pessoalmente AMO "Pierrot Le Fou"!
    Bom filme pra vocês
    beijos

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  3. Olá, Celo!
    Como de costume, estava bastante cansado e, por este motivo, não aproveitei o filme em sua totalidade. Todavia, o adorei, instigando minha curiosidade em ver mais obras desta época inigualável do cinema francês.

    Abraçosss

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